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Os não vacinados contra a COVID-19 e os contratos de trabalho

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Os não vacinados contra a COVID-19 e os contratos de trabalho

Carla Reita Faria Leal

Há cerca de dois meses defendemos nesta coluna que os empregadores podem exigir de seus empregados que apresentem comprovante de que se vacinaram contra a COVID-19. O assunto estava sendo muito discutido no mundo jurídico e empresarial por conta de uma decisão do TRT de São Paulo que manteve a dispensa por justa causa de uma trabalhadora de um hospital que se recusou a receber a vacina, mesmo após ser orientada e advertida neste sentido.

Naquela ocasião, sustentamos que em pandemias, como a da COVID-19, a vacinação não é uma medida individual, mas faz parte de um esforço coletivo em acabar com a transmissão do vírus e com a propagação da doença, ou, pelo menos, minimizar a sua disseminação, inclusive diminuindo a possibilidade de mutações.

Pontuamos, à época, que a recusa injustificada do trabalhador em receber a vacina pode resultar em sua dispensa, inclusive por justa causa, dependendo da situação, como nos casos em que o trabalho exija contato com colegas, clientes e fornecedores, havendo a exposição do empregado e dos outros que possuem contato com ele ao contágio do coronavírus.

Da mesma forma lembramos que a recusa do empregador em se vacinar, se este convive com seus os empregados, expondo-os igualmente ao contágio, pode ensejar em rescisão indireta dos contratos de trabalho, isto é, a justa causa do empregador.

Pois bem, o tema voltou a ser manchete de jornais e objeto de debates jurídicos nas últimas duas semanas.

Por meio de portaria, a n.º 620/2021, assinada pelo Ministro Onyx Lorenzoni, do recentemente ressuscitado Ministério do Trabalho, foi proibida a dispensa por justa causa na hipótese de recusa da vacinação por parte do empregado, documento que também mencionou que não poderia exigida a comprovação de vacinação quando dos processos seletivos para a contratação de empregados, sob pena de ambas as práticas serem consideradas discriminatórias.

O texto da portaria ainda mencionou punições para os empregadores que dispensarem os empregados que se recusarem a se vacinar, que vão desde a obrigatoriedade de reintegração do trabalhador com o pagamento dos salários até o retorno do empregado ao posto de trabalho, ou o pagamento em dobro do salário no período de afastamento. Ressaltou-se, também, a possibilidade de o empregado buscar no Poder Judiciário indenização por danos morais.

O tema foi levado ao Supremo Tribunal Federal por sindicatos e partidos políticos por meio de várias Ações de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Os processos foram distribuídos para o Ministro Barroso, que proferiu liminar suspendendo vários trechos da portaria, em especial aqueles que tratavam da impossibilidade da dispensa do empregado no caso da recusa de vacinação e a exigência de comprovante de vacinação na contratação, dado a sua inconstitucionalidade.

O ministro do STF entendeu, posição com a qual concordamos, que portaria é ato infralegal, i.e., que não pode contrariar a Constituição Federal e a CLT, textos que, além concederem poder ao empregador para dirigir a prestação laboral do empregado, também asseguram ao trabalhador o direito a um meio ambiente do trabalho saudável.

Ressaltou o ministro Barroso que, ao mesmo tempo que é obrigação dos empregadores cumprirem e fazerem cumprir as normas de saúde, segurança e medicina do trabalho, é dever dos empregados observarem as determinações do empregador que tratem dessas matérias.

Desta forma, reconheceu que é possível exigir comprovante de vacinação quando da contratação e que é possível a dispensa do empregado resistente em receber a vacina, em alguns casos até por justa causa, desde de que observado o critério da proporcionalidade, ou seja, analisando-se caso a caso e sopesando os riscos da manutenção do vínculo de emprego.

Ressalvou, ainda, que o trabalhador não pode ser penalizado se a sua justificativa em não tomar a vacina for fundada contraindicação médica, com base no Plano Nacional de Vacinação contra a COVID-19, ou outro consenso científico.

Esperamos que esse assunto reste claro e que todos tomem consciência que apenas quando caminharmos para uma só direção, aquela que é apontada pela ciência, teremos chances de vencer os dias escuros que vivemos.

 

*Carla Reita Faria Leal é líder do Grupo de Pesquisa sobre meio ambiente do trabalho da UFMT, o GPMAT.

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