Recentemente ganhei, enviado pelo próprio autor, um livro que me chamou bastante a atenção, tratava-se de um título sugestivo e um conteúdo extremamente desafiador e questionador: A Fraude Educacional Brasileira, escrito pelo professor Dr. José Aparecido da Silva e que trata da desmascarar a forma “romantizada” como a educação e o aluno são tratados hoje em dia, sem levar em consideração a vontade do discente, os níveis intelectuais que existem, o sistema como um todo, a carência na formação educacional dos professores e tantos outros fatores que ocasionam em uma situação lamentável nos níveis educacionais atuais e com uma perspectiva ainda mais desoladora.

O referido autor mostra que os atores do processo educacional contribuem ou são forjados em um sistema que mais atrapalha que ajuda no processo de desenvolvimento intelectual, quando se trata disso; no entanto os desastres são perceptíveis a olhos nus no sistema educacional, mudando apenas o endereço da escola mas sendo cada vez mais levado a um nível que busca muito mais abordar a educação como um “direito” que um dever de todos os envolvidos, principalmente dos alunos que não precisam se esforçar o suficiente para galgar os degraus, ficando apenas em nível relativamente mediano, quando muito.

A cada dia que se passa vemos alunos que são “jogados” no mercado profissional ou no universo acadêmico que não sabem utilizar um acento indicativo de crase, não fazem a mínima ideia do que sejam orações subordinadas e muito menos sabem aplicar uma regência verbal e ou nominal de forma no mínimo coerente; não vamos nem pender para outras áreas do conhecimento porque se formos para a matemática ou o raciocínio lógico o desastre será ainda maior, a nível de tsunami ou até mesmo desmoronamento do Everest!

Apresenta-se a educação como sendo um direito, o que destoa um tanto quanto do real sentido da educação que é formar um ser humano pleno, com todas as suas faculdades perfeitas, uma vez que, quando entendemos algo como sendo um DIREITO acabamos por utilizarmos esse direito como bem entendermos. Vejamos, temos o direito à liberdade, frente a isso muitos acabam praticando violência, desrespeito e colocando o seu direito a cima de todos os demais, o que acarreta em aplicações da lei para coibir os excessos. É uma forma de sabermos que as leis existem pelo fato de o ser humano não saber utilizar o que chama de DIREITO, colocando o seu particular como sendo superior aos demais. Mesmo quando se utiliza a noção de direito como sendo algo particular percebemos que a ideia de DEVER acaba ficando para um segundo momento.

Vamos particularizar um pouco mais: Quando adquirimos um carro temos o direito sobre ele, podemos inclusive emprestar, mandar reformar, vender, utilizar de má forma para que cause acidentes e prejudique quem quer que seja, enfim. Se o bem é MEU DIREITO então posso utilizá-lo da forma como bem achar que devo, sem sentir necessidade de utilizar de forma correta e da melhor maneira possível. Analisemos quantos acidentes provocados por cidadãos alcoolizados e pessoas que agem de má fé para prejudicar seus pares em nome de um direito de ter o seu veículo e beber à vontade, sem esquecer de sair dirigindo de forma incoerente e lamentável.

Quando entendo o meu carro como um dever de bem utilizar, não importa que o mesmo seja direito adquirido ou não, trato de utilizá-lo da melhor forma possível, com respeito aos outros e pensando nas consequências que possam acarretar pelo manuseio irresponsável e inconsequente. Tenho o dever de zelar o bom uso dele, de o manter sempre em excelente nível de conservação, procuro manter-me correto em relação aos documentos que preciso e dos itens de segurança para que o melhor seja produzido com a utilização do referido elemento. Podemos alinhar essas ideias também à educação.

Alunos que, independente do nível no qual se encontram, ficam aterrorizados se um professor resolver DITAR questões inteiras porque não conseguem decorar uma frase com cinco palavras, ou ainda se desesperam se, no meio, o professor falar: “hífen”, “crase”, “grife da conjunção até a preposição seguinte” etc. terão condições de entenderam uma tese, uma dissertação ou até mesmo um simples conto machadiano ou ainda um parágrafo de Fiódor Dostoévski, ou acharão beleza nas linhas do Padre Vieira?

