Esportes

Da falta de suporte ao pódio: como nasce um atleta olímpico no Brasil?

Professores apontam a falta de estrutura como empecilho para crianças e adolescentes despontarem como promessa no esporte

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Da falta de suporte ao pódio: como nasce um atleta olímpico no Brasil?
(Foto: Jonne Roriz/COB)

A realização das Olímpiadas promove um boom de visibilidade para diversas modalidades de esporte. De outro ponto de vista, os jogos também trazem esperança para crianças, adolescentes e jovens que sonham um dia estarem no pódio olímpico.

Para dar vida ao sonho, entretanto, as crianças brasileiras esbarram em algumas dificuldades. A falta da estrutura básica até para descobrir se há ou não talento no esporte é uma delas.

Professor de Educação Física e doutorando, Danúbio Lindomar de Almeida Campos conhece bem essa realidade. Em Poconé, a 104 km de Cuiabá, os sonhos são adiados, segundo ele, pela falta de políticas públicas.

Não é falta de talentos ou interessados, ele garante. “Temos uma base muito boa. Os jogos escolares, ou mesmo os regionais e estaduais, revelam isso. Aqui em Poconé, os times de handball e futsal sempre vão para as finais e poderiam chegar ao nível nacional, mas precisa de estrutura”, diz.

Quando se refere a estrutura, o professor fala de apoio dos governantes. Materiais e equipamentos para as aulas da base curricular não faltam. Já quando se fala em suporte das administrações locais e estaduais é que a coisa aperta.

“As coisas já fora muito pior. Hoje em dia, até que melhorou muito. Em algumas situações, os atletas demoram a confirmar participação [em eventos esportivos] por falta de ônibus para levar ”, ele conta. Nessas demandas, o transporte geralmente é fornecido pelas prefeituras.

(Foto:Ednilson Aguiar/ O Livre)

Modelo de sorte

Embora o caminho para se chegar às medalhas seja complexo, o esportista precisa ter, pelo menos, acesso a um clube que o inicie na modalidade esportista de maior nível de competitividade.

Se ninguém teve acesso a um arco e flecha, não é possível saber se haveria medalhista olímpico na modalidade. É preciso dar condições para o salto entre a prática esportiva prazerosa e a competitiva de alto rendimento”, ressalta o coordenador do Grupo de Estudos Olímpicos da Universidades Federal de Lavras (UFLA), Raoni Perrucci.

Para um país continental e populoso, o Brasil não desponta com chances de fazer uma campanha sólida e sonhar com muitos pódios em campeonatos mundiais e nas Olímpiadas, exceto pelo alto rendimento de talentos individuais. “O modelo esportivo brasileiro é de sorte”, ele completa.

É que, tradicionalmente, o país aposta no modelo piramidal. Na base estaria a introdução do jovem no esporte por meio da educação física escolar. Na sequência, o atleta partiria para os clubes, seguido do profissional e, por fim, a elite internacional.

Quando o atleta se destaca

Em alguns casos, os jovens que se destacam esbarram uma segunda vez na falta de ajuda. Na vivência de sala de aula, Danúbio já viu atletas tidos como “promessas”, mas que precisavam de uma estrutura maior para melhorar a performance.

“Os atletas precisam deixar a cidade para testes nos clubes, mas geralmente eles fazem o caminho de volta. Alguns pais chegam a fazer rifa, vaquinha. Só que logo desistem porque é um dinheiro momentâneo”, conta.

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Os clubes aos quais o professor se refere ficam em outros municípios. Em, por exemplo, estão em Lucas do Rio de Verde e Sinop. As duas cidades ficam no Norte do Estado. Por serem grandes produtoras do agronegócio, elas atraem mais investimentos e, consequentemente, mais estrutura.

Quando o atleta se destaca – depois de muito treino – é preciso se vincular à federação antes de competir. Nesse trâmite, a entidade checa se os números do esportista indicam que ele pode atingir a alta performance.

Em Cuiabá, o Centro Olímpico de Treinamento (COT) da UFMT é opção para treinar as promessas do atletismo, por exemplo. Contudo, segundo o presidente da Federação de Atletismo de Mato Grosso, Tomires Campos Lopes, a estrutura não é usado por falta de atletas.

É a aí que os esportistas esbarram novamente na falta de apoio: é necessário que os esportistas tenham os próprios equipamentos e treinadores.

Quem consegue

Mas as coisas já foram piores, reforça Tomires. O projeto Olimpus, executado pelo governo do Estado, como ele cita, contempla 157 atletas. Eles recebem bolsas mensais que vão de R$ 250 a R$ 1,6 mil por mês.

“Já temos estrutura melhor aqui em Mato Grosso. Temos equipamento de ponta e capacidade de treinamento e atletas e promessas saindo daqui”, diz.

Além do auxílio mensal, o governo patrocinou os atletas olímpicos com R$ 30 mil e ainda oferece uma espécie de “recompensa”: quem voltar com medalha, ganhar R$ 100 mil.

(Foto: Marcos Vergueiro/Secom-MT)

Em Tóquio, o Estado é representado – entre outros – por Almir Júnior, do atletismo. Ele não chegou a treinar no COT, mas mesmo assim se despontou. O exemplo é dado por Tomires para reafirmar que inúmeros atletas podem surgir com o devido investimento.

Nesse caso, são exemplos: Lissandra Maysa, do salto em distância, primeira no ranking nacional e que representou o Brasil no Mundial da modalidade no Quênia; Arielly Kailainy, do alto em altura (que garantiu vaga na seleção brasileira de atletismo para o Campeonato Pan-Americano Sub-20 em Lima, no Peru) e o velocista Arielton Costa dos Santos, terceiro lugar no ranking nacional dos 100 metros.

A realidade depois do pódio

A realidade é que os atletas retornam para um cenário nada glamuroso. Mesmo entre os campeões, as bolsas pagas pelo governo federal são escassas e oferecem pouco dinheiro para a sobrevivência dos atletas.

Segundo um levantamento do Globo Esporte, 24 atletas brasileiros competem com menos de R$ 1 mil de auxílio. Outros 83 ganham menos de R$ 2 mil e cinco deles têm que fazer entregas via aplicativo para complemento de renda.

Para chegar até Tóquio, 41 fizeram vaquinha on-line para reunir recursos.

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