A Polícia Civil de Mato Grosso utiliza desde o ano passado um sistema para o rastreamento de pessoas via telefones celulares. O equipamento custou R$ 4,6 milhões e foi vendido pela empresa israelense Cognyte.
A companhia é especializada em programas e estratégias para o auxílio a governos em situação de crises de segurança pública. O portfólio da empresa apresenta ofertas de rede de inteligência em análise à estratégia de operação para situações em “tempo real”.
O serviço contratado pelo governo de Mato Grosso foi do equipamento GI2S. No edital de dispensa de licitação para a compra do aparelho, publicado em maio de 2022, não há especificações do modelo. A informação diz ser um sistema de antenas portáteis para a “localização precisa” de sinal. O modelo em uso em Mato Grosso tem três antenas.
Padrão de rastreamento
O cientista da computação Raoni Teixeira diz que as empresas fornecedoras dos serviços de rastreamento possuem tecnologias próprias de aprimoramento, mas elas seguem um padrão.
Segundo ele, o rastreamento pode ser feito por diversos canais: torre de sinais de celular, registro de IP, o endereço na internet que possibilita a localização de um acesso em rede local ou celular, e pela conexão de wi-fi.
“Se você prestar atenção na conexão do celular pelas torres, você verá que, geralmente, eles estão conectados a três torres. Quanto mais próximo você estiver de uma torre, mais forte será o inicial, e o inverso também vale. Essa conexão permite se fazer uma triangulação de determinado sinal de celular”, explica.
A triangulação seria o modelo amplo de identificação e não depende de conexão à internet. Os serviços de rastreamento podem cruzar esses dados com os outros dois tipos de conexão, vinculados à internet.
“Neste caso, se passa a ter maior precisão da localização de determinado sinal. Mas empresas tem sempre um serviço a mais de aumento da precisão desses cruzamentos. Mas, aí, a gente nunca sabe o que acontece porque é uma situação interna”, comenta.
O cientista explica que esse padrão de rastreamento faz parte do cotidiano. Um app de instituições financeiras o utiliza para tentar evitar golpes. É o mecanismo pelo qual as instituições conseguem identificar movimentações suspeitas.
“Por exemplo, um aplicativo de um banco pode utilizar a localização estimada com esses métodos alternativos. Mesmo que alguém altere o sinal do GPS, as Torres e os sinais de wi-fi funcionam como contraprova”, afirma.
Limite de ação
O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Eduardo Botelho (União Brasil), disse que a tecnologia comprada pelo governo não grava as ligações entre aparelhos. Ela se limitaria a localizar os sinais. O objetivo seria usá-la no combate ao crime.
Segundo ele, o sistema ajudaria por exemplo a localizar pessoas suspeitas investigadas foragidas da polícia.
“Pelo que tenho conhecimento, esse aparelho não intercepta ligação, não grava, simplesmente faz a localização. Aí, eu faço uma pergunta: vocês querem que se localize rapidamente um bandido ou não? Se quiser, é esse aparelho. Você acha que seriam pegas essas pessoas dos assassinatos em Sinop rapidamente? O cara que matou o assessor do deputado Wilson Santos seria localizado rapidamente? Aquele cara que matou a mulher dele, covardemente, na frente da filha, no Pedra 90, seria localizado rapidamente sem o aparelho? Não seria”, afirmou.
A divulgação da informação sobre o sistema usado em Mato Grosso ocorreu dias após a descoberta de um sistema semelhante usado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
O modelo chamado FirstMile, também fornecido por uma empresa israelense, permitia o rastreamento de até 10 mil pessoas a cada 12 meses. Conforme a imprensa nacional, o sistema foi comprado no governo de Michel Temer e utilizado entre 2018 e 2021.
A Abin teria monitorado as pessoas sem um protocolo oficial das atividades. A Polícia Federal abriu um inquérito na semana passada para investigar o caso.