Há dias em que, para encontrar peixe, José Aparecido Neires, tem de dirigir mais de 500 km até chegar na região do Rio Arinos, no norte do estado. O pescador profissional de 58 anos mora no bairro Altos do Coxipó, em Cuiabá, mas o rio que dá nome a cidade já não oferece a mesma quantidade de pescado de outrora.
Cerca de 15 anos atrás, a história era diferente. “Antes era farto demais, você ia lá e pescava o suficiente rapidinho. Hoje você vai lá, fica duas horas e não pega nada”, afirma o pescador. Com algumas economias, Aparecido conseguiu reverter a escassez do pescado ao comprar um carro com o qual viaja pelo estado em busca do peixe.
Quem não tem a mesma autonomia viaja menos quilômetros. O Pantanal é o principal destino destes pescadores. “Eu até pesco no rio Cuiabá, mas só lá para baixo, em Porto Jofre e Porto Cercado”, pontua Aparecido.
Mas nem sempre foi assim, a antiga estiva do Porto, era o ponto de encontro de pescadores. O rio alimentava a cidade, principalmente no período da Páscoa. Mas peixe santo que chegará à mesa dos cuiabanos este ano provavelmente não virá do rio. Segundo cálculos da Cooperativa de Pescadores e Aguicultores do Mato Grosso (Coopemat), 80% do peixe consumido nas feiras de Cuiabá e Várzea Grande vem da piscicultura.
O presidente da Coopemat, Claudionor Angeli, diz que a redução do número de peixe de água doce tem sido veloz e gradual. Ele afirma que se a escassez continuar como está os pescadores terão que viajar ainda mais longe para conseguir pescar o suficiente.
“Hoje não dá para viver como pescador. Você apenas vegeta, não tem qualidade de vida, não consegue criar um filho decentemente”, lamenta ele.
A falta de tratamento de esgoto, de proteção às nascentes e a pesca predatória motivam a movimentação dos pescadores em Mato Grosso. Mas, para Angeli, o pescador é o menor culpado na história. Segundo ele, é preciso oferecer linhas de crédito e apoio governamental para fazer com que estes profissionais migrem para a piscicultura.
A Coopeamat tem cerca de 37 pescadores espalhados por municípios como Barão de Melgaço e Santo Antônio do Leverger. Angeli diz que a atração do seguro-defeso aumentou o número de pescadores, mas gerou uma contradição. “Tem quase mais pescadores do que peixe”, critica ele com ironia.
O ictiólogo Francisco de Arruda Machado, conhecido como “Chico Peixe”, faz um cálculo provisório: se antes havia 150 peixes pescadores, hoje o número é de 150 pescadores por peixe. Para Chico, o número do pescado caiu ao mesmo tempo em que mais pessoas pescam.
Mas, para ele, o pescador é o menor dos problemas. A degradação ambiental, o aumento das pequenas usinas hidrelétricas nos rios, e o lançamento de animais híbridos ocasionou a precariedade de pescado que vivemos atualmente.
“Nós estamos trocando uma proteína de excelente qualidade, que é a proteína do peixe, por uma energia que atualmente já não é mais tão necessária.”, questiona o especialista. A diversidade de problemas e fatores preocupa Chico: “Eu vejo um futuro negro para a pescaria em Mato Grosso”, sentencia.