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Entidades e pesquisadores criticam projeto que proíbe pulverização aérea de lavouras em MT

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Entidades e pesquisadores criticam projeto que proíbe pulverização aérea de lavouras em MT
Foto: Divulgação/O Livre

O projeto de lei que pretende proibir a aplicação com aeronaves de defensivos agrícolas em áreas plantadas em Mato Grosso – proposta apresentada na Assembleia Legislativa pelo deputado estadual Lúdio Cabral (PT) – não foi bem aceito por entidades ligadas ao setor produtivo no Estado.

Em defesa da pulverização aérea, a Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa) e o Instituto Mato-grossense do Algodão (ImaMT) afirmaram que essa é uma ferramenta essencial, usada na grande maioria dos países agrícolas do mundo e que já estaria comprovado que, quando executada de forma correta, não traz danos ao meio ambiente ou à saúde das pessoas.

As duas entidades defendem ainda que, sem o uso dos aviões agrícolas, a agricultura estaria seriamente comprometida.

Já a Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) argumenta que, no Brasil, cerca de 27% da área plantada com soja utiliza a aviação para aplicação dos defensivos agrícola. Em Mato Grosso, a área corresponde a mais de 30%.

Ainda conforme a Aprosoja, órgãos ambientais do Brasil e de vários outros países, como os Estados Unidos, consideram a pulverização aérea segura e de baixo risco ao meio ambiente.

Presidente da entidade, Antônio Galvan avalia que o projeto do deputado petista vai contra a modernidade e representa um retrocesso. Disse ainda que Lúdio – que é médico – não tem base técnica para abordar o assunto e a proposta não passaria de um “ataque ideológico” contra o setor agropecuário.

Presidente da Aprosoja, Antonio Galvan avalia projeto como um “ataque ideológico”. (Foto: Assessoria)

[featured_paragraph]“Se ele tivesse conhecimento que existe a modernidade e [soubesse da] eficiência da aplicação aérea, não falaria isso. Ele não tem um conhecimento mínimo de base técnica”.[/featured_paragraph]

Quanto à “deriva” – como é chamado o desvio da pulverização –, citada como uma das justificativas do projeto de lei, Galvan afirmou que a realidade é totalmente oposta ao afirmado no texto.

“Hoje, dispersa igual ou menos que o pulverizador pedestre. Isso mostra o total desconhecimento do autor. Ele está usando esse critério para fazer um projeto ideológico, sem conhecimento técnico nenhum”, reiterou o produtor.

Aviação agrícola

Para o professor Wellington Pereira Alencar de Carvalho, coordenador do Programa de Certificação Aeroagrícola Sustentável composta pelas Universidade Federal de Lavras (UFLA), em Minas Gerais, a justificativa de Lúdio Cabral para propor a proibição é “totalmente inverídica”.

Segundo ele, diversos projetos de pesquisas mostram que a informação sobre a “deriva”, destacada por Lúdio, não é real. O professor cita ainda que notas técnicas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) demonstram segurança no uso de aviões nas aplicações dos defensivos.

O professor Wellington Pereira Alencar de Carvalho (foto), junto dos professores Ulisses Antuniassi da Unesp/SP e João Paulo da UFU/MG coordenam o Programa de Certificação Aeroagrícola Sustentável – (Foto: Sindag)

Conforme o pesquisador, para compor o projeto de lei, frases de um estudo da própria Embrapa foram retiradas de contexto, o que teria gerado “uma informação totalmente inverídica”. Segundo ele, esses “estudos mostram que essa informação não é real e garantem a segurança nas aplicações”.

[featured_paragraph]“A própria Embrapa já soltou uma notificação sobre o tema, porque isso foi utilizado em vários pré-projetos ou projetos em tramitação, seja em plano municipal, estadual e até federal, com base em um trabalho de um pesquisador da própria Embrapa. A Empresa diz que a informação foi deturpada diante de um contexto; citação aonde se faz uma análise. Aí o pessoal extraiu uma parte do trabalho e transformou aquilo em uma verdade absoluta”.[/featured_paragraph]

Com mais de 35 anos de pesquisas na área de aviação agrícola, Carvalho lembra que a atividade é regulamentada pelo Ministério da Agricultura e que  existem portarias e decretos que estabelecem as ações, penalizações, procedimentos e as obrigatoriedades, tanto para pilotos quanto para empresas que realizam esse trabalho.

Ele explica que a equipe responsável pela pulverização deve ter um responsável técnico com formação em engenharia agronômica e um coordenador de avião agrícola.

Além disso, para cada avião em operação, é necessário um técnico com conhecimento em aviação agrícola – conhecido como executor – e um piloto com conhecimento sobre tecnologia agrícola, cuidados ambientais, manipulação de produtor agroquímicos, além de conhecimento das leis que regem a aplicação de insumos agrícolas.

Quanto à segurança na aplicação, o professor ainda diz que “as aeronaves utilizadas no campo devem, obrigatoriamente, ter o registro dos dados meteorológicos do momento da aplicação e o croqui da área de aplicação, que é um desenho da área, para que se tenha noção de quais ações ele deve tomar”.

[featured_paragraph]“Todos os dados são georreferenciados, um mapa real de voo. Você joga em programas computacionais e faz a localização de todo o trajeto, toda a aplicação. Tudo o que foi executado durante a pulverização fica armazenado para conferência, inspeções, análises e todo o mais. As empresas são obrigadas a emitir um relatório desse mapa operacional e de toda a execução do trabalho e enviar para as estancias legais, mensalmente”.[/featured_paragraph]

Normas

O pesquisador lembra ainda que existem distancias legais para a operação. A margem de segurança de vilas e mananciais de captação de água, por exemplo, é de 500 metros.

