5 perguntas para

José Eduardo Cardozo: “Não sei o que vai acontecer, nem como vamos sair dessa”

6 minutos de leitura
José Eduardo Cardozo: “Não sei o que vai acontecer, nem como vamos sair dessa”
(Foto: Ednilson Aguiar / O Livre)

Ex-deputado federal, ex-advogado-geral da União e ex-ministro da Justiça no governo Dilma Rousseff (PT) – presidente que também defendeu no processo que resultou no impeachment dela, em 2016 –, o jurista José Eduardo Cardozo esteve em Cuiabá nesta semana para atuar no processo que culminou em mais uma cassação de mandato, o da senadora Selma Arruda (PSL).

Desta vez, o cliente que Cardozo defendia saiu parcialmente vitorioso. Se por um lado o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) julgou procedente a denúncia da qual o PSD de Mato Grosso, presidido por Carlos Fávaro, era um dos autores; por outro, não acatou a tese que o ex-ministro veio defender oralmente na Corte: a de que o ex-vice-governador, terceiro colocado na eleição de 2018, deveria ocupar o cargo vago no Senado até que um novo pleito seja realizado.

Entre uma interrupção e outra do julgamento que, por conta de um pedido de suspeição, levou dois para ser concluído, José Eduardo Cardozo falou com a imprensa sobre outras questões. A avaliação dele do governo Jair Bolsonaro (PSL), que derrotou o PT nas runas em outubro passado, e a atuação do atual titular do cargo que ele já ocupou, Sérgio Moro, foram alguns deles.

Confira os principais trechos da entrevista:

1 – O senhor foi ministro da Justiça, qual sua avaliação do pacote anti-crime do atual titular do cargo, Sérgio Moro?

José Eduardo Cardozo – O que se faz nesse pacote segue na linha inversa do que eu acredito que seria necessário para atuar no plano da Segurança Pública de maneira adequada no país. Acho que foi uma coisa que não se valeu de tudo o que foi acumulado pelo Ministério da Justiça. Nós acumulamos muita coisa e não pudemos, por força do fim do governo Dilma Rousseff (PT) antes da hora, implementar o plano que queríamos e vínhamos trabalhando por quatro anos para fazer. Infelizmente, vejo esse projeto de lei seguindo na contramão. Então, eu faço uma crítica severa.

Gostaria muito que desse certo, mas lamento, porque acho que o caminho que vem sendo seguido, o caminho de armamento da população, o caminho que está colocado ali é inadequado. Muitos inocentes podem morrer por conta dessa visão equivocada de Segurança Pública. Eu disse numa entrevista, logo que as primeiras medidas de armamento foram tomadas: a população, infelizmente, poderá assistir mortes de inocentes como essa, uma família com dezenas de tiros sem que, em princípio, tivessem qualquer responsabilidade delituosa. É triste, acho que isso pode se repetir e lamento que o país esteja seguindo nesse caminho.

2 – Mas a população, ao que parece, apoia essa decisão do governo de tentar facilitar a posse de armas.

Cardozo – O papel do governante é debater com a população para mostrar os melhores caminhos. Ele pode até ser derrotado, mas ele tem que demonstrar. Esse é um papel que não é fácil. Ser sempre aplaudido é muito confortável. O importante é quando você tem dados, informações para mostrar, discutir, conscientizar. Há quem prefira seguir a glória permanente do aplauso e quem age assim, seguramente, não governa para o bem do futuro do país.

3 – Falando sobre isso, qual sua avaliação do governo Bolsonaro?

Cardozo – Eu vejo o atual governo como absolutamente desastroso. Claro, eu sou oposição, não sou neutro. Mas eu não queria que a coisa estivesse tão ruim como está. Eu sou brasileiro.

É um governo que é um verdadeiro desastre de articulação política. Um desastre no que propõe. Um governo desastrado e que, infelizmente, leva o país a um desastre. Eu não sei o que vai acontecer, nem como vamos sair dessa.

4 – E qual sua avaliação de Sérgio Moro no cargo de ministro da Justiça?

Cardozo – Eu nunca fui favorável à concentração de poder. Lembro que, quando fui ministro da Justiça, foi cogitado de a Abin [Agência Brasileira de Inteligência] vir para o Ministério Justiça. Eu fui contra e disse: o dia que o ministro da Justiça tiver uma concentração de poderes, ele vai ser mais poderoso que o presidente e ele não foi eleito.

Já temos na história da humanidade situações – me lembro de Edgard Hoover, nos Estados Unidos – que mostram que a concentração de poder naquele que não é eleito é pouco recomendável para o Estado de Democrático de Direito. Se a concentração já não é boa nas mãos de quem foi eleito, imagine de quem não foi. Acho que isso é muito ruim, mas cada um governa pelo rumo que entende ser melhor.

5 – E como o senhor vê essa crescente manifestação popular contra parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal?

Cardozo – Eu fico entristecido. A manifestação é sagrada, as pessoas se manifestam quando quiserem e contra o que quiserem, mas manifestação contra as instituições?! Querem autoritarismo, é isso? Eu sei que tem gente que defende o golpe militar. Para minha surpresa. Nunca pensei que viveria isso. Eu vivi o final do Golpe de 1964 e sei o que foi aquilo. As pessoas querem voltar? Querem voltar à ditadura? Ao tempo das baionetas?

Vejo entristecido, como vejo entristecido uma juíza que ataca o Poder do qual participou. O poder de crítica é correto, que se critique esta ou aquela decisão. Eu mesmo critico, mas atacar instituições faz mal ao Estado Democrático de Direito.

SAIDEIRA – O PT hoje é uma das instituições mais odiadas do país. Onde o partido errou e por que chegou nesse ponto?

Cardozo – Talvez eu tenha uma pesquisa colhida um pouco mais recentemente, porque ele é o partido que tem a maior aceitação no Brasil, hoje. É claro que há os que odeiam, os que não gostam, mas, pela pesquisa que vi, é hoje o partido que ainda tem maior aceitação no território nacional. Como todo partido, erra. Como todo parido, acerta. Cabe ao PT discutir internamente aquilo que deve melhorar, o que deve fazer, o que deve corrigir.

O PT perdeu muitas eleições e ganhou muitas eleições. Nessa, perdeu porque houve, efetivamente, uma maioria que não queria que ele chegasse ao poder ou que queria que o presidente Bolsonaro chegasse. Agora, vamos e venhamos, fomos muito melhor do que outros partidos históricos. O PSL é um partido recente, mas fomos melhor que o PSDB e que vários outros. O que me leva a crer que não ganhamos a eleição, mas cada eleição é uma história e a história muda a cada vez que as urnas são chamadas.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros




Como você se sentiu com essa matéria?
Indignado
0
Indignado
Indiferente
0
Indiferente
Feliz
0
Feliz
Surpreso
0
Surpreso
Triste
0
Triste
Inspirado
0
Inspirado

Principais Manchetes