Alguns jornalistas brasileiros e acadêmicos de universidades federais têm debochado do que chamam de comunismo imaginário dos militantes de direita que, muitas vezes, aplicam o rótulo de comunistas para práticas sociais que nem sempre podem categorizadas como tal. Nos últimos dias, o bom e influente comentarista político da Rádio Centro América de Cuiabá, Alfredo da Mota Menezes, abordou o assunto.

Segundo Menezes, o comunismo pressupõe o fim da propriedade privada, coisa que não aconteceu nem na União Soviética. No comunismo, “os homens pescariam de manhã, trabalhariam a tarde e fariam poesia a noite”, disse o comentarista, referindo-se ao Manifesto Comunista, um panfleto político de valor histórico.

Para refutar o argumento de que os militantes de direita falam de um comunismo imaginário, utilizarei a ideia expressa por dois sociólogos americanos que formularam o que ficou conhecido como teorema de Thomas. Ele diz: “Se as pessoas definem certas situações como reais, elas são reais em suas consequências”. Ou seja, se partidos comunistas enxergam a abolição da propriedade privada como uma meta política a ser alcançada, ela terá consequências reais.

Nas sociedades contemporâneas, os seres humanos são avaliados enquanto detentores de ocupações. É o emprego que define a posição social dos indivíduos. Nem todos poderão ser funcionários públicos nem viver da assistência social. Sabemos que a expectativa de vidas das pequenas empresas, as que mais empregam, é baixa. Vamos compará-las aos partidos comunistas, forças políticas que defendem a abolição da propriedade privada, e que, portanto, inviabilizam muitas das atividades econômicas que hoje geram a maioria dos empregos. O partido comunista cubano tem 700.000 membros, o partido comunista chinês tem 91.914.000 membros, ambos têm mais de 100 anos. O partido comunista brasileiro também tem mais de 100 anos, e sua dissidência o PC do B é tão influente nas universidades com sua militância estudantil, que tem hoje a ministra da ciência, tecnologia e inovação. A ação desses partidos tem consequências para suas sociedades. Quais empresas capitalistas têm mais de 100 anos? Pouquíssimas.

Todos os países conhecidos como comunistas, capitalistas e socialistas no século XX estavam muito distantes do que foi formulado por seus idealizadores. Os países socialistas variam de acordo com sua tolerância à propriedade privada. A Grã-Bretanha tem características tanto de uma economia socialista quanto de uma economia capitalista. O atendimento aos passageiros de linhas aéreas é monopolizado pela empresa governamental British Airways. Na verdade, as economias das nações modernas industriais têm características tanto do capitalismo quanto do socialismo, seja nos EUA, no Japão ou na União Europeia.

A explicação da desigualdade em termos da propriedade privada permanece politicamente atraente e, por isso, continua a ser adotada e festejada nos meios políticos e, principalmente, na academia. Uma sociedade sem propriedade privada é concebível e, se a ideia da igualdade está associada com esta noção, a abolição da propriedade privada pode se tornar o objetivo supremo da ação política. A demonização do agronegócio e do capitalismo por certas forças políticas tem também inspiração nisso.

Como bem disse Alfredo da Mota Menezes, a propriedade privada foi reduzida a uma insignificância virtual na União Soviética, na Iugoslávia e em Israel, mas não foi totalmente abolida, por isso, existia desigualdade social lá.

Se a desigualdade fosse realmente baseada na propriedade privada, a abolição da propriedade privada resultaria na eliminação da desigualdade. Como diz Ralf Dahrendorf, a experiência de sociedades sem propriedades ou quase sem propriedades não confirma esta suposição.

Os partidos comunistas, no entanto, continuam a defender politicamente uma sociedade sem propriedade privada ou com muitas restrições. E grande parte da esquerda brasileira também têm inspiração nessa máxima. O teorema de Thomas diz-nos que, se parte da esquerda define isso como real, então terá consequências sociais e econômicas. O medo do comunismo dos militantes de direita não parece ser imaginário.

André Luís Ribeiro e Lacerda – Biossociólogo, psicólogo e professor de sociologia na UFMT, campus Cuiabá-MT.

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