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As vacinas contra a COVID-19 e os seus impactos na relação de emprego

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As vacinas contra a COVID-19 e os seus impactos na relação de emprego
(Foto: Christiano Antonucci/Gcom-MT)

*Carla Reita Faria Leal
Evandro Benevides
Leonardo Prado

É de conhecimento de todos que o programa de vacinação contra a COVID-19 se iniciou pelo mundo a fora, inclusive no Brasil, muito embora a passos lentos. Mesmo assim, os seus reflexos já começaram a ser sentidos, até mesmo nas relações de trabalho.

Algumas dúvidas plausíveis foram suscitadas. Poderia o empregador exigir do empregado a vacinação? Quais as consequências da recusa de ser vacinado por parte do empregado? E se a recusa for por convicções políticas, religiosas ou filosóficas, poderia o empregado ser penalizado a dispensa por justa causa?

A discussão possui dois lados que devem ser levados em consideração.

De um lado, temos trabalhadores que, por questões políticas, religiosas ou filosóficas, anunciam que se recusarão a tomar a vacina. Sobre isso alguns especialistas da área afirmam que neste caso a dispensa por justa causa, ou qualquer punição, é inadmissível, pois configuraria ato discriminatório, o que é vedado pelo nosso ordenamento jurídico, acrescentando, ainda, que não se enquadraria em nenhuma das hipóteses do artigo 482 da CLT, que trata das justas causas do empregado.

De outro lado, outros especialistas entendem que a vacina carrega consigo um caráter de proteção coletiva e, por isso, sobrepõe-se aos interesses particulares de cada trabalhador, já que um trabalhador no meio ambiente do trabalho sem imunização contra a COVID-19 poderia colocar os outros colegas de trabalho em risco, além dos clientes, se este tiver contato com o público, sendo possível a aplicação da dispensa por justa causa.

Ademais, apontam como fundamento a recente posição do Supremo Tribunal Federal, adotada no final de 2020 no julgamento de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade e em um Recurso Extraordinário com Agravo (ADIs 6.586 e 6.587 e ARE 1.267.897), quando os ministros entenderam pela legalidade do Estado impor sanções aos que se recusarem a tomar a vacina sem justificativa plausível, sendo possível também a adoção de medidas restritivas ao exercício de certas atividades e de direitos.

Entendemos que essa posição é aplicável também aos contratos de trabalho. Isso porque, ao mesmo tempo em que a Constituição Federal prevê a liberdade de consciência e de crença ou de culto religioso, de convicção política ou filosófica, além de proteger a intimidade e a vida privada, também assegura o meio ambiente saudável, o que inclui o meio ambiente do trabalho, sendo dever do empregador efetivar medidas que garantam um ambiente laboral hígido, reduzindo riscos à saúde de seus empregados.

Logo, entendemos que o empregador pode solicitar do empregado a comprovação da vacinação, condicionando a sua entrada nas dependências da empresa ao cumprimento dessa exigência, o que decorre do seu poder diretivo.

Nesse sentido, a recusa injustificada pode gerar a dispensa por justa causa, porém, não de forma automática, uma vez que é dever do empregador levar as informações sobre a necessidade da vacinação como medida de prevenção de doenças no ambiente de trabalho, entendimento esse que vai ao encontro do guia de orientações recentemente divulgado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

Assim, deve ser dada a oportunidade de o empregado justificar a impossibilidade de se vacinar, como nos casos de possuir algum tipo de intolerância ou de alergia aos componentes da vacina, o que deve ser comprovado mediante atestado médico recente. Por outro lado, diante da manutenção da recusa injustificada, cabe ao empregador, de início, aplicar sanções menos gravosas de modo a compelir o empregado a respeitar a determinação da empresa. Por fim, mantendo o trabalhador sua posição, não restaria outra alternativa que não a sua dispensa por justa causa.

Ressalta-se, ainda, que o dever de submeter às regras de saúde e de segurança do trabalho também se aplica ao empregador, o qual possui o dever de adotar todas as medidas de prevenção necessárias, em especial durante a pandemia. Não havendo a implementação dessas medidas, pode o empregado se recusar a trabalhar até que estas sejam efetivadas, fato que não configurará falta grave do trabalhador e não poderá resultar em aplicação de penalidades. Na verdade, nessa hipótese, a falta estará sendo cometida pelo empregador, podendo o empregado considerar rescindido o contrato e pleitear a sua indenização, ou seja, configuraria a justa causa do empregador.

Assim, é necessário estarmos atentos às repercussões que a vacinação pode causar sobre a coletividade, entendendo sempre que a vacina é dever e direito coletivo, e tão somente busca proteger o nosso direito mais importante: o direito à vida.

*Carla Reita Faria Leal, Evandro Benevides e Leonardo Prado são membros do Grupo de pesquisa sobre Meio Ambiente do Trabalho da UFMT, o GPMAT.

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