Jovens que entendem que é SEU DIREITO o curso superior, por exemplo, e que por isso não se empenham como deveriam para passarem em universidades ou as cursar com o máximo de envolvimento intelectual e pessoal procurarão fazer da melhor forma possível como se o direito é dele e ele o usa como bem entender? Alunos que saem das escolas, não importam o nível ou endereço, se da rede pública (realidade muito pior que a privada!) ou privada, que mal estudam mas que são aprovados quase que empurrados para a série posterior porque o corpo docente ACREDITA que os mesmos que nada fizeram o ano inteiro, ou fazem de conta que faziam algo para serem aprovados de forma inconsequente pelos professores que não pensam no perigo que profissionais mal formados causarão à sociedade e que essa merece ser laureada com mais uma aprovação inconsequente, talvez por um professor que mal domine a sua área por ter sido jogado, de série para série, até conseguir o diploma sem conhecimento.

Imaginemos o seguinte: Hoje temos alunos que não dão o menor valor à educação porque sabem que, no final do ano, a ampla maioria dos que quase nada faziam estarão na série posterior, dividindo os mesmos espaços que alunos que cumpriram todos os prazos, entregaram todos os trabalhos, não se colocaram como irresponsáveis mas que antes buscaram cumprir com seus deveres. Imaginemos alunos que estarão na série posterior sem terem se esforçado o suficiente (e eles têm consciência disso perfeitamente!) e que conseguiram, como “prêmio” uma aprovação que nem eles mesmos conseguem entender, qual o motivo que eles terão para se esforçarem no ano seguinte se a preguiça e o relapso educacional do ano anterior foram “laureados” com a aprovação? Qual a intenção que um cidadão desses terá de ensinar o valor da formação educacional aos seus descendentes se ele mesmo é um exemplo de que estudar não precisa, o que importa é passar de ano? Qual o critério para ensinar a necessidade de se buscar o conhecimento acima de tudo, de procurar abrir mão de todos os prazeres e desejos em vista de algo intelectualmente superior?

Imaginemos ainda mais: Um aluno é aprovado sem esforço nenhum, apenas pelo “mérito” de ser aluno da escola ou bom pagador, ou ainda por ser “boa praça” junto aos professores ou qualquer outra ideia, consequentemente o referido faz um vestibular e passa, coisa não muito difícil, uma vez que as políticas educacionais e ou de incentivo ao ensino superior permitem e querem apenas um monte de indivíduos analfabetos funcionais que não sabem se quer conduzir um debate em um nível intelectual básico, mas que paguem suas mensalidades e possam cumprir com nenhum compromisso acadêmico ou ao menos sejam bajulados como “pequenos bibelôs que mal saíram do maternal e que precisam de um professor puxa-saco”, não de um docente universitário. Esses seres com instrução educacional quase nula conseguem galgar os degraus da academia através de amizades com professores ou com utilização de outras formas talvez não tão legais de se conseguir notas e chegam ao último ano da academia. Em algumas situações algum desses podem até conseguir que alguém esteja disposto a oferecer um “servicinho” no Trabalho de Conclusão de Curso a um valor acessível, dependendo do bacana apenas dar uma lidinha final no texto e defender para uma banca de professores que concedem a aprovação.

Imaginemos ainda que um desses cidadãos que saíram conscientes de que a educação superior é um direito e não um dever ou até mesmo mérito em vista dos enormes serviços que serão prestados à sociedade foi formado no curso de Direito, Administração, MEDICINA, LICENCIATURAS DIVERAS ou qualquer outra área. Qual professor que olhou, no passado, para aquele que foi jogado para a série posterior vai confiar em passar por uma cirurgia delicada, entregar um processo importante ou até mesmo um filho nas mãos de alguém que durante toda a sua formação, desde a mais tenra idade, foi jogado de uma série para a outra de forma a apenas concluir e ter um diploma para colocar na parede mas não ter conhecimento suficiente para elaborar um TCC!?

