Principal

MPE entra na Justiça para reverter redução da reserva Guariba-Roosevelt

7 minutos de leitura
MPE entra na Justiça para reverter redução da reserva Guariba-Roosevelt

Laercio Miranda

Guariba Roosevelt

 

O Ministério Público Estadual (MPE) entrou com ação civil pública na terça-feira, 9, para reverter a redução da reserva extrativista Guariba-Roosevelt, no Noroeste de Mato Grosso. Por meio de decreto legislativo, no dia 21 de dezembro de 2016, a Assembleia Legislativa alterou a área de de 164 mil hectares da unidade de conservação para 57 mil hectares, resultando em uma perda de cerca de 107 mil hectares de área protegida.

O decreto legislativo é o mesmo instrumento utilizado pelos deputados estaduais com relação ao Parque Estadual da Serra de Ricardo Franco, em Vila Bela da Santíssima Trindade, na região Oeste do estado: é assinado por lideranças partidárias, sem autoria definida, e não necessita passar por uma sanção do governador para entrar em vigor.

“O decreto configura um retrocesso ambiental, na medida em que diminui em mais de 70% uma unidade de proteção”

Os promotores Ana Luiza Ávila Peterlini, Joelson de Campos Maciel e Gerson Barbosa, que assinam a ação relacionada à reserva Guariba-Roosevelt, argumentam que não é possível reduzir uma área de conservação por meio de decreto legislativo.

Segundo eles, a Constituição Federal e a estadual determinam que, para isso, é preciso haver estudos técnicos, consulta pública e lei específica. Segundo o MPE, só caberia o uso de decreto se a intenção fosse ampliar a reserva, e desde que se mantivesse toda a área incluída nos limites originais.

A unidade de conservação foi criada em junho de 1996, no governo Dante de Oliveira, e ampliada em abril de 2015 pelo decreto nº 59/2015, baixado pelo governador Pedro Taques (PSDB). Ao contrário do decreto que reduziu a unidade, o decreto que ampliou a área de conservação foi embasado por estudos técnicos da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema).

Na ação, o MPE pede que a Justiça conceda liminar suspendendo os efeitos do decreto legislativo que reduziu a reserva extrativista, além da titulação dos processos de regularização e legitimação de posse da área pública da reserva. Pede ainda que a Justiça obrigue o Estado a demarcar a reserva, no prazo de seis meses, com base nos limites previstos no decreto nº 59/2015, que havia aumentado a reserva. 

Fraude legislativa
O MPE ainda tachou de “fraude legislativa” a comissão criada na Assembleia para subsidiar a redução da reserva. Os promotores afirmam que os parlamentares ignoraram a conclusão da câmara setorial temática, que foi contrária a reduzir a área de conversação, e votaram o decreto legislativo que reduziu o tamanho da unidade.

A câmara setorial temática realizou 16 reuniões e teve participação da Secretaria de Meio Ambiente do Estado (Sema), Casa Civil, Secretaria de Planejamento (Seplan), Instituto de Terras de Mato Grosso (Intermat) e a empresa DNA Rural. Os relatos são de que a câmara entendeu, com base em dados do Intermat, que as ocupações na reserva eram de grandes propriedades, acima de 1000 hectares, e que não havia um número significativo de pequenas propriedades que pudesse justificar a redução dos limites.

A ação relata que, na 14ª reunião, “após calorosos debates, foi colocada em votação a conclusão final dos trabalhos da Câmara Setorial Temática que acatou, por maioria, o Relatório Técnico Reserva Estadual Extrativista Guariba Roosevelt (fls.312/25), elaborado pela SEMA, por intermédio dos analistas de meio ambiente, Alexandre Batistella (Coordenador de Unidades de Conservação – SEMA-MT) e Eliani Fachim (Superintendente de Mudanças Climáticas e Biodiversidade – SEMA-MT)”.

“Entretanto, a Assembleia Legislativa, em uma verdadeira manobra, apresentou, na audiência pública ocorrida para apresentação dos trabalhos da Câmara, uma conclusão diversa daquela deliberada pelos membros sustentando, como resultado da Câmara, a necessidade de alterações dos limites e redução da RESEX”, afirmam os promotores.

O MPE chegou a essa conclusão por meio de depoimentos de testemunhas, pois solicitaram os arquivos das reuniões à Assembleia Legislativa e, segundo eles, houve recusa em fornecer o material, sob alegação de que a câmara não havia concluído seus trabalhos. Ao confrontar os depoimentos, os promotores concluíram que os deputados usaram uma “falsa conclusão dos trabalhos da câmara setorial temática”.

Segundo o MPE, isso “demonstra, claramente, que a preocupação daquela Casa de Leis se restringe ao impacto que a ampliação da RESEX supostamente causou diante de alguns particulares e posseiros que possuem processos de regularização de ocupação em trâmite junto ao Intermat, não havendo, de fato, qualquer preocupação com o meio ambiente e/ou com a população tradicional que vive naquela e daquela área”.

Os promotores ainda destacam a agilidade com que o texto foi aprovado. “Importante, reforçar, também, que o decreto legislativo n° 51/2016 tramitou como um ‘foguete’ dentro da Assembleia Legislativa, no famoso mês de dezembro, onde tudo acontece, sendo apresentado pelas ‘lideranças partidárias’ no dia 20/12/2016, em 1ª votação e sendo aprovado em 2ª votação no dia seguinte, 21/12/2016, tendo como justificativa, a falsa conclusão da Câmara Setorial Temática.”

Arte/O Livre

Guariba Roosevelt

 

Retrocesso ambiental

Além de denunciar a manobra legislativa, o MPE argumenta que reduzir a reserva fere o princípio constitucional do não retrocesso ambiental. “De plano, percebe-se, claramente, que o decreto legislativo configura um verdadeiro retrocesso ambiental, na medida em que diminui em mais de 70% uma Unidade de Proteção, reduzindo a proteção a áreas ecologicamente relevantes e ainda, coloca diretamente em risco a existência da única população extrativista do estado de Mato Grosso.”

O órgão sustenta que Guariba-Roosevelt é a única reserva extrativista de Mato Grosso e, também, uma das últimas áreas de extrativismo tradicional no estado, com uma comunidade residente que coleta castanha, óleo de copaíba e borracha. “No seu interior vive, também, a última população tradicional de seringueiros extrativistas protegida legalmente no Estado, totalizando cerca de 300 pessoas, que vivem às margens dos Rios Guariba e Roosevelt, conforme levantamento realizado em 2010.”

A ação cita, ainda, relatório técnico da Sema que afirma que “qualquer alteração nos limites atuais irá causar danos irreparáveis a biodiversidade local e no modo de vida dos extrativistas.”

Outro lado

A reportagem procurou a assessoria da Assembleia Legislativa, e aguarda resposta com o posicionamento sobre a questão.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros




Como você se sentiu com essa matéria?
Indignado
0
Indignado
Indiferente
0
Indiferente
Feliz
0
Feliz
Surpreso
0
Surpreso
Triste
0
Triste
Inspirado
0
Inspirado

Principais Manchetes