Pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) têm vivido dias de incerteza desde que a reitoria anunciou que o fornecimento de energia elétrica do campus Cuiabá pode ser interrompido por falta de pagamento.
Estudos – alguns deles desenvolvidos há décadas – estariam ameaçados por depender de equipamentos como refrigeradores. É o caso de uma das pesquisas do professor de Biologia Alexandre Paulo Machado.
Ele está há 10 anos avaliando o desenvolvimento de bactérias multirresistentes. E outros tantos dedicados a descobrir a utilidade de micro-organismos para a indústria do agronegócio, por exemplo. Seres que, se morrerem, podem nunca mais ser identificados na natureza.
“Não só a minha pesquisa, mas as de muitos professores vão ser prejudicadas”, afirma Alexandre, destacando que, no seu caso, sair da UFMT com seus estudos é algo impensável.
Segundo o professor, por se tratar de bactérias com alto potencial de contaminação, o equipamento eventualmente emprestado por outra instituição nunca mais poderia ser reaproveitado.
“Não dá para, da noite para o dia, sair correndo atrás de outro freezer. E nem seria uma situação adequada. Eu trabalho com contaminação biológica pesada. É uma questão de biossegurança”, diz.
Prejuízo não só acadêmico
Além dos anos de trabalho, Alexandre afirma que um “apagão” na UFMT tem potencial para agravar ainda mais a crise financeira da universidade. No hospital veterinário, por exemplo, não só os animais sofreriam sem refrigeração adequada; medicamentos podem se perder.
Equipamentos de alto custo – alguns deles com valor que ultrapassa a marca dos R$ 300 mil – também correm o risco de queimar. “Eles representam, talvez, de 2% a 3% de todos os equipamentos que existem na UFMT, mas são a joia da coroa”, pontua Alexandre.
Uma simples manutenção, necessária quando há oscilações na rede elétrica, conforme o professor, pode custar de R$ 20 mil a R$ 30 mil. E, segundo o que afirma Alexandre, essas oscilações são constantes.
“A queda de energia é frequente, mas não chega a prejudicar tanto. Já aconteceu de ficar o fim de semana inteiro [sem fornecimento de energia elétrica], mas como se manteve o freezer fechado, acabou mantendo a temperatura”, ele conta.
Bloqueio de recursos
De acordo com a reitoria da UFMT, o bloqueio de recursos promovido pelo governo federal foi o fator que teria levado a instituição à iminência de ter o fornecimento de energia elétrica cortado. A própria universidade divulgou nota informando ter sido notificada pela Energisa devido ao não pagamento de uma conta.
Informações extraoficiais obtidas pela reportagem do LIVRE dão conta, entretanto, de que o atraso no pagamento das faturas seria sistemático, desde 2014. Há cinco anos a UFMT teria, ao menos, três contas não pagas, o que teria forçado um parcelamento do débito.
Quando o governo federal anunciou o bloqueio em parte do orçamento destinado às universidades, a UFMT teria ficado, então, sem recursos para honrar uma das prestações desse parcelamento, o que teria levado ao comunicado sobre o corte no serviço.
Em nota, UFMT informou que efetuou um pagamento dentro do prazo que teria sido combinado com a concessionaria de energia elétrica: a última sexta-feira (5). E ainda que “continua em renegociação com a Energisa para saldar a dívida retroativa”.
Já a Energisa informou que “situações de adimplência ou inadimplência dos clientes são informações confidenciais”. A empresa confirmou, entretanto, que a falta de energia que atingiu o campus na semana passada se deu por problemas técnicos, internos da própria universidade.
Sem comunicação
Aos professores e pesquisadores, a reitoria da UFMT ainda não informou como anda a situação, conforme Alexandre. O biólogo afirma que tudo o que sabe sobre a situação financeira e do fornecimento de energia para a universidade descobriu pela imprensa.
“Sei que eles tiveram uma reunião no Ministério [da Educação] na semana passada e que, por enquanto, não há mais risco de corte. Mas que a situação é a seguinte: estão vendendo o almoço para comprar a janta”, ele diz.