“Para dar minha conta feita a tempo,/ O tempo me foi dado e não fiz conta,/ Não quis, sobrando tempo, fazer conta,/ Hoje, quero acertar conta, e não há tempo”.

O autor destes versos foi um capitão do exército português que deixou a vida militar para tornar-se padre letrado e viveu na Bahia já com o novo nome de Frei António das Chagas. Ele conclui assim o seu soneto: “Pois aqueles que, sem conta, gastam tempo,/ Quando o tempo chegar, de prestar conta,/ Chorarão, como eu, o não ter tempo”. (Você pode ouvir o poema aqui).

Estamos em janeiro, do Latim januarius, de Janus, deus das portas na Roma Antiga. Ele tinha duas caras: uma na frente, como todos nós; outra na nuca, como nenhum de nós.

Para proteger o futuro, Jano olhava também para o passado e via o que tinha acontecido em dezembro, o último mês do ano. Uma porta se fechava, como se cantasse “Adeus, Ano Velho”, e outra se abria, como se saudasse “Feliz Ano Novo”.

Por meio desta metáfora com o deus Jano, os antigos romanos viam as coisas como se o passado anunciasse o futuro. Esta é também a ideia de fazer o cadastro de pessoas e de instituições, pois foram eles também que criaram o binômio pessoa física e pessoa jurídica, uma vez que as pessoas e as instituições costumam pautar suas existências por repetições e até por instabilidades semelhantes às dos astros, que fazem a mesma rota aparentemente estável todos os dias e nos indicam com sua viagem a nossa própria viagem.

Dezembro também tem sua história. Veio do Latim december, o décimo mês. Janeiro e fevereiro foram acrescentados na reforma do calendário feita por Numa Pompílio, o segundo rei de Roma, em 713 a.C., portanto quarenta anos ab urbe condita, expressão do Latim para dizer “desde a fundação da cidade”, também abreviada em AUC ou a.u.c.

Até então, o ano começava em março. Além de dezembro, os étimos dos meses de setembro, outubro e novembro atestam que o ano teve originalmente dez meses e que eles eram o sétimo, o oitavo e o nono mês: september, october, november. Portanto, contamos o tempo a partir do nascimento de Jesus, origem da expressão abreviada em a.C., antes de Cristo.

Esta inovação foi introduzida no século VI por um monge chamado Dionísio, que viveu onde hoje fica a Romênia. Muito bom em matemática e em astronomia, por encomenda do Vaticano, fixou a data do nascimento de Jesus no ano 753 da fundação de Roma, criando a expressão Anno Domini, Ano do Senhor.

O novo calendário, que dominaria o mundo a partir do século IV, foi baixado no ano 284 da Era de Dioclesiano, dali por diante designado 532 A. D., isto é, 532 anos depois de Cristo. Com o tempo, tirou-se a expressão A.D. e foram mantidas apenas as iniciais a.C. para os eventos ocorridos antes de Cristo.

O novo calendário tornou-se hegemônico porque o imperador Constantino, depois da batalha em que viu no céu um feixe de luz cercando a cruz com a frase In hoc signo vinces (com este sinal vencerás), tinha baixado um decreto de tolerância religiosa para o cristianismo, a seguir tornado religião exclusiva do império por Teodósio I ainda no mesmo século.

Em 1582, o papa Gregório XIII percebeu que as alterações feitas no ano 46 a.C. por Júlio César, chefe militar e estadista da Roma antiga, estavam com uma defasagem de dez dias. Assessorado por astrônomos, tal como havia feito o autor de De Bello Gallico (A Guerra Gaulesa), o Sumo Pontífice baixou a bula Inter gravíssimas, retirando dez dias do novo calendário.

Assim, o dia seguinte a 4 de outubro não foi o dia 5, mas, sim, o dia 15. Esta reforma teve, entre outros, os objetivos de fixar corretamente a data da Páscoa e o começo das estações, pois a diferença vinha causando desordens nas festas religiosas e na agricultura.

É por isso que estamos em 2019 e é por isso também que nosso calendário é chamado gregoriano. (fim)

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