“Todo esse mapa que é criptografado, o que impede de fazer alterações das informações. Serve para que os órgãos de fiscalização verifiquem a operação que foi realizada”, ele destaca.

[featured_paragraph] “Quando existe qualquer denúncia de que o avião passou em tal lugar, você tem, por meio do mapa, a confirmação se ele passou ou não e qual foi o horário, porque isso fica tudo georreferenciado”.[/featured_paragraph]

O professor Wellington Carvalho defende que a indústria de produtos agrícolas vem se desenvolvendo a passos largos e que tem produzido produtos que causam cada vez menos impacto ao ambiente. Ressalta também que os equipamentos utilizados nos aviões possuem mecanismos que amenizam os riscos de “carregarem pequenas partículas para além do local pré-determinado”.

Foto: Graziele Dietrich/Sindag

Por isso, lembra da necessidade de “fazer esse monitoramento de condições meteorológicas, de se escolher a gota adequada para fazer a pulverização, de se fazer a preparação da cauda, escolhas das pontas, dos bicos, para serem utilizadas. Decisões que obedecem a critérios técnicos, operacionais, para exatamente evitar que haja esse risco operacional”, disse.

Ele assegura que, com essas boas práticas agrícolas, os riscos desse trabalho são minimizados e praticamente “perdem seus efeitos”.

“Hoje existe sistemas de GPS que automatizam os procedimentos de interrupção e início da aplicação em locais previamente determinados. Você faz a marcação da própria área de risco e o próprio equipamento atua automaticamente neste processo”, diz, destacando que, assim, o piloto só precisa sobrevoar a plantação.

Agroquímicos x Câncer

O uso de defensivos agrícolas é alvo de críticas por ambientalistas há algum tempo. Eles afirmam que o produto é um potencial causador de câncer. Uma afirmação contestada pelo professor e doutor Angelo Zanaga Trapé, médico toxicologista e pesquisador do Laboratório de Análise Toxicológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

[featured_paragraph]“Nenhum produto utilizado no mundo é considerado cancerígeno. Se assim fosse, a gente teria que mandar prender toda a Organização Mundial da Saúde, toda a Anvisa, prender a EPA dos Estados Unidos, a agência australiana, japonesa, europeia. Não faz sentido”.[/featured_paragraph]

Segundo ele, “não existe nenhum trabalho científico, embasado, que relacione que ser agricultor e se expor a agroquímicos de maneira constante cause câncer”.

Com 42 anos de atuação na área de toxicologia, grande parte deles dedicados a pesquisas sobre agroquímicos, Ângelo Trapé sustenta que em todas as pesquisas que realizou não encontrou relação entre a aplicação do produto e o câncer. “Falar é fácil, o difícil é comprovar isso”, ele diz sobre os críticos.

Trapé ressalta que a “toxicologia é uma área da ciência que exige um aprofundamento científico e estudos técnicos” e critica o fato de famosos levantarem bandeiras contra esses produtos, sem entender do assunto. “Todo mundo hoje é toxicologista, todo mundo. A Rita Lobo da GNT, a Bela Gil. Todo mundo fala que tem câncer, todo mundo”, desabafa.

[featured_paragraph]“Não existe nenhum estudo cientifico comprovatório de que a tecnologia agroquímica cause câncer. Aliás, em Mato Grosso, se você pegar a taxa bruta de câncer divulgada pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), de todos os tipos de câncer, para homem e para mulher, a taxa bruta em Cuiabá, capital, é muito maior do que no resto do Estado. É uma incongruência, porque acredito que em Cuiabá não se aplica agrotóxico, né?! É com esse indicador que eu tenho que trabalhar como cientista, não com suposições ou por ideologia”.[/featured_paragraph]

O pesquisador afirma ainda que a tecnologia agroquímica é “utilizada no mundo inteiro sem maiores problemas, desde que usados de maneira correta e adequada. Respeitando as normas técnicas, as boas práticas agrícolas, você não vai ter problema nenhum”, ele garante, afirmando que os agentes químicos que mais causam intoxicação no Brasil são os medicamentos e que as crianças são as principais vítimas.

[featured_paragraph]“Toda tecnologia é perigosa. A mais perigosa no mundo é a tecnologia automotiva. Ela mata mais de 40 mil pessoas por ano no Brasil. Porque é utilizada de maneira inadequada. Os indivíduos que morrem ou sofrem sequelas, muitas vezes, estão dirigindo em alta velocidade, com uso de bebida alcóolica, sem cinto de segurança, com veículo com baixa manutenção, não respeitando as boas práticas. Na tecnologia automotiva é assim, na tecnologia agroquímica é assim”.[/featured_paragraph]

Professor-doutor, Ângelo Trapé afirma que não existe nenhum estudo científico que comprove que a tecnologia agroquímica causa câncer (Foto: Alesp)

Pesquisa em MT

Angelo Trapé relata que, em 2016, realizou uma pesquisa com a participação de mil agricultores de cinco cidades do interior de Mato Grosso. Intitulada “Agricultor Saudável”, a pesquisa que, em breve, será publicada na Revista de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), produziu um relatório do quadro de saúde de produtores rurais que tinham contato direto e indireto com produtos agroquímicos.

Segundo ele, foi constatado que “72% da amostra tinha sobrepeso e obesidade”, justificado pelo consumo de churrasco e álcool. “Avaliamos tudo. A história de exposição, teste de alcoolismo e índice de massa corporal. Não teve nenhum caso de intoxicação. Zero intoxicação”, afirma.

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