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Universitários não se sentem prontos para o mercado de trabalho

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Universitários não se sentem prontos para o mercado de trabalho
Foto: Marcello Casal jr/Agência Brasil

A polêmica sobre a lei que prevê o fim da exigência do Exame da OAB para atuar como advogado levantou, nas últimas semanas, uma discussão antiga no ensino superior: a faculdade por si só prepara um profissional?

Estudantes e recém-formados entrevistados pelo LIVRE relataram uma discrepância entre teoria e prática em seus diferentes cursos. Por isso, muitos se sentem inseguros para encarar o mercado de trabalho e optam por uma especialização.

Faculdades da área da saúde, como Medicina, no entanto, já trabalham com metodologia de ensino que prevê, na grade curricular, a vivência da profissão em unidades de saúde da instituição de ensino ou parceiras.

“Hoje a medicina segue o método bem diferente do restante, o PBL [Aprendizagem Baseada em Problemas]. Desde o começo eu me envolvi com a prática, sempre supervisionado. Temos um módulo chamado eletivo, que você obrigatoriamente acompanha o professor no hospital uma vez ao ano. No internato é mais ‘realidade’, você atua no hospital durante dois anos”, explica o estudante João Pedro, 22 anos.

O jovem, que está no 4º ano de graduação, explica, no entanto, que isso não garante segurança no mercado de trabalho. “Hoje tem muita faculdade médica, só em Cuiabá e Várzea Grande tem quatro e no interior mais algumas. Isso em Mato Grosso, um dos Estados que menos tem. Você vai no hospital universitário, você mal consegue ficar com professor de tanto aluno junto”.

Por isso, quase todos os médicos recém-formados logo partem para uma residência médica: “São mais dois anos teóricos com muito mais prática, focada em uma especialidade”, explica João.

Carlos Junior, 24 anos, recém-formado em Engenharia Civil pela UNIP (Foto: arquivo pessoal)

Estágio

Experiências que poderiam suprir essa carência de prática, como o estágio, no entanto, não são fáceis de encontrar. É o que conta Carlos Junior, 24 anos, recém-formado em Engenharia Civil pela Universidade Paulista (Unip), de Goiânia. Ele retornou para Mato Grosso, Estado natal, em busca de um emprego.

“Entrei na faculdade com várias expectativas, mas a área já estava em decline e foi bem difícil ter acesso ao mercado de trabalho. Os cinco anos de curso foram basicamente teóricos. No último ano eu consegui um estágio que durou dois meses porque a empresa fechou”, conta o jovem, que colou grau no último dia 5 de janeiro.

Ainda assim, esse breve período trabalhando na área já teve diferença significativa no olhar de Carlos sob a profissão: “O estágio é a aplicação daquilo que gente aprende em sala de aula. É um divisor para você saber qual caminho você vai seguir. Foi uma experiência essencial para saber se realmente era isso que eu queria”.

Agora, com o diploma na mão, ele acredita que a dificuldade do primeiro emprego tenha relação direta com a falta de vivência durante a graduação. “Quando você não tem experiência, o mercado é bem competitivo porque, infelizmente, exige a experiência, mas não dá oportunidade. A faculdade também não faz essa ponte”, explica.

O jovem conta que, dos 80 colegas de turma, pouco mais de 15 conseguiram estagiar, pouquíssimos estão trabalhando e “ninguém tem qualificação necessária para empreender”. “Agora que eu saí da faculdade, por exemplo, poderia pensar em abrir um escritório próprio, mas sem experiência e vivencia do dia-a-dia do mercado, do contato com os clientes, é impossível”, afirma Carlos.

“Infelizmente eu me sinto inseguro, porque a realidade de um canteiro de obras é muito diferente do que a gente aprende na faculdade. O campo é que forma o engenheiro. A sala de aula só vai nortear, mas não nos deixa pronto. É a vivência que realmente vai te qualificar”, conclui.

Angelica Justino, 25 anos, recém-formada em Química pela UFMT (Foto: arquivo pessoal)

Especialização

Angélica Justino, 25 anos, se graduou em Química pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) na semana passada. Se está preparada para exercer a profissão, ela respondeu: “Meu curso é Bacharelado, voltado para indústria, que é bem corrido. Então você pensa ‘não vou dar conta de fazer tudo isso’. Na faculdade a gente vê muito mais a teoria… Então preparado a gente nunca se sente mesmo não”, afirma a jovem.

Sem perspectiva de acesso ao mercado de trabalho no momento, Angélica conta que dará seus próximos passos profissionais na própria academia. Ela irá começar uma pós-graduação em síntese orgânica e, em seguida, pretende buscar emprego em produção de fármacos, em cidades-polo do Sudeste.

[Sobre as possibilidades de mercado] eu nem estou sabendo ultimamente. Nenhum dos meus colegas estão trabalhando na área, mas estão fazendo mestrado, inclusive eu. Por enquanto a intenção é carreira acadêmica, mas não sei daqui para a frente, porque eu não quero dar aula. Estou me especializando para ir para indústria em algum momento”, afirma.

Apesar de a academia não ser o objetivo final da jovem, ela conta que a iniciação científica foi sua oportunidade de vivência da profissão durante três anos. “É como um estágio. Enquanto eu não estive em aula, estive desenvolvendo pesquisas. Isso me apresentou muito sobre a área, porque a gente tem contato diário com laboratório. Aprendemos coisas que na graduação a gente quase não vê. Agora, no mestrado, se eu não tivesse essa experiência eu entraria em pânico”, afirma Angélica.

Ela explica que as principais dificuldades em procurar experiências fora da faculdade é a carga horária integral do curso, além da desinformação sobre possibilidades de trabalho. “A gente tenta se manter informado, mas geralmente é difícil ter acesso. Além disso, não sobra tempo para fazer estágio fora daqui. Que eu saiba, toda a minha turma foi para iniciação científica ou PIBID, que é voltado para a licenciatura”.

Vislumbrando vagas em programas de treinamento, ela quer focar no inglês. “Na área que eu quero atuar, preciso tem que ser fluente. Participei de um processo seletivo para treanee e esbarrei na lingua, porque esse treinamento era feito nos Estados Unidos durante 10 meses”, conta.

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