Orla do Porto tem problemas críticos, diz Crea

Um relatório técnico elaborado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-MT) relacionou problemas em várias estruturas do complexo turístico Orla do Porto, em Cuiabá, inaugurada há pouco mais de três meses. No relatório, há uma lista de erros cometidos no projeto e na execução da obra: do aterramento a problemas críticos no Teatro de Arena, banheiros mal acabados e instalações elétricas improvisadas. A acessibilidade à orla também é considerada um problema.

A orla foi uma das últimas obras entregues pelo ex-prefeito Mauro Mendes (PSB) e custou cerca de R$ 24 milhões. O complexo turístico foi inaugurado no dia 22 de dezembro de 2016, com show da cantora Anitta. Desde então, recebeu o réveillon oficial da prefeitura de Cuiabá e o evento principal do Carnaval, além de atrair moradores e turistas diariamente. 

Cheia do rio
O documento é assinado pelos engenheiros Jesuel Alves de Arruda e André Luiz Schuring e também pelo tecnólogo em controle de obras, Reynaldo Magalhães Passos. A visita técnica foi realizada no dia 6 de fevereiro, depois que a imprensa local divulgou relatos de pisos soltos e outros defeitos na obra.

No relatório, os membros do Crea-MT concluíram que, entre outros problemas graves, existe risco de desestabilização do solo no local em caso de enchentes do Rio Cuiabá. “As águas superficiais da calçada são direcionadas no corpo do gabião, assim como as das galerias de águas pluviais, nas bases das estruturas de gabião. Entre o trecho comprometido do Córrego Mané Pinto até o Teatro de Arena, não foram executados sistemas de proteção, como dissipadores de energias”, atesta o relatório. “Visto que a estrutura se situa na calha do Rio Cuiabá, está sujeita às águas de enchentes, que poderão causar erosões na base, desestabilizando a referida estrutura.”

Os erros mais graves se encontram na caixa base de gabião, estrutura da fundação do local que apresenta deformação excessiva em vários trechos, segundo o relatório.

O muro de contenção em gabião é uma estrutura de aterramento, constituída por uma caixa de tela metálica preenchida com pedra britada. Dois trechos da obra utilizaram este tipo de estrutura em sua fundação. No primeiro trecho, que vai da praça Luís de Albuquerque até a foz do córrego Mané Pinto, foram utilizadas pedras de brita em grãos menores, de maneira correta, o que gerou poucos espaços vazios no meio da estrutura. As paredes da estrutura, que ficam próximas ao rio, estão lineares e niveladas corretamente. Neste trecho, contudo, o limite entre o solo estabilizado e o aterro realizado para a urbanização do local apresenta rachaduras, e na região aterrada há concentração de trincas.

Os maiores problemas começam no segundo trecho, que vai do córrego até o restaurante Jacá Pier Bar. Foram utilizadas britas de granulação maior, criando excesso de espaços vazios, que dão abertura para deformação na estrutura. O contrapiso de concreto das calçadas e o piso das edificações se apoiam diretamente na face superior do gabião, o que já danificou a tela de proteção das caixas fazendo com que pedras se soltassem. As rachaduras, o desnivelamento do solo, fissuras e outros problemas vistos em várias partes do local são consequência dessas deficiências no solo que suporta o contrapiso.

Grande parte das águas das chuvas que cai sobre a calçada escoa na direção do gabião, que não possui proteção contra erosão, o que deve gerar problemas a longo prazo. A estrutura sob o restaurante Orgulho Cuiabano já apresenta uma deformação excessiva.

“Entende-se que a referida obra foi entregue inacabada, e que não utilizaram-se técnicas apropriadas de engenharia, visto o equívoco de executar um pavimento rígido sobre uma estrutura flexível, como o piso de concreto sobre a estrutura de gabião”, diz o relatório.

Os guarda corpos, grades que servem de segurança para os visitantes do local, foram projetados com um vão maior do que os permitidos pela norma, dando a possibilidade de que uma pequena criança passe pela abertura, caindo na margem do rio que se situa logo abaixo. Entre os restaurantes Frutaria Marília e Orgulho Cuiabano, uma tela metálica foi colocada como solução paliativa, como constatado pela reportagem do LIVRE.

“Lastimável”
No Teatro de Arena, o estado de obra é considerado “lastimável”, com trincas e rachaduras nas estruturas, “na iminência de ruína”. O teatro, localizado ao lado do restaurante Jacá Pier Bar, foi construído para receber pequenos espetáculos, com arquibancadas de alvenaria e concreto e um pequeno palco próximo à margem do Rio Cuiabá. Existe um desnível acentuado no patamar da arquibancada, solos soltos, acabamento com superfícies cortantes, entre outros problemas visíveis.

Nos quiosques que abrigam um restaurante ainda em obras e os banheiros, as ligações elétricas são feitas por fios que ficam pendurados na parte externa dos prédios, passando até mesmo por uma árvore.

A situação das instalações dos banheiros também é crítica, segundo o relatório. Infiltrações são visíveis no forro, há entupimento da rede de esgoto, vasos sanitários. Os banheiros destinados às pessoas com deficiência não possuem assento, e a ventilação é inexistente ou mal dimensionada, com odor de esgoto excessivo. Na época da vistoria técnica, trabalhadores terceirizados utilizavam os banheiros como copa e vestiário.

O relatório pede que os problemas na obra sejam corrigidos rapidamente para que não aumentem e ameacem a construção, colocando em risco a segurança dos frequentadores. As mudanças devem ser feitas para que a obra “possa oferecer condições dignas, seguras e apropriadas para práticas recreativas e seus elementos construtivos tenham o desempenho esperado”. Ainda são pedidas mudanças na acessibilidade.

“Inacessível”
Esta é também uma questão problemática na Orla do Porto. Um relatório produzido em janeiro pelo Crea-MT encontrou outros erros. O conselho avaliou que a ciclovia não possui a devida sinalização e escoamento de água, ficando alagada sempre que chove. Os demais problemas no piso, como azulejos soltos e a falta de sinalização tátil, também atrapalham. A obra foi considerada “inacessível”.

O número de entradas acessíveis para pedestres e pessoas com deficiência são insuficientes, diz o conselho. As vagas especiais estão localizadas junto ao canteiro central, com sinalização inadequada e sem acesso à orla. As vagas comuns também não dão acesso direto ao passeio. “É como se o autor quisesse promover o atropelamento e o medo. Cria insegurança, riscos elevados e conflitos entre carros e pedestres”, diz o relatório.