Pessoas formadas com o senso de direito e que são aprovadas de série para série sem lerem um livro por completo para o conhecimento mas apenas resumos ou vídeos porque precisarão fazer uma prova; jovens que passam a vida educacional sem terem acesso a clássicos da literatura de qualquer área de conhecimento como uma forma de ser cada vez mais e melhor formado mas apenas como obrigação de realizar uma prova ou apresentar um trabalho, ou ainda pior, apenas visando uma porcaria de uma nota que muitas vezes é muito mais imoral que justa, desprezando o conhecimento que o faria muito mais consciente porque o que interessa à maioria absoluta da sociedade (pais, familiares, professores, escolas) é a aprovação e não o conhecimento. Se mentira fosse que a aprovação em detrimento do conhecimento é o que mais os agentes sociais querem os pais acompanhariam frequentemente os seus filhos, vendo os resultados e ficando atentos a toda a programação do calendário escolar, procurariam conhecer o Projeto Político Pedagógico das escolas dos seus filhos e participariam de todas as reuniões; os alunos deixariam de levar a educação de forma medíocre e se esforçariam em busca do conhecimento, uma vez que na sociedade não temos os melhores lugares para quem se conforma com a “média escolar”, mas apenas para quem busca o topo; os professores seriam mais unidos em busca do conhecimento do aluno não permitindo que um aluno analfabeto funcional fosse aprovado sem dominar o essencial para a série no qual o discente está e que serve como base para a posterior; as escolas não visariam apenas o retorno de conhecimento e reconhecimento, tanto financeiro quanto de nome, e não aceitariam que alunos fossem jogados no mercado profissional e acadêmico como massa de manobra que não consegue interpretar um semáforo. É evidente que não há muito o que fazer com um sistema educacional como o brasileiro, totalmente engessado e que tem como patrono um ser que representa melhor que ninguém essa situação lamentável da educação e que coloca todos contra o professor como “fantástica demonstração do oprimido contra o opressor ou ainda agindo como verdadeiros remanescentes da Síndrome de Estocolmo.

Um aluno que consegue ser aprovado sem que lhe seja cobrada a leitura de inúmeros clássicos da sua língua, por professores que acham Machado de Assis uma leitura de nível elevado (!?) para os seus alunos, consegue ser aprovado com todos os benefícios possíveis, até com escolas que se adaptam ao seu gosto e tempo e não o contrário, que não estuda e é aprovado em um vestibular, tornando-se símbolo do sistema de ensino e não como ícone de conhecimento, que não aceita uma reprimenda de um professor e que ainda, em inúmeros casos, agride verbalmente, fisicamente a até mesmo com um olhar que consegue transparecer toda a sua ira por ter sido repreendido, que tem o responsável que recebe a sua nota e não o interroga sobre a mesma mas prefere perguntar ao professor o significado daquele resultado vai ter consideração com a educação quando?

Se estamos entregando à sociedade pessoas que não têm compromisso nenhum com a educação qual o resultado que podemos esperar para os anos futuros da e na educação!? Se permitimos que alunos saiam das universidades totalmente analfabetos funcionais que precisam de um cursinho se quiserem ser aprovados em exames de alto nível qual o resultado que esperamos das áreas que grande impacto social e pessoal?

Se vemos alunos que precisam de cursinhos para serem aprovados em vestibulares concorridos ou terem ótima colocação no ENEM, sinal inequívoco da péssima qualidade educacional do Brasil, por mais que alguns professores e específicas escolas se esforcem, qual o resultado que podemos esperar da nossa sociedade? Cidadãos que não leem nem uma linha sobre reformas distintas governamentais, quando leem não possuem capacidade intelectual mínima para interpretarem mas que saem às ruas para protestarem contra coisas inexistentes ou pedirem a soltura de um corrupto lavador de dinheiro terão condições de guiar nossos destinos daqui a alguns anos?

Cabe a todos nós, sociedade civil, cobrar uma educação de alto nível em todas as áreas, com exames que ensinem do básico à nata de todas as ciências, que conheçam e entendam que educação é direito enquanto situação capaz de abrir as portas para o conhecimento intelectual mas é um dever no tocante à necessidade do homem e da mulher em melhor se preparar em vista aos excelentes benefícios que serão, ao menos em tese, prestados à sua nação, ao seu povo.

Infelizmente a esperança não é muito ampla pois fica difícil modificarmos algo que tem uma pauta tão engessada e que forma muito mais militantes que intelectuais, que possui uma das academias que recebem valores consideráveis em investimentos mas que não dispõem de um Prêmio Nobel se quer, e que acha totalmente normal promover ideologias de esquerda (Não deveriam promover nenhuma!) como algo democrático mas que não aceita o contraditório por considerar o referido como “intolerante”!

Que nossos pais e responsáveis se coloquem como partícipes da formação educacional dos seus filhos e apoiem os professores que procuram o máximo do discente e não apenas esperem uma nota como se a referida fosse sinal de conhecimento e aprendizagem! Que nossas escolas continuem (não todas!) na sua missão essencial e especial de formar pessoas intelectualmente plenas e capazes de serem sucessores, à altura, de Machado, Nabuco e tantos outros nomes de excelente nível intelectual!

Quem sabe assim possamos modificar a máxima machadiana presente no Memórias Póstumas de Brás Cubas e olhar para nossos descentes e dizer: “Tive filhos, transmiti a eles a excelência do nosso conhecimento!”

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