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Não há mais direitos no Direito Ambiental

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Não há mais direitos no Direito Ambiental
(Foto: Ekaterina Bolovtsova / Pexels)

Chegou o tempo de abandonar as meias palavras e lançar um sonoro J’accuse: não existem mais direitos do réu no Direito Ambiental.

O verniz da teoria ainda manda que partamos do pressuposto de que toda ação estatal, contra qualquer pessoa e por qualquer motivo, será – ou deveria ser – regida pela legalidade, devido processo legal, ampla defesa, contraditório, presunção de inocência, dignidade da pessoa humana, irretroatividade legal in pejus, respeito ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, respeito ao direito de propriedade, individualização da pena, taxatividade da lei penal, proporcionalidade das sanções, enfim, a aplicação dos direitos e garantias constitucionais.

Na prática, no entanto, em se tratando de Direito Ambiental, estes direitos e garantias são constantemente “mitigados”, quando não sumamente ignorados: basta mera leitura de apenas uma trinca de processos administrativos, cíveis e criminais para constatação – será difícil (um eufemismo) encontrar algum em que todos os direitos e garantias previstos Constituição estejam integralmente presentes sem “entretantos”, “contudos” e “todavias” a esvaziá-los (a prescindir quando não é o próprio texto legal a contrariá-los, como tem se acentuado nos últimos anos).

Enquanto até o mais hediondo dos criminosos tem seus direitos e garantias fundamentais assegurados pela lei (também na sua aplicação), aquele meramente acusado pela prática de ilícito ambiental não pode se vangloriar do mesmo privilégio, pois se torna um “inimigo da humanidade”, como definiu um ex-procurador geral de justiça há cerca de dois anos.

É claro que o afastamento dos direitos do acusado em matéria ambiental (seja pelo texto infraconstitucional, seja pelos “entendimentos”) jamais será reconhecido como tal pelos algozes de tais direitos, pois em suas teses haverá sempre uma justificativa em pomposo juridiquês oblíquo para dizer que “não” na verdade é “sim” e que “não pode, mas pode nesse caso”.

Como esquecer da ministra que afirmou “não se pode permitir a volta de censura sob qualquer argumento no Brasil” para, ato contínuo, anuir com a tese com um “[mas] este é um caso específico […] vejo isso como uma situação excepcionalíssima”?

Ainda que burocratas e acadêmicos se neguem a reconhecer o afastamento de direitos na apreciação de pretensas condutas lesivas ao meio ambiente, ao fim dirão que não estão negando aplicabilidade a estes direitos mesmo que o estejam através das constantes “situações excepcionalíssimas” (cada vez mais largas).

A lista de exemplos é pantagruélica, e não há como indicar ínfima parte sem recorrer ao famigerado juridiquês: inversão do ônus probatório; imprescritibilidade; punição de condutas criminalmente atípicas imposição e manutenção indevida de embargos administrativos; morosidade nos processos de licenciamento; desconsideração de licença ambiental válida; responsabilização propter rem retroativa e ultrativa por indenizações; responsabilização penal da pessoa jurídica; dano moral difuso coletivo; cerceamento de defesa; pressuposto de veracidade de laudos elaborados pelo acusador; presunção de culpabilidade; confisco, asfixia financeira e expropriação; afastamento de excludentes de responsabilidade; aplicação de sedizentes “princípios” forjados com força de lei suprema: “in dubio pro natura”, “vedação ao retrocesso ambiental”, “risco integral”, “precaução”; e a lista não pára.

Ao armagedon se soma o desconhecimento abissal das normas por parte de quem pratica a mitigação dos direitos, mesmo que o Brasil já tenha uma das mais, se não a mais, restritiva (e draconiana) legislação ambiental no mundo.

Pululam casos em que a acusação é a prova da culpa, tornando a defesa mera formalidade. A passos largos em nome da “defesa do meio ambiente” tudo é tolerado, menos a aplicação de direitos que possam “beneficiar” o inimigo da humanidade.

Fernando Leitão é advogado atuante no Direito Ambiental e professor. 

fernando@leitao.adv.br

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