Está em análise na Câmara Federal um projeto de lei que prevê a castração química voluntária de estupradores. O projeto pretende alterar o Código Penal e a legislação que trata de crimes hediondos para endurecer as penas previstas para esse tipo de crime.
Para que o PL seja analisado em um ritmo mais rápido são necessárias 171 assinaturas de deputados federais. Um dos que mais recentemente anunciou apoio foi o mato-grossense Nelson Barbudo (PSL-MT).
A castração, química ou cirúrgica, seria empregada como uma exigência complementar para que o criminoso condenado por este tipo de delito consiga a progressão de pena.
O projeto tem ganhado força e apoio de parte da sociedade. Mas você sabe do que se trata a castração química? Como ela funciona? Que gastos traria para os cofres públicos?
O LIVRE conversou com o médico Humberto Ikuo Shibasaki, diretor clínico do Instituto Pérola e professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), que respondeu essas questões.
Castração
É importante começar definindo a palavra castração: “é um ato de mutilação sexual em que incapacita-se o indivíduo de reproduzir-se sexualmente e suprime seu porte de hormônios sexuais. O ato consiste na extirpação das gônadas: testículos na castração masculina; ovários na castração feminina“.
Na castração física é feita uma cirurgia em que os testículos – no caso dos homens – e os ovários – no caso das mulheres – são removidos.
Já a castração química é temporária, ocasionada por medicamentos hormonais e pode ser usada por vários motivos, como para tratar cânceres hormônio-dependentes, como o câncer de próstata.
“Ao sugerir uma pílula anticoncepcional, por exemplo, eu estou castrando você quimicamente pelo hormônio que eu lhe dou. Eu estou reduzindo a capacidade do seu ovário funcionar”, exemplifica o doutor Humberto Ikuo.
Medicamentos
Países como a Indonésia, a Rússia, a Polônia e alguns estados do Estados Unidos já aderiram à castração química como punição a pessoas que tenham cometido crimes sexuais. Geralmente, essas pessoas recebem em troca dessa castração voluntária uma redução na pena.
Nos Estados Unidos, a castração química é feita através da administração de acetado de medroxiprogesterona (AMP), já na Europa, no Oriente Médio e no Canadá é usado o acetato de ciproterona (ACP).
“São dois hormônios que diminuem e atrofiam o testículo e, no caso da mulher, o endométrio. Eles atrofiam e, às vezes, se tornam até irreversíveis“, explica o médico.
Há também uma nova classe de medicamentos, os agonistas do hormônio liberador de gonadotropina (GnRH), que são liberados no cérebro da pessoa para reduzir drasticamente a testosterona e o desejo sexual.
Uma terceira alternativa, segundo o doutor Humberto, seriam os antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS). Normalmente usados em tratamentos para depressão e ansiedade, os antidepressivos também podem diminuir a libido.
Gasto eterno
As opções atuais de castração química, no entanto, são medicações que precisam ser usadas a vida inteira. Injeções mensais, trimestrais, via nasal, ou subcutânea diária.
Ou seja, se o projeto de lei que tramita na Câmara for aprovado, isso trará um gasto aos cofres públicos enquanto o condenado estiver vivo.
O professor Humberto Ikuo Shibasaki acredita que, se o projeto for aprovado no Brasil, a castração química será feita a exemplo dos Estados Unidos, Europa, Oriente Médio e Canadá, com hormônios que diminuem e atrofiam o testículo, por ser o método mais barato entre os três já disponíveis.
Complicações
Segundo o professor Humberto, o acetato de medroxiprogesterona, por exemplo – usado nos Estados Unidos como método de castração química -, é atualmente usado por mulheres como contraceptivo.
“Usam medroxiprogesterona em altas doses de 50 mg a cada três meses. Eu não recomendo as mulheres a usar isso. Por que? Porque as vezes atrofia não só os ovários, mas também a parte de dentro do útero, que é o endométrio. Então, não consegue mais ter a função necessária”, disse o médico.
O homem correria o mesmo risco de não conseguir reverter a castração e ficar para sempre com o testículo atrofiado.
“Ele [medroxiprogesterona] vai atrofiar os testículos e não sei quanto tempo ele vai precisar para recuperar a função depois que parar o uso, isso se recuperar”, ele afirma.
Humberto Ikuo alertou que nem sempre a castração química pode ser revertida.
Eficácia
Questionado se diminuir os hormônios assim, drasticamente, poderia acabar com o desejo sexual dos estupradores – e, consequentemente, a chance de cometerem novos crimes -, o doutor Humberto responde que sim.
“Diminui os hormônios sexuais faz a testosterona diminuir e o desejo sexual cai. Você vai deixar esse indivíduo em uma situação hormonal baixa para a sexualidade e ele terá menos atitudes de crimes sexuais“, afirmou.
Uma castração física – em que são retirados o órgãos genitais – poderia não ter o mesmo efeito. Há casos em que os estupradores ainda utilizam objetos para cometer o crime. No caso da castração química, o que é retirado deles é a libido.
“O mecanismo que eles [deputados] estão vendo tem a intenção de impedir, justamente, isso. A ideia é baixar o nível hormonal e, com isso, diminuir a libido, o desejo, o pensamento em relação ao estupro“, disse o professor Humberto Ikuo Shibasaki.