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Gerson Lopes, o mato-grossense que jogou no time de ouro do Flamengo de 80

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Gerson Lopes, o mato-grossense que jogou no time de ouro do Flamengo de 80
jogardor gérson Lopes
Time do Flamengo de 1980, Gerson é o terceiro (da direita para a esquerda), na fileira do meio

Era 1974 Urbano Lopes Dias e Dominata Bispo Dias mudavam de Alto Paraguai (a 200 km da Capital) para Cuiabá. Eles nem imaginavam, mas entre os 10 filhos que traziam consigo, estava o que seria um grande talento do futebol brasileiro.

Gerson Lopes, como ficou conhecido, começou sua carreira do dia para a noite em 1979 e um ano depois já estava no time de ouro do Flamengo, em 1980, jogando na equipe campeã mundial com Zico, Júnior, Raul e Carpegiane.

Não é exagero dizer que foi “do dia para a noite”, Gerson tinha sido demitido do mercado em que trabalhava e no outro dia resolveu fazer um teste no clube Operário de Várzea Grande.

Saiu de casa às 6 horas da manhã e retornou para a casa dos pais às 18 horas com o treinador, o presidente e o diretor do clube pedindo autorização para contratá-lo, visto que ainda era menor.

Foi assim que Gerson se tornou jogador profissional, sem nunca ter passado pelas categorias de base, saindo das peladas da periferia de Cuiabá direto para um grande time da época.

Em 1979 disputou um campeonato estadual e um brasileiro pelo Operário e no ano seguinte já passou a jogar no Flamengo, do Rio de Janeiro. “Foi uma ascensão bem rápida”, lembrou Gerson.

“Nós fomos surpreendidos quando em um programa de televisão, num sábado de manhã, o Claudio Coutinho, do Flamengo, disse que entre os reforços do Flamengo para o outro ano estava um grande talento de Cuiabá e citou Gerson Lopes”, lembrou o irmão de Gerson, o economista Vivaldo Lopes.

A família

O pai a princípio ficou receoso, queria que o filho estudasse, mas mesmo com o futebol, Gerson se formou e é técnico em contabilidade.

Porém, vascaíno apaixonado, Urbano ficou muito feliz quando Gerson recebeu o primeiro contato para jogar fora de Mato Grosso, afinal, era para o Vasco da Gama que o filho deveria ir.

Em meio às negociações feitas pelo então presidente da federação, Carlos Orione, Gerson acabou indo para o time rival, onde fez uma grande campanha em 1980, chegando a colocar Cláudio Adão no banco e fazer dupla com Zico.

Vindo de uma família pobre, Gerson se tornou o grande orgulho de todos, que acompanhavam sua carreira de longe, visto que não tinham condições de ir ao Rio para vê-lo jogar.

Gerson foi também o responsável por uma grande alavanca na família, em um momento que muito precisavam, foi ele quem pagou as contas e ajudou os pais e os nove irmãos, seis homens e três mulheres.

“Foi um período que ele foi muito importante na questão do orgulho da família, mas também no ponto de vista do apoio financeiro”, contou Vivaldo.

De início era apenas Gerson, mas foi o treinador Nivaldo Santana que escolheu o sobrenome Lopes para representá-lo, ainda que o último sobrenome da família na verdade é Dias. Por causa dele, a “família Lopes” se tornou uma das mais tradicionais e conhecidas de Alto Paraguai e da Capital mato-grossense.

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Matéria publicada à época em que Gerson foi para o Flamengo (Foto: Ednilson Aguiar / O Livre)

A carreira

Futebol não era um sonho, como o próprio Gerson disse, “foi algo que aconteceu”. Mas claro que era uma coisa que ele gostava de fazer e ter se tornado sua profissão o fez muito feliz.

E isso é perceptível até na casa do ex-jogador, em quadros de reportagens e fotos da época que estão colocados nas paredes e estantes. Quando foi pedido fotos então, Gerson surgiu com sete álbuns nas mãos e mostrou com orgulho a carreira que trilhou (veja fotos na galeria).

Começou pelo Operário, depois foi para o Flamengo – onde foi campeão brasileiro. Ficou dois anos no Goiás, depois mais cinco no Santo André e passou ainda pelo Caxias, pelo Juventude e por mais seis clubes, totalizando 12 clubes em seus 17 anos de carreira.

Ele contou com alegria o orgulho de ter jogado no time de ouro do Flamengo.

“Um dos que todo mundo conhece e sabe, foi um dos grandes times da história do Flamengo, que tinha Zico, Júnior, Raul, Carpegiane, foi um time que qualquer flamenguista não esquece. Foi um time que foi campeão brasileiro e depois, quando eu já não estava, foi campeão mundial também”, contou.

Foi nesse time que Gerson viveu um grande momento em sua carreira, um jogo em Cuiabá entre Flamengo e Mixto, em que Zico fez quatro gols e ele três. “Mato Grosso todo lembra desse jogo, que realmente foi um jogo histórico”, disse.

Outra partida que marcou o ex-jogador traz uma lembrança triste, era uma disputa pelo campeonato brasileiro, em que Santo André e Fluminense se enfrentavam – Gerson estava no Santo André – e ele fraturou o tornozelo.

