Ednilson Aguiar/O Livre
Quando seu marido faleceu, vítima de um ataque cardíaco, 40 dias antes do nascimento de sua terceira filha, Rithielly da Silva não imaginava que a dor do luto seria só mais um dos tantos problemas que enfrentaria. Com um divórcio anterior não oficializado, ela não pode deixar a maternidade já com a certidão de nascimento de Maria Sofia.
A primeira decisão a ser tomada foi não registrar a menina sem que no documento constasse o nome do pai, Gilmar Costa dos Santos. O custo foi ter que encarar manifestações de reprovação e julgamento em outro momento delicado: a realização de exames clínicos para descobrir se a filha tinha herdado a condição de saúde do pai.
“Não ter a certidão é horrível. Não dá para fazer nada. A primeira coisa que o médico perguntar é se tem certidão. Você responde que não e a pessoa reage: ‘Como assim?’. Parece que você é desleixada”, relata.
Mas Rithielly teve sorte. Se tivesse nascido em uma das 15 cidades mato-grossenses onde, por falta de dinheiro, a partir desta sexta-feira (1º), não existe mais uma unidade da Defensoria Pública de Mato Grosso, Maria Sofia poderia ainda não ter um nome oficialmente.
A espera foi de dois meses, mas Rithielly não gastou nada. Só o transporte, do bairro São Mateus, em Várzea Grande, onde mora, até o edifício Maruanã, na Avenida do CPA, em Cuiabá, onde funciona a Coordenadoria de Mediação e Conciliação da Defensoria Pública do Estado.
É lá que trabalha a “terceira avó” que Maria Sofia conheceu ainda na maternidade, a defensora pública Elianeth Glaucia de Oliveira Nazário, idealizadora do projeto “Defensoria no Berçário”.
Se tivesse que pagar um advogado para realizar todo o trâmite, Rithielly não teria condições de dar à filha o nome do pai. O bônus foi recuperar seu nome de solteira, depois de mais um ano de tentativas frustradas.
“Eu nem estava mais atrás do divórcio em si, mas fui contando a história à doutora Elianeth e ela disse que dava para resolver tudo de uma vez”, um alívio, ela relata.
Ednilson Aguiar/O Livre
O projeto
De acordo com dados da Coordenadoria de Mediação e Conciliação da Defensoria Pública, o caso de Rithielly é só um dos 47 atendidos – de fevereiro a julho deste ano – pelo projeto “Defensoria no Berçário”.
O público alvo é composto por mães adolescentes. Um problema de saúde pública já conhecido, mas juridicamente ignorado, diz a defensora Elianeth Glaucia de Oliveira Nazário.
Todas as terças-feiras, das 8h às 12h, o atendimento é feito pela própria defensora e por mais dois assistentes no saguão do hospital e maternidade Santa Helena, em Cuiabá. O foco é solucionar problemas de reconhecimento de paternidade, pagamentos de pensão e, em muitas ocasiões, de guarda das próprias mães adolescentes.
Segundo a defensora, boa parte delas chega acompanhada por parentes, mas sem a companhia de um responsável legal – muitas já não moram com os pais – e, por isso, não podem receber alta hospitalar quando o atendimento médico é concluído.
Em alguns casos, segundo Elianeth, o trabalho precisa ser em parceria com defensores de outros municípios. Isso porque parte das pacientes chega à maternidade, em Cuiabá, vindas de cidades da região metropolitana, como Dom Aquino e Santo Antônio do Leverger, que estão na lista dos municípios onde a Defensoria Pública não existe mais.
Ednilson Aguiar/O Livre
Orçamento
O fechamento das unidades foi justificado pelo defensor público-geral, Sílvio Santana, com a falta de recursos para manter defensores e assessores jurídicos trabalhando. A instituição alega precisar de mais R$ 7 milhões para manter as atividades até o final do ano. O governo do Estado, que faz o repasse, diz não ter condições de dar o socorro.
O problema estaria em um congelamento do orçamento que, de 2016 para 2017, teve um incremento de pouco menos de R$ 10 milhões. Segundo o defensor-geral, o montante destinado exclusivamente ao custeio das atividades – R$ 30 milhões – não teve qualquer reajuste de um ano para outro.
De acordo com dados das últimas cinco leis orçamentárias anuais, o orçamento da Defensoria Pública do Estado cresceu cerca de 45,5% de 2013 a 2017. Enquanto isso, o orçamento do Poder Judiciário teve um incremento de 58,4% no mesmo período.
Adriano Carvalho / O Livre