Cidades

Venezuelanos que vieram a Cuiabá relatam exploração e calotes em Roraima

4 minutos de leitura
Venezuelanos que vieram a Cuiabá relatam exploração e calotes em Roraima
Alojamento na Casa do Imigrante onde venezuelanos ficarão por 45 dias. Foto:(Ednilson Aguiar/ O Livre)

Yulis Dávila, de 30 anos, fugiu da pobreza e da crise econômica na Venezuela, mas não encontrou um ambiente menos assustador no Brasil. “Eu tive que dormir dois dias no chão da praça, coisa que nunca fiz na vida” diz ela poucas horas depois de chegar à Casa do Imigrante, em Cuiabá, nesta sexta-feira (06).

“Mas eu me arranjei, me arranjei porque era a minha única opção”, resigna-se. Yulis formou-se em psicopedagogia para ajudar o sobrinho autista, mas no país governado por Nicolás Maduro ela jamais conseguiu emprego e trabalhava como cabeleireira para se manter.

Yulis chora ao lembrar que deixou a família na Venezuela para buscar um futuro melhor no Brasil. Foto: (Ednilson Aguiar/ O Livre)

Em Boa Vista a oferta de trabalho não era suficiente nem para Yulis nem para os seus 65 compatriotas que vieram para Cuiabá. Alguns, inclusive, relatam uma série de exploração. Aqueles que conseguiram pequenos trabalhos além de ganharem muito menos que um salário mínimo, viajaram sem receber pelo trabalho feito.

“Eu cheguei a lavar mais de 300 mesas em um dia e ganhei só R$ 30. Não havia emprego e o emprego que tinha eles não pagavam. Eu vim para cá sem receber dos serviços que fiz lá em Tancredo”, diz Denis Gonzalez, 39 anos, referindo-se ao bairro Tancredo Neves, na capital de Roraima.

Denis reclama que, apesar da péssima oferta de trabalho, muitos que vieram ao Brasil são pessoas qualificadas e que, em uma situação menos drástica na Venezuela, estariam bem empregadas. “Aqui tem contadores, mestre de obras e muitos bons profissionais”, resume ela.

Denis Gonçález (de vermelho) impressiona-se ao descobrir a distância entre Cuiabá e São Paulo. Foto:(Ednilson Aguiar/ O Livre)

A exploração foi confirmada por Paulo Sérgio de Almeida, representante da Agência da Onu para Refugiados (Acnur) e um dos coordenadores da transferência dos venezuelanos.  “Existe casos neste sentido sim, infelizmente quando há muita oferta de mão de obra e pouco trabalho isto costuma acontecer em zonas de imigração”, comentou.

Nem todos os imigrantes queriam vir para Cuiabá, o destino mais desejado era São Paulo. “Quando viemos não nos mostraram como era o lugar”, comenta Denis. Ela e outros colegas se impressionaram ao descobrir que de Cuiabá até a capital paulista a viagem por terra demoraria um dia  e viagem pelo céu demoraria cerca de uma hora. “Muito longe”, comentou alguém.

A esperança de conseguir um emprego na capital mato-grossense corre contra o tempo. A estadia na Casa do Imigrante não deve durar mais que 45 dias. Segundo o padre Pedro de Freitas, coordenador da unidade, o período serve para que os refugiados recebam apoio do Ministério do Trabalho e consigam se empregar.

Yulis, a psicopedagoga que se tornou cabeleireira, teme que a barreira do idioma possa dificultar a situação. “Sempre existe o medo, primeiro por conta do fator fundamental que é o idioma, eu tenho que fazer um curso, e o idioma é um fator limitante na hora de procurar emprego”.

Situação política

Em cerca de cinco anos a vida e o olhar de Yeson Jesus, de 30 anos, mudou completamente. Os vizinhos que o cumprimentavam antes de ir ao trabalho foram obrigados a caçar no lixo a comida cara que faltava nas prateleiras dos supermercados de Caracas.

Yeson diz que tudo ficou pior quando Maduro assumiu o poder. Foto:(Ednilson Aguiar/ O Livre)

“Você ganha 300 mil bolívar semanais e um quilo de arroz custa 250 mil”, relembra Jesus.  Sem muita perspectiva de melhoras diante da hiperinflação, Yeson decidiu sair do país caribenho. “Este ano foi o mais fatal de todos. Quase todos os dias tem protesto nas ruas e com os protestos há violência”.

A opinião de Yeson é a mesma do comerciante Oswaldo Trojo, de 42 anos. A diferença é a maneira como cada um encara a política do país. Para Yeson, o problema começou quando Maduro assumiu: “Com Chávez o povo venezuelano vivia mais alegre, as coisas estavam melhores com Chávez”, defende ele.

“Sempre foi assim, ficou pior com Maduro, mas nunca houve emprego, só há emprego para os chavistas”, critica Trojo. O comerciante está no país há um mês, deixou na Venezuela três filhos adolescentes e diz que o pior momento foi vir a Cuiabá. “Eu espero poder conseguir um emprego aqui para mandar dinheiro a minha família, mas agora estamos mais distantes, não sei se vou voltar”, diz ele.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros




Como você se sentiu com essa matéria?
Indignado
0
Indignado
Indiferente
0
Indiferente
Feliz
0
Feliz
Surpreso
0
Surpreso
Triste
0
Triste
Inspirado
0
Inspirado

Principais Manchetes