“Foi uma passagem triste que eu superei e joguei por 17 anos”, lembrou. Gerson encerrou a carreira em 1994, visto que a idade, 34 anos, já começava a forçá-lo a isso.

Reconhecimento

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Gerson se emocionou ao falar da homenagem que recebeu, um mini estádio com seu nome (Foto: Ednilson Aguiar / O Livre)

Em 2003 Gerson ganhou uma homenagem. O então prefeito de Cuiabá, Roberto França, deu seu nome a um mini estádio localizado no Bairro Coophema.

O ex-jogador chorou muito ao lembrar desse fato. “Ser reconhecido na sua profissão ainda vivo é muito gratificante”, disse ele em meio às lágrimas.

Após alguns minutos, Gerson conteve a emoção, limpou as lágrimas e continuou: “Desculpa, me sinto emocionado. Foi um projeto na época do prefeito Roberto França, que homenageou a mim e a mais 20 personalidades, alguns ex-atletas, me sinto muito feliz com tudo isso”.

Ele contou que o reconhecimento é o que o traz mais felicidade e lembrou que em 2012 foi levar dois meninos da base do Mixto em Caxias do Sul (RS), onde jogou pelo Caxias por cinco anos, e foi reconhecido por dois motoristas de táxi.

“Nas duas corridas de táxi que fizemos os taxistas me reconheceram e ficaram muito felizes. Aquilo ali não tem preço, me reconheceram, me elogiaram, aquilo não tem dinheiro que pague”, lembrou o ex-jogador.

E o reconhecimento ainda se apresentou quando Gerson se tornou um exemplo dentro da família. Como o futebol estava no sangue, foram vários que chegaram a começar a carreira.

O irmão mais novo, Max Lopes, chegou a ir para o Vasco da Gama, jogou também no União São João de Araras e poderia ter um futuro tão bom quanto o do irmão, mas desistiu.

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Para Gerson, a maior alegria é o reconhecimento que recebe até hoje (Foto: Ednilson Aguiar / O Livre)

Não diferente foi o sobrinho Bruno Lopes, que ficou quatro anos no Guarani e foi para o Flamengo, assim como o tio, mas após uma contusão, em 2001, acabou desistindo da carreira.

Gerson e o pai de Bruno, Vilvado, tentaram que o garoto se tornasse profissional, mas assim que saiu das categorias de base e entrou no profissional ele optou por não mais jogar e foi estudar. “Ele tinha tudo para seguir uma carreira profissional, mas foi uma opção dele não querer mais”, lembrou o tio.

Seus filhos, Ricardo e Vinícius, também tentaram seguir o pai, a única que fugiu do futebol foi a menina, Géssica, com G, em homenagem a Gerson.

“Tanto eu quanto meu irmão… Futebol vem de casa e a gente sempre teve ele como boa influência, não vou dizer que somos dois craques, mas acho que talvez se tivesse um pouco mais de insistência poderíamos ser profissionais também”, disse o filho mais velho, Ricardo Lopes, 31 anos.

Ricardo ainda pegou o fim da carreira do pai. Chegou a entrar em campo de mãos dadas com seu grande ídolo em alguns jogos no Rio Grande do Sul, no campeonato Gaúcho.

“Ele é o orgulho para todos nós lá de casa e na casa da minha avó para os irmãos. Imagina ter um pai que jogou para 150 mil pessoas, na época que os estádios superlotavam?”, disse Ricardo.

Ele ainda lembrou do retorno para Cuiabá, após a aposentadoria do pai.

“Quando voltamos para Cuiabá, muita gente ainda o conhecia, sabia da história dele, ai quando a gente ia nos jogos das copas máster, o pessoal cercava ele para bater foto, pegar um autógrafo e eu achava muito legal, sonhava em ser jogador de futebol”, disse o filho mais velho.

“Os dois gostam até hoje, jogam bola, mas não quiseram seguir uma carreira mais sólida, encarar realmente com seriedade. O mais novo [Vinícius] tentou comigo, eu como treinador, mas futebol é muito difícil, você imagina se todo mundo que jogasse fosse profissional? É uma carreira muito difícil”, disse Gerson.

Pós aposentadoria

Gerson Lopes - Escolinha
Atualmente Gerson dá aulas de futebol em escolinhas e condomínios (Foto: arquivo pessoal)

Após parar de jogar em 1994, Gerson se afastou completamente do futebol por 10 anos, não indo nem mesmo aos estádios ver jogos. Durante esse tempo trabalhou como representante comercial.

Depois do “exílio futebolístico”, começou a trabalhar em 2004 como auxiliar de treinador no Palmeirinhas do Porto, de Cuiabá. De lá, foi para o Mixto, seu time do coração em Mato Grosso (no Brasil é o Palmeiras), onde trabalhou como diretor de futebol.

Depois começou sua própria escolinha e um projeto social com parceria da Amam (Associação Mato-grossense de Magistrados) e da Unimed, onde ficou por cinco anos ministrando treinamentos.

Atualmente Gerson dá aulas em uma escolinha durante o dia e a noite em condomínios particulares, das 18h às 20h, voltando assim a viver da sua grande paixão, o futebol.

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