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Os Pacificadores

A tarefa de pacificar um país cujas eleições apresentaram um quadro de divisão clara das forças políticas não é fácil

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Os Pacificadores
(Foto: Reprodução / Portal Contexto)

Ainda no dia 30/10/2022, logo após a confirmação da sua vitória como presidente eleito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Lula fez um pronunciamento no qual disse que não havia “dois Brasis” e que era hora de pacificar o país. Uma semana depois de ter sido empossado, a Esplanada dos Ministérios foi depredada por um movimento que tem entre suas reclamações a revisão do resultado das eleições. O movimento tem mais de 60 dias, o que foi feito para desestimulá-lo? A tarefa de pacificar pressupõe dissolver o movimento ou confrontá-lo à força?

O período de transição entre o governo que perdeu as eleições e o governo vencedor durou praticamente dois meses. Nesse período, diversas ações foram anunciadas e o novo governo se posicionou em relação a muitas coisas. O ex-ministro da defesa Aldo Rebelo chegou a dizer que não via o Presidente Lula agindo no sentido de pacificar o país e que, por isso, não estava muito otimista em relação a isso. Deu como exemplo o Governo JK que enfrentou rebeliões e não puniu os participantes. Ou seja, pacificar significa conversar e fazer concessões e não apenas confrontar.

Após a eleição, o presidente Lula continuou a estabelecer confrontos. Vamos explorar um pouco mais o argumento de Aldo Rebelo. O ministro da Justiça nomeado por Lula, Dr. Flávio Dino, falou muito durante os dois meses que antecederam a posse. E sua fala foi sempre no sentido de que puniria todos os envolvidos nos movimentos que estavam posicionados na frente dos quarteis do Exército do Brasil. Ou seja, pronunciamentos incongruentes com o objetivo de quem pretende pacificar.

Além de Flávio Dino, que não tem demonstrado muitas habilidades no sentido da pacificação, aliás muito pelo contrário, o presidente Lula nomeou para o gabinete Civil o senador eleito e ex-governador da Bahia Rui Costa. Um político que tem um perfil de confronto. Quando era governador, se negou a receber o então presidente Jair Bolsonaro em viagem ao estado da Bahia e a desempenhar minimamente papel institucional a ele reservado.

Para a Secretaria de Comunicação, o presidente Lula nomeou o ex-deputado do PT Paulo Pimenta. Outro político famoso não apenas por polemizar, mas por comprar brigas com adversários políticos. Pimenta costuma dizer que o episódio da facada no, então, candidato Jair Bolsonaro, em 2018, foi forjado. Um posicionamento que o inabilitaria para o cargo de secretário de Comunicação do governo.

Três membros da equipe de frente do presidente Lula que, ao que tudo indica, não estão ajudando na sua tarefa de pacificar o país. Mas, o próprio presidente tem desviado de sua promessa de campanha. Ontem no discurso que fez sobre a depredação que ocorreu na esplanada dos ministérios prometeu punir custe o que custar e responsabilizou todos aqueles atores sociais que seu partido tem tendência de avaliar a partir de estereótipos: madeireiros, garimpeiros e o agronegócio. Ele também culpou o ex-presidente Jair Bolsonaro. Colocou gasolina no fogo que ele diz querer apagar.

A tarefa de pacificar um país cujas eleições apresentaram um quadro de divisão clara das forças políticas não é fácil. O fato de o país estar dividido não é necessariamente ruim. A democracia pressupõe forças políticas contrárias, pressupõe conflito, mas tudo controlado pelo império da lei. E é aí que as coisas têm se complicado. A ação do poder judiciário tem punido todos aqueles que ousam questionar o resultado das eleições e criticar ministros do Supremo Tribunal Federal. A situação social parece hostil a tentativas de pacificação.

Movimentos sociais como o dos bolsonaristas que estão na frente dos quartéis não surgem do nada. Eles se desenvolvem sempre que condições sociais se mostrem favoráveis e habilitem indivíduos prontos e dispostos a promovê-los. E quais condições sociais seriam favoráveis ao desenvolvimento e disseminação de movimentos sociais? Uma delas é o descontentamento social.

O descontentamento social é uma insatisfação de algum grupo que é disseminada em relação à sociedade em geral. Uma de suas raízes é a percepção de injustiça social. Os bolsonaristas acham que a eleição teve problemas e que a atuação de membros do Supremo Tribunal Federal são questionáveis, na medida que tem punido e perseguido seus membros. Alguns produtores rurais de Mato Grosso têm tido suas contas bloqueadas e seus advogados não têm tido acesso ao devido processo legal.

Para pacificar o país, o presidente Lula deve fazer concessões aos seus adversários. Dizer que vai forçá-los a aceitar o resultado das eleições e anunciar a cada dia medidas que representam ameaças aos interesses políticos de seus adversários não desestimulam os movimentos sociais de confronto. Dizer que vai revogar isso e aquilo só estimula a resistência.

O presidente Lula, em 2006, solicitou perdão a Bruno Maranhão pela invasão e depredação da câmara dos deputados. Ele tem que lembrar que venceu as eleições por uma margem muita pequena de votos e que, portanto, seu objetivo de pacificar é vital para que ele possa colocar em marcha a sua agenda política.

André Lacerda é sociobiologo, psicólogo e professor de sociologia da UFMT.

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