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A quarentena é a única resposta?

O caótico sistema brasileiro é resultado da incapacidade de se estabelecer critérios e perceber nuances

4 minutos de leitura
A quarentena é a única resposta?
(Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Esta pandemia revelou de vez o dogmatismo bovino da classe intelectual brasileira. Eu me explico. Acompanho aqui da Europa o espalhamento do contágio no Velho Continente. Quadros catastróficos da doença viral, como o da Itália e da Espanha, surgiram rapidamente no cenário europeu, aterrorizando a todos, colocando governos em xeque.

A velocidade com que o vírus se espalhou revelou, primeiro, a fragilidade dos sistemas nacionais de saúde. Governo nenhum do mundo estava preparado para um problema de tão grande proporção.

No entanto, apesar de estarem debaixo de uma só bandeira, os países da União Europeia continuam tendo liberdade de seguir suas próprias diretrizes durante a crise, pelo menos até hoje.

Abordagens autônomas

Países minúsculos, menores e menos populosos do que muitos estados brasileiros, como a Suíça e a Holanda, mantiveram a autonomia para decidir que tipo de abordagem iriam abraçar para combater a epidemia.

A Holanda decidiu adotar medidas de distanciamento social, mas sem a rigidez da quarentena total imposta à força, e no dia primeiro deste mês resolveu manter as mesmas diretrizes até o fim do mês[1].

A Suíça, que teve suas fronteiras com o norte da Itália abertas tempo demais, e também retardou ao máximo a adesão à quarentena, só a declarou oficialmnte no dia 19 de março. Não tomou medidas drásticas de cancelar transportes públicos e serviços essenciais, mas a curva de contágio já está baixando e já se discute a volta do funcionamento de todos os setores comerciais. Mercados e farmácias nunca pararam.

A Suécia[2], com mais razões até para se preocupar com a pandemia do que os países de clima mais quente do sul da Europa, não decretou a quarentena total e manteve bares e restaurantes abertos com distanciamento social, ou seja, respeito do espaço físico entre os clientes.

A Dinamarca, ao contrário, fechou tudo, mas já marcando data para reabrir, em meados de abril.

Incertezas

A grande diferença entre a discussão pública sobre a quarentena entre o Brasil e a Europa é que, no Velho Mundo, ela se fundamenta no respeito à autonomia dos parlamentos nacionais e na convicção de que não há 100% de certeza em relação a nenhuma medida.

Por aqui se sabe que estamos apenas retardando  o inevitável. O vírus vai contaminar eventualmente a maior parte da população mundial – e o prefeito de Limeira[3] é quem está certo.

Um país que declara fechamento de tudo pode vir a sofrer picos de contágio quando abrir novamente o comércio. As perdas econômicas, e o inevitável sofrimento que elas vão ocasionar, ainda não estão sendo contabilizadas.

O número de mortos pelo vírus não está sendo contabilizado corretamente em muitos países. É bem provável que tenham sido inflados na Itália e na Espanha – e ocultos na China.

A proporção de pessoas contaminadas e portadoras do vírus na população é desconhecida e, portanto, a verdadeira letalidade do vírus também não pode ser determinada com precisão. Máscaras protegem, mas o mundo se pergunta se o vírus sobrevive no ar.  Até agora se pensava que não, mas já existem vários cientistas afirmando que sim.

Incapacidade de perceber nuances

A única certeza que se têm é que não há certezas absolutas quando se trata da pandemia. Nem as estatísticas nos afirmam a segurança de uma postura ou outra, porque estatística também tem que se basear em fatos e estes mudam a cada dia.

A discussão sobre a quarentena, sua efetividade, duração, grau de isolamento e que grupo de pessoas tem que isolar, se fosse uma decisão racional, teria que levar em conta a variedade de opiniões.

Temos que levar em conta as diferentes abordagens adotadas ao redor do mundo, outras considerações além da questão sanitária, como a fome e o desemprego e, principalmente, a falta total de certezas ao redor do tema.  A nossa classe “intelectual”, no entanto, é incapaz demais para perceber nuances.

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[1] https://thesaxon.org/the-netherlands-extended-the-quarantine-for-another-month/17636/

[2] https://www.wsj.com/articles/inside-swedens-radically-different-approach-to-the-coronavirus-11585598175

[3] https://d.arede.info/cotidiano/319161/prefeito-de-limeira-vira-meme-apos-declaracao-sobre-a-covid

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