Céu ou inferno? Enterro ou cremação? Você já pensou para onde vai após morrer? Pensar na morte não é um passatempo dos mais atrativos, mas o fato é que muita gente não sabe que ao morrer é possível doar seu corpo em razão de um bem para quem ficou: o estudo científico. E a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) alerta: faltam doadores nessas terras.
Quem afirma é o professor de Anatomia do curso de Medicina da UFMT, Flávio Silva Tampelini. Nos últimos cinco anos, nenhuma doação foi destinada à universidade mato-grossense. A falta de doadores não é exclusividade de Cuiabá, pois a realidade é a mesma em todo o país.
Na Universidade Federal de Rondônia, os futuros médicos possuem apenas um cadáver para os estudos. Na UFMT, a situação é um pouco melhor: uma média de 10 corpos, mas alguns com 20 ou 30 anos de uso.
Cadáveres inteiros, ossos e outras partes do corpo humano são extremamente necessárias para o estudo e produção científica. No caso da Federal de Mato Grosso, além dos alunos de Medicina, os de Enfermagem, Nutrição, Educação Física, Farmácia e Biomedicina – sendo estes últimos dois em campi do interior – precisam de material humano para aprender as profissões.
Na falta de doadores, a universidade trabalha em parceria com o Instituto Médico Legal (IML), onde a maioria dos cadáveres que chegam são de pessoas não reconhecidas por familiares.
“A pessoa morre, ninguém reconhece, passa algum tempo e eles mandam para a universidade”, conta Tampelini.
Todo o procedimento para que o corpo seja doado para os estudos científicos, porém, dura alguns anos. E, mesmo depois de doados, a universidade precisa deixar o cadáver guardado por pelo menos um ano antes da utilização.
E a conservação?
A melhor forma de conservar um cadáver ainda é o formol, que pode manter o corpo intacto por tempo indeterminado, segundo Tampelini. Entretanto, a substância é proibida em universidades, o que fez a UFMT optar pela conservação de corpos com glicerina, álcool e até mesmo sal grosso.
Segundo Tampelini, a conservação nesses outros casos não é a mesma que com o formol. Com o método de conservação com glicerina, por exemplo, os corpos tendem a ficar mais escuros e com a aparência menos conservada. A média de duração é de 20 a 30 anos.
Cultura da doação
A única doação que chegou até a universidade foi a de um médico rondonopolitano, que ainda em vida resolveu doar seu corpo para o estudo acadêmico. Mas essa não é uma realidade encontrada no país.
“Ainda é muito difícil falar sobre isso. A sociedade não aceita esse tipo de conversa. Existe um tabu muito grande quando se fala em doar seu corpo para estudo. Não é a realidade do país”, pontua Tampelini, que acrescenta que em países como os Estados Unidos as universidades chegam a receber cerca de 250 cadáveres anualmente.
Quer ser um doador?
Se você se sentiu encorajado, o procedimento não é tão complicado. É necessário fazer uma declaração de doação assinada com mais duas testemunhas e registrada em cartório. Vale lembrar que é importante indicar para qual instituição você deseja fazer a doação.
Para que o destino seja certo, a família também tem que respeitar a vontade do futuro defunto. “Se a família não autorizar, mesmo com o documento assinado pelo morto, a doação não pode ser feita”, ressalta o professor.
Então, vale uma conversa prévia e cruzar os dedos para que sua família entenda seu propósito pós-vida.