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TCE tentou levar serviços da Travessia para o governo estadual

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TCE tentou levar serviços da Travessia para o governo estadual

Ednilson Aguiar/O Livre

Travessia , faesp

Em 2015, técnicos da Travessia foram designados pelo TCE para atuar no Executivo Estadual

No início de 2015, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT) tentou levar o seu milionário Programa de Desenvolvimento Institucional Integrado (PDI) aos órgãos do Executivo Estadual.

A princípio voltado às prefeituras, por meio de palestras e treinamentos a cargo da empresa de consultoria Travessia Desenvolvimento Organizacional Ltda, o programa ganharia desse modo um novo e vasto campo para se expandir.

Naquele ano, o gestor governamental Rafael Costa Neves, lotado na Secretaria de Planejamento (Seplan), recebeu a tarefa de preparar um plano de gestão para a Procuradoria Geral do Estado (PGE).

Duas semanas depois, quando ainda começava o diagnóstico da situação com a qual teria de trabalhar, soube que receberia uma ajuda jamais solicitada de técnicos da Travessia.

“Soube, com constrangimento, que essa empresa estava chegando para desenvolver o mesmo trabalho para o qual eu já havia sido designado”

“Soube, com constrangimento, que essa empresa estava chegando dentro da PGE para desenvolver o mesmo trabalho para o qual eu já havia sido designado”, disse Neves, em entrevista gravada no estúdio do LIVRE.

O Estado tem 107 gestores governamentais concursados. Ganham em média R$ 20 mil mensais. Para Neves, a chegada da consultoria do TCE prejudicou o trabalho não apenas pelo que avaliou como um “choque de competências”.

“O resultado do trabalho foi comprometido principalmente em razão de uma urgência que não era da PGE, mas da própria consultoria. Então o trabalho, que deveria ser desenvolvido em um ano, no mínimo, foi programado para apenas três meses”, afirma.

O servidor relatou a situação em informação técnica encaminhada ao então diretor administrativo da PGE, Valdinei Valério da Silva. No documento, ao qual o LIVRE teve acesso, Neves fez o alerta de que o cronograma do PDI propunha “um prazo excessivamente exíguo”.

“Não tem trabalho que seja consistente em um espaço tão reduzido. Fiz esse alerta, mas não houve ressonância, enfim, não fui ouvido. E, de fato, tive que refazer o trabalho”, disse Neves, na entrevista.

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Planilha de Excel

A experiência levou o servidor a analisar de perto o contrato firmado entre a Travessia e o Tribunal de Contas. Assinado com dispensa de licitação, o documento previa serviços de gestão e a aquisição dos direitos autorais e, ao mesmo tempo, de 213 licenças do software GPE (Gerenciamento do Planejamento Estratégico).

“Me deparei com uma série de cláusulas abusivas e um contrato flagrantemente ilegal. Um exemplo é que, em um serviço que era para ser prestado em 12 meses, e que depois foi prorrogado para 24 meses, o contrato previa o pagamento do valor global em cinco meses. Ou seja, pagamento antecipado”, afirmou.

Outro ponto foi a contratação conjunta, e segundo ele indevida, de serviços de consultoria em gestão e de fornecimento de software. “Se fossem fazer uma licitação com aqueles valores, as grandes empresas do segmento de gestão concorreriam e a Travessia não teria chance. Com a justificativa de que o software era único, indispensável, conseguiram descaracterizar a necessidade de licitar”, disse.

O GPE, segundo o gestor, está longe de ser indispensável. “O software seria um instrumento de controle da agenda estratégica. Só que nós, profissionais da gestão, sabemos que este controle pode ser feito sem um sistema de informação dessa natureza. Daria para fazer numa planilha de Excel”, avaliou.

Contratos milionários

A atuação da Travessia a partir da assinatura do contrato com o TCE vem sendo alvo de uma série de reportagens publicada pelo LIVRE.

A empresa, segundo notas fiscais de serviço obtidas pela reportagem, é a principal terceirizada a serviço da Faespe (Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual) desde 2014.

A fundação é investigada na Operação Convescote sob suspeita de ter sido empregada em um esquema de desvio de verbas públicas por meio de contratos com o poder público e empresas de fachada.

Outra reportagem mostrou que, de 2012 a 2016, a empresa recebeu ao menos R$ 21 milhões por serviços prestados a órgãos públicos de Mato Grosso.

A elevação nos gastos do tribunal com consutorias e empresas de Tecnologia da Informação a partir de 2012 foi possível após um acordo para suplementação do orçamento costurado com o então governador Silval Barbosa.

Adriano Carvalho/O Livre

Info travessia

Sem custo

Em nota, a PGE disse que a entrada da Travessia em seu PDI se deu sem custo para o Estado. “Nunca saiu um centavo sequer do orçamento da PGE para pagar por serviços da Travessia”, disse a assessoria de imprensa da PGE, em nota.

Segundo a Procuradoria, nunca houve “contrato formal entre a PGE e a Travessia”. “Uma técnica da Travessia, enviada pelo TCE, trabalhou na PGE junto com o gestor Rafael da Costa Neves enviado pela Seplan. Eles auxiliaram na elaboração do Plano de Desenvolvimento Institucional e Integrado – PDI, entre 2015 e 2016”, afirmou a nota.

A PGE confirma que o TCE “tinha intenção de estender a proposta ao governo estadual”. “Ela não deu certo na maioria das secretarias e órgãos estaduais, por desentendimentos metodológicos entre o pessoal da Seplan e da Travessia”, concluiu.

A Seplan, em nota, afirmou não ver “choque” entre gestores e empresas especializadas do setor. “Os gestores não possuem como competência ofertar consultorias, aliás, as consultorias agregam conhecimento ao corpo técnico do Estado”.

Desde o início de junho, a reportagem do LIVRE aguarda posicionamento do Tribunal de Contas a respeito da atuação da Travessia em seu PDI, sem qualquer resposta. Procurada em seu endereço, a empresa não se manifestou.

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