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Sai a Assembleia, entra a Confraria dos Ausentes

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Sai a Assembleia, entra a Confraria dos Ausentes

Ednilson Aguiar/O Livre

 jornalista Augusto Nunes

jornalista Augusto Nunes

Os leitores deste site sabem há tempos que nenhum deputado estadual mato-grossense pode queixar-se da vida, sobretudo num Brasil atormentado pela crise econômica cujos efeitos mensuráveis começam por mais de 13 milhões de desempregados. Aos R$ 20,3 mil do salário, o ocupante de uma das 24 vagas na Assembleia Legislativa adiciona mensalmente os R$ 65 mil da verba indenizatória, os R$ 10 mil reservados a despesas com combustível e outros R$ 10 mil destinados a gastos com passagens aéreas. Tudo somado, a cada 30 dias um parlamentar embolsa R$ 105,3 mil. Não é pouca coisa.

Mas a coisa não para por aí. Na contramão da imensa maioria dos que imaginam representar, os autodenominados representantes do povo se dispensam de comparecer diariamente ao local de trabalho. Os cinco dias úteis semanais do calendário gregoriano só existem para brasileiros comuns. Não passam de três para quem desfruta da “semana parlamentar”, codinome da brasileiríssima safadeza que faz o sábado começar na manhã de sexta-feira e o domingo terminar só na noite de segunda.

A institucionalização da vida mansa abrange o ritmo de trabalho, uma obscenidade de deixar ruborizado até profissionais da vadiagem. Com exceção da quarta-feira, quando os deputados se animam a trabalhar de manhã e à noite, sessões deliberativas — aquelas que tratam de assuntos relevantes e aprovam ou rejeitam projetos e propostas — são realizadas apenas nas noites de terça, nas manhãs e noites de quarta e nas manhãs de quinta. Quem tem direito à semana parlamentar se sente extenuado quando trabalha mais que um período do dia.

Parece mentira? Pois ainda não é tudo, souberam neste 1* de agosto os leitores de O Livre confrontados com a reportagem de Laise Lucatelli que devassou outra abjeta façanha produzida coletivamente pelas Excelências de Mato Grosso: a Assembleia Legislativa foi reduzida a uma desoladora Confraria dos Ausentes. No primeiro semestre, 18 das 62 sessões deliberativas previstas foram abertas e imediatamente canceladas por falta de gente: a contagem das cabeças no plenário e na mesa diretora não alcançou o mínimo de oito parlamentares.

Outras 12 foram para o ralo por insuficiência de gente: só ocorrem votações quando o número de presentes ultrapassa metade dos 24 parlamentares. Feitas as contas, 30 sessões deliberativas não deliberaram sobre coisa alguma em consequência desse abandono de emprego generalizado e impune. Como preguiça, cinismo e deboche não são crimes, ninguém foi punido com a redução dos rendimentos de marajá, nenhum deles achou que devia desculpas aos eleitores.

Recordista em sumiços (41), Mauro Savi, do PSB, debitou o extraordinário desempenho na conta das visitas às bases, do atendimento olho no olho a prefeitos ou vereadores e nas viagens como integrante de comitivas comandadas pelo governador. Assessores do campeão garantiram que, mesmo longe do gabinete e do plenário, Savi se destaca pela “produção legislativa”. E lembraram que, na última eleição, foi ele o mais votado entre todos os candidatos a deputado estadual.

As alegações do recordista foram reprisadas, com ligeiras variações, tanto por seus concorrentes diretos quanto pelo grupo dos mais assíduos (ou menos ausentes). Enquanto convalesciam da perplexidade provocada pela reportagem, incontáveis eleitores esperaram pelas explicações mais convincentes que decerto viriam com o fim do recesso. O que diriam os gazeteiros compulsivos na primeira sessão deliberativa do segundo semestre? Ninguém disse coisa alguma, pela simples e boa razão de que houve sessão. Faltou quórum.

No pleito municipal de 2016, milhares de prefeitos e vereadores candidatos a mais um mandato se surpreenderam com a demissão decretada pelas urnas. E então compreenderam que o Brasil da Lava Jato perdera a paciência com os abusos dos políticos. De olhos fechados para as profundas mudanças na paisagem, os deputados estaduais parecem ignorar que os ventos gerados por acontecimentos recentes não sopram a favor de figuras que transformaram a Assembleia Legislativa de Mato Grosso num Congresso Nacional em miniatura.

Se não acordarem agora, muitos só enxergarão o tamanho do desastre em outubro de 2018. Depois de despejados do emprego que permite enriquecer sem trabalhar.

 

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