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Programa “clone” de escutas, Sentinela seria vendido por R$ 400 mil à PM

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Programa “clone” de escutas, Sentinela seria vendido por R$ 400 mil à PM

Ednilson Aguiar/O Livre

Comando Geral da PM

Comando Geral da Polícia Militar

O sistema Sentinela, utilizado por policiais militares em uma central de escutas telefônicas, foi desenvolvido com o objetivo de se tornar um concorrente do sistema Guardião, empregado nas investigações policiais no Estado. Ele chegou a ser apresentado oficialmente ao Comando Geral da Polícia Militar e, segundo depoimento do empresário José Marilson da Silva, seria vendido à instituição por R$ 400 mil.

Marilson era sócio da Simples IP, empresa contratada pelo cabo Gérson Luiz Ferreira Gouveia Júnior para desenvolver o Sentinela e dar apoio operacional ao escritório dos grampos montado numa sala comercial no Centro de Cuiabá.

A reportagem apurou que o empresário detém os direitos do código-fonte do sistema depois de ter se desligado da empresa e pago R$ 80 mil à Simples IP. O LIVRE entrou em contato com Marilson, mas ele não quis dar entrevista.

O cabo Gerson, responsável pela contratação da Simples IP, havia atuado no Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), assim como outro cabo, Euclides Torezan. No Gaeco, os dois tiveram contato direto com o sistema Guardião, o programa oficial utilizado para escutas telefônicas autorizadas pela Justiça. 

Escritório de grampos foi montado em sala no Centro de Cuiabá; militares que haviam passado pelo Gaeco trabalharam lá para desenvolver programa de escutas

Conforme apurou a reportagem, Torezan foi deslocado para o escritório no centro de Cuiabá a pedido de Gérson, que coordenava as escutas.

Pela experiência com o Guardião e por ser formado em Tecnologia da Informação (TI), Torezan tinha conhecimento dos requisitos básicos para o desenvolvimento de um sistema de escutas telefônicas como o Sentinela. O militar foi preso preventivamente em 23 de junho, mas foi liberado em 11 de julho. Ele nega ter cometido crimes.

Vantagens da concorrência

O Sentinela é baseado na plataforma Wytron e, segundo apurou o LIVRE, possui algumas melhorias em relação ao concorrente. Para a realização das interceptações com o Guardião, é preciso que o operador – quem escuta as ligações – esteja no mesmo local em que o equipamento está instalado. Já no Sentinela, o conteúdo das escutas telefônicas pode ser acessado online, a partir de qualquer computador ligado à internet.

Para funcionar, o sistema precisava de dois equipamentos principais: um servidor de aplicação do tipo rack e um módulo GSM. O servidor que gravou as escutas ficava armazenado em uma sala da empresa Titânia Telecom, no mesmo prédio em que funciona a Simples IP, na avenida Isaac Póvoas.

A chamada ‘sala-cofre’ foi escolhida por ter energia 24 horas por dia, temperatura controlada e internet disponível. Em depoimento, Marilson relatou que o equipamento foi retirado em 8 de outubro de 2015 a pedido do cabo Gérson, sem explicações.

Notas fiscais

De acordo com a denúncia dos promotores Mauro Zaque e Fábio Galindo, a Simples IP recebeu R$ 24 mil pela compra do servidor e do módulo. Os dois equipamentos podem ser utilizados para PABX e Call Center, mas o Sentinela tem como funções exclusivas a gravação e o armazenamento de escutas telefônicas.

O dinheiro para a compra teria vindo do ex-chefe da Casa Militar coronel Evandro Ferraz Lesco – a nota fiscal consta no nome dele. Em depoimento, Lesco negou que tenha comprado o equipamento. Ele afirma que apenas emprestou o dinheiro ao cabo Gérson.

Nota fiscal de compra de equipamentos da Simples IP aparece em nome do
ex-chefe da Casa Militar

Outros R$ 36 mil deveriam ser repassados à Simples IP, mas o pagamento ficou pendente após o encerramento das operações. A reportagem tentou contato com a defesa do cabo Gérson por telefone e mensagem, mas não obteve resposta.

Barriga de aluguel

O esquema conhecido como “barriga de aluguel” foi utilizado para grampear os telefones de autoridades e profissionais em Mato Grosso.

Policiais ligados à cúpula do governo do Estado incluíram números da deputada estadual Janaína Riva (PMDB), do advogado eleitoral ligado ao PMDB José do Patrocínio, do jornalista José Marcondes “Muvuca”, entre outros, em uma investigação de tráfico de drogas. Um telefone no Gaeco também teria sido interceptado.

Uma ex-amante e uma secretária do ex-chefe da Casa Civil Paulo Taques também foram grampeadas – ele deixou o cargo em maio quando o caso veio à tona e trabalha na defesa de algumas pessoas investigadas pelos grampos, como o coronel Airton Siqueira Júnior, ex-chefe da Casa Militar.

A denúncia foi feita pelos promotores Mauro Zaque e Fábio Galindo quando eles eram secretário e adjunto, respectivamente, da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp).

Zaque afirma que o governador Pedro Taques (PSDB) sabia do esquema e que a denúncia foi protocolada no gabinete do chefe do executivo. Um relatório da Controladoria Geral do Estado (CGE) apontou fraude no protocolo quatro horas depois da chegada do documento entregue pelo promotor. Taques afirma que não tinha conhecimento dos grampos.

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