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Mais votos não é sinônimo de vitória: entenda (ou não) o complicado sistema eleitoral brasileiro

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Mais votos não é sinônimo de vitória: entenda (ou não) o complicado sistema eleitoral brasileiro

Massificar seu nome na sociedade e mostrar trabalho para convencer o eleitor e conquistar seu voto não são as únicas preocupações de um candidato a uma vaga de vereador ou deputado no Brasil. Escolher bem o partido ao qual vai se filiar é fundamental no complicado sistema político brasileiro.

Pelas regras atuais, um parlamentar é eleito no sistema proporcional com lista aberta. Traduzindo: o partido apresenta uma lista de candidatos e, de acordo com o número de votos de cada um, a lista é ordenada do mais votado até o que recebeu menos ou nenhum voto.

Dessa lista, acabam eleitos aqueles que conquistaram mais eleitores. Mas não só eles. E isso é possível graças ao chamado quociente eleitoral.

O quociente eleitoral é o que define a quantidade de vagas que cada partido vai ter no parlamento. Ele nasce da divisão do número de total de votos válidos da eleição (só não contam os nulos e os brancos) pela quantidade de cadeiras disponíveis.

Dessa forma, em uma disputa por 10 mandatos de vereador em que 100 eleitores votam, o quociente eleitoral é de 10 votos. Definido isso, é preciso saber a soma de votos de cada partido, ou seja, quantos eleitores seus candidatos, juntos, convenceram.

Se nessa mesma disputa – de 10 mandatos de vereador em que 100 eleitores votaram – o Partido X lançou 20 candidatos e eles somaram 45 votos, significa dizer que o Partido X ficará com 4 vagas no parlamento.

É que, a cada 10 votos do partido –  o quociente eleitoral -, um candidato é eleito. O escolhido é sempre o primeiro daquela lista ordenada, citada no início dessa reportagem.

E a sobra?

No exemplo acima – da eleição de 10 vereadores com a participação de 100 eleitores -, o Partido X não era o único na disputa. O Partido Y também concorreu e conquistou os 55 votos restantes. Com isso, elegeu 5 vereadores, considerando o quociente eleitoral.

Mas 4 vereadores do Partido X e 5 vereadores do Partido Y não completam o parlamento. Falta um para que as 10 vagas sejam preenchidas. Ele vai ser escolhido por meio de outra conta. É a chamada “eleição pela média”.

Nesses casos, uma nova divisão é feita. O número total de votos do Partido X (45) é dividido, mas dessa vez, pela quantidade de mandatos que ele já tem (4). Ao resultado é somado o número 1, que é a quantidade de vagas que “sobraram”.

O mesmo é feito no caso do Partido Y. Então, o partido que consegue o número maior, fica com aquele mandato.

Mais votados e derrotados

Pela regra brasileira, só participam da distribuição de vagas pela média os partidos que conseguirem atingir o número de votos do quociente eleitoral, neste exemplo citado, 10 votos.

É exatamente isso que faz com que candidatos que tiveram menos votos sejam eleitos no lugar daqueles que conquistaram mais eleitores.

Em Cuiabá, na eleição de 2016, os vereadores Ricardo Saad (PSDB), Marcelo Bussiki (PSB), Doutor Xavier (PTC), Paulo Araújo (PP), Justino Malheiros (PV), Delegado Marcos Veloso (PV), Sargento Joelson (PSC) e Orivaldo da Farmárcia (PRP) foram eleitos graças a isso.

Já candidatos como o médico e ex-vereador Maurélio Ribeiro (PSDB) acabaram prejudicados. Ele foi o oitavo mais votado, obteve 4.012 votos, mas não conseguiu se eleger.

Passado três anos do pleito, ele diz que conhecia as regras, sabia que isso poderia acontecer, mas reconhece que é difícil aceitar. Especialmente porque Maurélio não concorda com o sistema vigente no país.

“Os 4 mil votos que tive valem menos do que os 1,9 mil votos de que quem chegou lá. Isso é uma injustiça, não com o candidato, que conhece às regras. É uma injustiça com o eleitor, que não conhece bem o jogo do qual ele está participando”, disse.

Puxadores de voto

Enquanto alguns candidatos saem prejudicados desse sistema eleitoral, outros têm seus votos “aproveitados” por colegas que não conseguiram convencer tantos eleitores assim.

Isso ocorre porque, embora a quantidade de votos que fez seja importante para o candidato se posicionar bem na lista de seu partido, seus eleitores serão somados aos de todos os outros candidatos que disputaram pela mesma legenda.

O exemplo mais expressivo disso ocorreu em 2010, quando o deputado federal Tiririca (PL-SP), na disputa pelo seu primeiro mandato, conquistou 1,3 milhão de votos. Depois de processados todos os cálculos já descritos aqui, o palhaço que virou parlamentar foi responsável não pela sua eleição, mas pela de outros quatro candidatos.

Regra em mutação

Para entender essa fórmula o LIVRE procurou Nilson Fernando Gomes Bezerra, coordenador de registros e informações processuais do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso (TRE-MT).

Assessoria

Ele lembrou que, até a eleição de 2018, os partidos estavam autorizados a se unir em coligações. Isso era feito, justamente, para que legendas com pouca expressão entre o eleitorado conseguissem atingir o quociente eleitoral e, quem sabe eleger representantes.

Mas novas mudanças estão em debate no Congresso Nacional. Se uma dessas sugestões for aprovada e sancionada antes da eleição de 2020, no ano que vem, os eleitores poderão votar em dois vereadores.

Um deles seria pelo sistema proporcional – este explicado no início do texto. O outro, por um modelo chamado de voto distrital. Além disso, o voto distrital com lista fechada também é defendido por alguns políticos.

Nilson acredita, entretanto, que essas fórmulas diferentes podem favorecer candidatos com um maior poder aquisitivo. Eles poderiam, por exemplo, comprar os primeiros lugares das listas de seus partidos.

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