Em 1895, o escritor polonês Henrik Sienkiewicz resolveu dar um corpo novelístico à piedosa lenda cristã da tentativa de fuga de São Pedro de Roma, que narrava estar o apóstolo já numa das vias de saída da Cidade Eterna – tentando evadir-se à perseguição de Nero – quando deparou com o próprio Cristo, que seguia no sentido oposto. Admirado, perguntou: “Quo vadis, Domine?” – que significa “Onde vais, Senhor?”. Ele respondeu: “Vou a Roma, ser crucificado pela segunda vez, já que tu abandonaste teu povo”.

Naturalmente, o antigo pescador voltou-se e retomou seu caminho de volta à cidade onde deveria experimentar o martírio, enquanto o Senhor simplesmente desaparecia.

Historicamente, tem-se como consensual o ano de 67 para a morte de Pedro, assim como de Paulo, ambos em Roma: o primeiro, crucificado de cabeça para baixo, e o segundo, decapitado.  

A obra de Sienkiewicz foi vertida para a linguagem cinematográfica diversas vezes; a mais famosa e clássica foi a de 1951, aclamada pela crítica e público.  

Vale a pena ler “Quo Vadis?”. É um romance atraente, estilo novelão – mas do tipo que não deve agradar a leitores vanguardistas que consomem literatura engajada e passível de ganhar um Nobel nos nossos tempos.

Não obstante, reúne duas qualidades estratégicas que o fazem despontar como obra literária: um tema que expõe inspirações e conflitos transcendentes sobre a natureza humana e linguagem trabalhada o suficiente para agradar a necessidade estética do leitor mediano, que não busca, necessariamente, referências estilísticas em recomendações acadêmicas. Não tem o quid personalista e egoístico que incensa o individualismo, mas a generosidade inocente de tentar atingir anseios comuns a todas as pessoas.

É consenso geral que qualquer obra literária submete-se a um crivo particular: o carisma de seus personagens. Em “Quo Vadis?” os personagens dão um espetáculo à parte: têm a simplicidade que se espera de uma narrativa ágil, mas não deixam de receber um tratamento que lhes aprofunda o caráter, servindo de maneira excelente ao propósito de provocar no leitor sentimentos de emulação e repulsa, devidamente ordenados aos valores humanos que se desejam explicitar.

Destaco, particularmente, a graça e a perspicácia dos personagens Chilon Chilonides e Petrônio, além da engenhosa e divertida caracterização de Nero – que não deve estar, acredito, muito longe da realidade histórica.

Valores perenes, paixões, prazeres, alegrias e sacrifícios de sentidos opostos – pela verdade ou pela autocomplacência: eis os traços mais destacados desta obra que, embora volumosa em páginas, corre ligeira pelos olhos do leitor, sem deixar de suscitar-lhe reflexões um pouco mais detidas e relevantes. Leitura válida, agradável, edificante e, doravante, recomendada!

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