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Servidores da Sema acusam governo de assédio moral

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Servidores da Sema acusam governo de assédio moral

Ednilson Aguiar/O Livre

Parque Serra de Ricardo Franco

Com 158 mil hectares, Parque da Serra de Ricardo Franco é ocupado irregularmente por fazendeiros

 

Sete servidores de carreira da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) vão propor na Justiça uma ação de indenização por assédio moral contra o governo do Estado. O grupo afirma, com base em documentos oficiais e gravações, que sofreu perseguição, ameaças e pressões indevidas ao tentar cumprir a decisão judicial que determinava a fiscalização e a regularização ambiental do Parque Estadual da Serra de Ricardo Franco, em Vila Bela da Santíssima Trindade (562 km de Cuiabá). A reportagem do LIVRE procurou a assessoria da Sema e aguarda a resposta.
 
“Em onze anos de trabalho com unidades de conservação, nunca vivi nada parecido”, disse, em entrevista exclusiva ao LIVRE, o analista ambiental Alexandre Batistella, biólogo com doutorado em Biologia da Conservação. “Parece que voltamos ao tempo dos coronéis”.
 
A ação será proposta em nome de Battistela e de outros seis servidores que atuavam na Coordenadoria de Unidades de Conservação (Cuco). Todos participaram dos trabalhos de campo que ajudaram a identificar irregularidades em 50 propriedades instaladas e em atividade dentro do parque. Além do desmatamento de quase 20 mil hectares de áreas protegidas para a criação de gado, a varredura dos fiscais identificou supressão de nascentes, poluição ambiental com agrotóxicos, desvio de cursos d’água e até trabalhadores sendo mantidos em condições análogas à escravidão.
 
O Parque Estadual da Serra de Ricardo Franco é uma área de conservação onde somente pesquisas científicas e turismo controlado deveriam ser permitidos. Berço de espécies endêmicas raras, o local reúne biomas do cerrado, pantanal e floresta amazônica. O trabalho dos servidores forneceu elementos para que o Ministério Público Estadual ingressasse com 50 ações civis públicas contra os ocupantes irregulares e um pedido de bloqueio de R$ 949,5 milhões em bens, além de mais de R$ 270 milhões em multas.
 
De acordo com o advogado Carlos Frederick, que representa o sindicato, os documentos e testemunhos dos servidores revelam um caso de assédio moral “sem paralelo”. “Estamos diante de uma situação em que servidores públicos sofreram assédio justamente por cumprir de forma correta o seu dever”, afirma.

Ednilson Aguiar/O Livre

Alexandre Batistela sema

Alexandre Batistella, doutor em Biologia da Conservação e servidor da Sema há 10 anos

 

Assédio
Segundo Batistella, este cenário começou a se desenhar a partir da posse do atual secretário de Meio Ambiente, o vice-governador Carlos Fávaro, em março de 2016. Produtor rural, Fávaro já foi presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja).
 
“A secretária anterior (a promotora de Justiça Ana Luiza Peterlini) havia nos dado total liberdade para que o trabalho de fiscalização fosse realizado”, relatou o servidor. “E isso vinha sendo feito de uma forma que o Parque da Serra de Ricardo Franco se tornaria um modelo para outras unidades de conservação da Amazônia”.
 
Para cumprir a ação civil pública que buscava obrigar o Estado a regularizar o parque, segundo documentos a que o LIVRE teve acesso, haviam sido programadas seis viagens da equipe para ações de fiscalização entre os meses de abril e setembro de 2016. Até junho, o cronograma foi cumprido normalmente.
 
No período, segundo o relatório parcial de prestação de contas encaminhado à Justiça no dia 28 de junho, foram aplicadas multas por crimes ambientais que somavam mais de R$ 200 milhões. “A partir daquele relatório, tudo mudou”, relata Batistella.
 
Viagem interrompida
No dia 4 de julho, quando a equipe estava a caminho do parque para cumprir a programação do mês de julho, uma mensagem da coordenadora da Cuco, Paula Marye de Andrade, determinou o “retorno imediato de viagem não autorizada pelos superiores”. Um documento anexado à ação, porém, demonstra que a mesma coordenadora havia assinado, três dias antes, uma ordem de serviço (054/2016) determinando a execução da mesma atividade.
 
“A gente saiu bem cedo porque tínhamos que nos deslocar de Cuiabá a Vila Bela para fazer vistorias, laudos e apreensões de bens, se fosse o caso”, conta Batistella. “Enquanto ainda estávamos abastecendo no posto aqui em Cuiabá, um colega ligou para a gente dizendo que a nossa chefe imediata, a coordenadora de Unidades de Conservação, determinou que a gente voltasse imediatamente porque não tínhamos autorização para ter ido a campo, sendo que toda a documentação estava em dia”.
 
Quando retornaram para a sede da Sema, os técnicos foram surpreendidos novamente. “Uma ordem do secretário-executivo foi emitida dizendo que nenhuma viatura da secretaria poderia sair naquele dia”, diz Batistella. “Depois ficamos sabendo que aquilo era para impedir que fôssemos até Vila Bela”. No mesmo dia, segundo Batistella, o secretário-executivo, André Luís Torres Baby, encaminhou e-mail aos servidores comunicando a abertura de uma sindicância “para avaliar a ingerência” da equipe.
 
O trabalho de fiscalização no parque só seria realizado dias mais tarde por exigência do Ministério Público Estadual. Mas o destino dos sete servidores começaria a mudar rapidamente a partir dali. Muitos percalços ainda surgiriam no caminho.
 
(Atualizada às 9h18)
 

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