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Motoristas transexuais da Uber driblam preconceito e acumulam avaliações positivas em Cuiabá

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Motoristas transexuais da Uber driblam preconceito e acumulam avaliações positivas em Cuiabá

Ednilson Aguiar/O Livre

Diego Uber

 ‘Se eu fosse fazer cara feia a todos que me fazem, ficaria com rugas. E eu não quero ter rugas’, dispara Dhiego Rangel

Já de banho tomado, ele começa a se produzir. Penteia os cabelos que vão até os ombros, passa batom, rímel, coloca os brincos em cada orelha e pinta as unhas. Discreto, escolhe peças de roupas neutras, cumprimenta a mãe, se despede e entra no carro. Mais um dia de trabalho está para começar.

Dhiego Rangel, de 28 anos, sempre se sentiu uma mulher presa no corpo de um homem. Há pouco mais de um mês, trabalha como motorista da Uber, o popular aplicativo de caronas que começou a funcionar em Mato Grosso em meados de dezembro do ano passado.

Estudante de Fisioterapia, encontrou na ferramenta a saída que precisava para conciliar trabalho e faculdade, que passou a ser integral. Sempre que possível, leva e traz os passageiros — e treina a paciência. Minoria, a clientela que destila preconceito em olhares de reprovação ou deboches não deixa de ser atendida por Dhiego.

Divulgação

Avaliações.Dhiego

 

“Fico triste, obviamente, porém, não deixo que isso estrague o meu dia. Tento levar uma vida normal. Se eu fosse fazer cara feia a todos que me fazem, ficaria com rugas. E eu não quero ter rugas”, observou. 

 

Medindo 1,86m de altura, crê que a sua estatura também iniba algum possível comportamento mais agressivo por parte dos preconceituosos. “Tenho conhecidos que são mais franzinos e baixos e sofrem demais”, revelou.

Devido ao preconceito, contudo, Dhiego contou que prefere ser chamado nos lugares em que trabalha pelo nome de batismo e não pelo social. Diariamente, chega a trabalhar de oito a dez horas, transportando uma média de 20 passageiros.

‘Uberterapia’

Uma das principais motivações, diz, vem das avaliações que recebe no aplicativo a cada viagem realizada. Afável, relata que, em muitos casos, os clientes se sentem à vontade para dividir com ele assuntos da vida pessoal e problemas, como uma espécie de terapia, “a uberterapia”, disse.

“Se você for me chamar no Uber, verá que a minha avaliação é cinco estrelas [a mais alta]. Isso mostra, também, que a maioria das pessoas é do bem”, frisou.

Possuindo mais hormônios femininos do que masculinos, o estudante não descarta a possibilidade de fazer cirurgia para mudar de gênero. “Depois de formado e concursado, quem sabe, né?”.

Lindas

Assim como Dhiego, Alexandre de Oliveira Santana, 21 anos, também sempre se sentiu mais mulher que homem. Diferentemente do colega, porém, fez questão de ser identificada no aplicativo como Nathally, o seu nome social.

Desde fevereiro como motorista, ela decidiu trabalhar com o aplicativo por enxergar nele “uma oportunidade de poder ser eu mesma, sem precisar me modificar para ser aceita, como ocorre em muitas empresas”.

“Depois de ter feito o meu cadastro, procurei a central da Uber em Cuiabá e solicitei a inclusão do meu nome social, sendo atendida quase que na mesma hora”, detalhou.

Divulgação

Nathally.Uber

Trabalhando quase todos os dias, das 17h até o início da manhã, ela contou que a discriminação tem se revelado por meio de olhares.

“Não me abalo. Felizmente, a maioria sempre me tratou com muito respeito”, disse.

Outro problema, segundo ela, refere-se ao assédio que recebe de determinados passageiros, homens, em sua maioria.

“Me convidam para sair, perguntam se eu não gostaria de companhia, se dizem surpreendidos por ver uma mulher trabalhando pela noite, enfim, ignoro. Mas que causa desconforto, causa”, contou.

Em relação à segurança, Nathally relatou que sofreu uma tentativa de assalto logo na primeira semana de trabalho.

Percebeu que deveria ter mais cautela e, por isso, tem evitado atender chamadas para lugares mais distantes.

A motorista vai começar a cursar Direito em uma universidade particular e diz que, no momento, não pensa em procurar outro emprego. “Tem sido uma experiência interessante e rentável”.

Uma parte dos passageiros que Nathally atende são pessoas que solicitam o seu serviço de executive driver – em que oferece wi fi gratuito e outros mimos, como bombons – e a chamam fora do aplicativo. “São as mulheres que gostaram de ser atendidas por mim. Acho o máximo, elas são lindas. Somos, na verdade”.

 

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