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Agir certo no enredo errado

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Agir certo no enredo errado
Duermete niño. (Colagem digital, destacando a obra de Yermollay Caripoune . Autoria própria)

Encarar um cozidão, bater um escaldado ou a lasanha da mama, sem dispensar a torta holandesa de sobremesa! O último bocado coincide sempre com o peso nas pálpebras, aquela moleza repentina. E se estiver calor, então? Sabe perfeitamente do que eu falo quem mora em Cuiabá ou em Teresina, cidades que disputam o título de capital mais quente do Brasil.

Nesse caso, se puder, durma! Seja na cama ou no sofá. Melhor ainda se for numa rede, daquelas bem bonitas, como as da Baixada Cuiabana, que incorporam a trama sobreposta do Povo Guaná, entre seus adornos e franjas.  Os especialistas dizem que 30 minutos são suficientes para rebater a Letargia Pós-Prandial – designação científica do soninho depois da comida. Dormir, enquanto se faz a digestão, beneficia o cérebro, melhora a capacidade de resolver problemas e estimula a criatividade, imaginação e intuição.

Ninguém sabe de onde veio o costume de dormir a sesta. O mais provável é que seja próprio do organismo humano, porém esse costume natural foi se perdendo com as exigências do trabalho e da vida nas grandes cidades. Antigamente, os romanos dividiam o dia em 2 períodos de 12 horas cada e, na sexta hora, descansavam: ou seja, a uma hora da tarde. Daí vem o nome sesta. Países como Espanha, Grécia e outros, em que o calor pode ser muito forte no início da tarde, como China, Vietnã e Bangladesh, mantêm o costume bem vivo até os dias atuais.

O ritual de dormir durante o dia dos países quentes – seja no sul da Europa ou nas regiões tropicais – já foi motivo de ridicularização. Fomos interpretados como preguiçosos ou pouco afeitos ao trabalho, pelo prisma de quem nasceu e viveu em países tradicionalmente frios. Mas, as últimas ondas de calor no mundo estão aproximando países do norte rico ao entendimento sobre o que é viver imerso em uma atmosfera sufocante; ao ponto da Associação Federal de Médicos dos Departamentos de Saúde Pública da Alemanha recomendar a adoção oficial da sesta em todo o país.

Nas palavras do presidente da Associação, Dr. Johannes Niessen, “as pessoas não são tão eficientes em calor forte, quanto em outros lugares” e que deve ser garantido ventiladores suficientes e o uso de roupas mais leves, mesmo contra as regras de vestuário para um escritório. Porém, para a adaptação à crise climática, outros hábitos também devem ser implantados e países europeus já discutem a adoção do horário de trabalho entre às seis da manhã e duas da tarde, para as profissões que se desenvolvem ao ar livre como a construção civil, por exemplo.

Conhecer e admirar os costumes do Sul, das populações equatoriais e latinas, é um passo em direção ao respeito mútuo entre os povos e suas tradições. Dormir a sesta, talvez seja uma necessidade geral de agora em diante. O único senão de toda a história é que o enredo está errado. O mundo não precisava acabar em chamas para que toda a gente pudesse cochilar tranquilamente, numa linda rede várzea-grandense bordada e adornada com motivos tropicais.

***Andréa Ferraz Fernandez é jornalista. Tem doutorado na área da Ergonomia da Informação e pós-doutorado em Comunicação Audiovisual, pela Universidade de Málaga, Espanha. É docente da Universidade Federal de Mato Grosso, UFMT, lecionando nos Programa de Pós Graduação em Estudos da Cultura Contemporânea (ECCO), no Programa de Pós Graduação em Comunicação e Poder (PPGCOM) e no Curso de graduação de Cinema e Audiovisual.

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