O relógio bateu doze vezes naquela lúgubre noite de novembro. Chovia forte, quando o intenso raio foi sugado pela parafernália do castelo de Odenwald e penetrou no corpo de Frankenstein, trazendo-o à vida. A energia sendo gerada a partir de um raio: assim era a imaginação sobre a eletricidade em 1816, antes da 1ª lâmpada ser inventada.
De lá para cá, a evolução energética nos levou à revolução industrial, que nos levou à revolução digital e que nos trouxe até aqui, com toda a gente pensando o que fazer daqui em diante, sobre como enfrentar a necessária transição para matrizes energéticas mais limpas; ou, em outras palavras, com menos petróleo movendo a maquinaria do mundo.
Toda a questão gira em torno da pergunta: quanto custa? As pessoas, governos ou empresas, não tendem a ser contra um mundo mais ecológico; desde que a escolha não impacte em seus bolsos. E é certo que a matriz energética do mundo, nesse momento, se mantém à base dos combustíveis fósseis. Mas também é certo que algumas alternativas começam a ganhar visibilidade, devido ao barateamento e à facilidade de acesso.
As energias eólica e solar estão a galope: em vinte anos, de míseros 1% passaram a representar 20% de toda a energia gerada no Brasil. Isso não aconteceu por passe de mágica, mas porque o custo caiu 80%, segundo a Agência Internacional para as Energias Renováveis[1]. E quanto mais energia renovável, mais depressa o país irá rumo à produção do hidrogênio verde. Mas, vamos por partes, o que é isso?
Hidrogênio verde é um processo que consegue separar a água (H²O) em Hidrogênio e em vapor de água, de uma forma não poluente. O Brasil já está produzindo timidamente, mas a possibilidade de sermos os maiores produtores mundiais é real, já que temos grandes volumes hídricos, enorme incidência solar e condições favoráveis para a instalação dos parques eólicos e das fazendas de painéis solares. Ainda há novidades chegando …
Nesse momento o Brasil estuda a implantação de parques eólicos offshore, o que significa que a exploração ocorre em alto mar. O sistema tem inúmeras vantagens, como a força e a constância dos ventos, a possibilidade de instalação de aerogeradores muito maiores e mais potentes, e a ocupação de superfícies extensas, além da minimização dos impactos visuais e sonoros. Os projetos estão sendo analisados pelo IBAMA.
Outra inovação, essa já bem estabelecida na Índia, é fixar painéis solares em cima de superfícies aquáticas. Em 2012, um projeto piloto instalou painéis por 532 km, por cima de canais do Rio Narmada, o que vem gerando energia para motores de irrigação e bombas de água e também impedindo a evaporação das águas, mantendo-as mais frias, além de liberar espaço para o plantio – já que as instalações ficam por cima do leito dos canais. Anualmente, este projeto tem gerado 1 MW de energia limpa e evitado a evaporação de 9.000.000 litros de água dos canais.
Aqui no Brasil, tais tecnologias verdes devem gerar Hidrogênio em abundância. O H²V, como também é chamado, já está sendo usado na China, Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão e Alemanha como combustível, em todos os modos de transporte (rodoviário, aéreo, marítimo e ferroviário), servindo para a indústria de alimentos, geração de eletricidade residencial e industrial, em refinarias, e outras finalidades.
Frankenstein moderno poderá ficar sossegado em seu castelo ecológico. Talvez, nem precise mais ser “a criatura”, quando a tecnologia permitir – em território nacional – conciliar lucro e preservação ambiental. Os ventos são favoráveis, neste nosso país, em que há um sol para cada um dos brasileiros.
***Andréa Ferraz Fernandez é jornalista. Tem doutorado na área da Ergonomia da Informação e pós-doutorado em Comunicação Audiovisual, pela Universidade de Málaga, Espanha. É docente da Universidade Federal de Mato Grosso, UFMT, lecionando nos Programa de Pós Graduação em Estudos da Cultura Contemporânea (ECCO), no Programa de Pós Graduação em Comunicação e Poder (PPGCOM) e no Curso de graduação de Cinema e Audiovisual.