Judiciário

“Nossos presídios são um verdadeiro campo de extermínio”, avalia criminalista

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“Nossos presídios são um verdadeiro campo de extermínio”, avalia criminalista
(Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Mato Grosso tem 12 mil pessoas privadas de liberdade nos 56 presídios do Estado, conforme dados oficiais da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp). No Brasil, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número é superior a 600 mil pessoas. Para o advogado criminalista Elias Mattar Assad, presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), diante do grande número de pessoas reclusas, o número de vagas e o funcionalismo do sistema, os presídios brasileiros podem ser comparados a “campos de extermínio”.

Advogado há quase 40 anos, dos quais 30 passou especializado na área penal, Assad já teve contato com os mais diversos tipos de casos e pessoas, conheceu e debateu o sistema penitenciário diversas vezes e, ao LIVRE, afirmou: trata-se de um sistema falido.

“As pessoas não entram lá para se recuperar, elas acabam morrendo lá dentro por problemas de facções, por problemas de saúde, que não são atendidos. Não há um sistema que consiga, digamos assim, fazer um tratamento de saúde em alguém que precise, e temos os problemas com as facções criminosas, que também acabam dominando”, disse.

À exemplo, o ex-governador de Mato Grosso Pedro Taques (PSBD), é alvo de uma investigação, movida pelo Ministério Público do Estado (MPE), por não ter cumprido decisão judicial que determinou a contratação de um médico, um enfermeiro e 18 agentes penitenciários para o Centro de Detenção Provisória de Juína. À época, 32% dos presos foram detectados com hanseníase e não tinham acompanhamento médico estatal.

De acordo com a Sesp, Mato Grosso tem a capacidade de manter apenas 6,3 mil pessoas privadas de liberdade. Ou seja, metade do que mantém. Há anos a construção de novas penitenciárias é prometida em campanhas políticas e, no entanto, nenhuma penitenciária foi entregue nos últimos oito anos. Além de três Centros de Detenção Provisória, apenas a Penitenciária de Várzea Grande retornou às obras na gestão do governo anterior.

[featured_paragraph]Para Elias Mattar, as condições desumanas do sistema carcerário, como a superlotação e a não garantia de direitos previstos em lei, colaboram para que a prisão não apenas não recupere aqueles que cometeram delitos, como também os torna reincidentes. Na visão do criminalista, os presídios brasileiros são “um caos humanitário”.[/featured_paragraph]

“É caótico. O tempo de prisão de alguém é o único momento que o Estado tem pra ele mudar de vida, para dar uma profissão, reeducá-lo. E só o fato de você manter uma pessoa 15 anos fechada, entre quatro paredes, e depois devolvê-la à sociedade, é um péssimo negócio. Nós estamos fazendo esse péssimo negócio hoje. Apenas mandando a pessoa para a rua, sem nenhum preparo, sem ressocializar, enfim”, observou o advogado.

Outro ponto frisado pelo presidente da Abracrim é quanto ao poder das facções criminosas no Brasil, que, em sua visão, acabam dominando as penitenciárias. Para ele, é possível que o próprio sistema tolere esse novo “poder” daqueles que chama de “grupo de extermínio”.

“Não sei até que ponto o sistema não acaba se omitindo e até estimulando esses grupos de extermínio, porque eu não me recordo de outro lugar no mundo que alguém se apresente ‘eu sou do PCC’, como alguns, de cabeça erguida, aqui no Brasil. Se é tolerado ou não…”, lançou a reflexão.

O ex-secretário de Segurança Pública da gestão Pedro Taques, Gustavo Garcia, que era policial no Rio de Janeiro, chegou a garantir, em entrevistas à imprensa, que, em Mato Grosso, “quem domina é a polícia”. No entanto, quase diariamente estampam os jornais as prisões de membros de facções criminosas, que, desavergonhados, batem no peito ao se identificarem como deste ou daquele grupo.

Em maio de 2018, foi destaque nacional o cortejo fúnebre ao líder do Comando Vermelho de Rondonópolis, executado no dia anterior. Para a ocasião, cerca de 50 veículos preencheram duas pistas da avenida Bandeirantes durante o entardecer, à base de som alto e buzinaço.

“Se o Estado não é tolerante ou se omite, é pior ainda, porque aí é uma coisa que o Estado não consegue resolver. E se ele não consegue resolver, faliu naquele lugar, naquele momento”, finalizou.

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