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O xeque-mate avança à medida que as peças se movimentam

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O xeque-mate avança à medida que as peças se movimentam

O jogo avança no ritmo cinético dos eixos, conforme já expus, em função da atenção concentrada no bispo (eixo do sistema de crenças), no cavalo (eixo do poder armado), na torre (eixo da economia), segundo a estratégia definida pelo jogador que vê de uma perspectiva mais elevada.  O Rei é peça, mas observa a rainha e as demais peças em seus movimentos.

O bispo avança na diagonal. Na semana passada o milionário Jeffrey Epstein foi encontrado “quase inconsciente” com “marcas no pescoço” em posição fetal no chão da cela que ocupa no Centro Correcional Metropolitano (MCC), em Manhattan. Certamente é uma pessoa que sabe muito sobre as práticas abusivas perpetradas por “poderosos” ao longo de muitos anos. Uma pequena pesquisa sobre o tema pode revelar bastante sobre como funcionam, de verdade, alguns mecanismos de poder. Todavia, para enxergar é preciso querer ver. As pessoas têm dificuldades de assimilação quando seus fundamentos são abalados, fato explicado pelo conceito de “Túnel de realidade” cunhado por Timothy Leary, mostrando que os indivíduos possuem um filtro mental com o qual percepcionam a realidade. Ao estudar este conceito foi verificado que as pessoas só ouvem, enxergam ou entendem o que se encaixa dentro do seu sistema de crenças, abdicando do discernimento. Por isso Jesus escolheu seus discípulos entre pessoas iletradas, mas de mente aberta com poucos filtros. Quando se aproxima uma disruptura, para percebê-la antecipadamente, é necessário ter “olhos de ver e ouvidos de ouvir”.

O cavalo se posiciona para o momento decisivo, sabe que vai precisar de força. As novas famílias de armas escalares, bem como novas tecnologias mudaram o uso dos recursos no tabuleiro. O poder destrutivo exercido com sutileza tem sido amplamente utilizado porque não provoca reações extremas da opinião pública (https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/07/23/algo-aconteceu-com-os-cerebros-de-diplomatas-dos-eua-em-cuba-diz-estudo.ghtml). As potências ocidentais agrupam forças no Estreito de Hormuz, no Mar do Sul da China e nas fronteiras com a Rússia. Seus oponentes, dentre eles Rússia, China, Irã, Síria e Coreia do Norte também se posicionam, a Índia aguarda. Uma nova corrida armamentista está em curso e a guerra cibernética e de inteligência precede o ato final, encontrando-se em decisivo andamento, (https://securityaffairs.co/wordpress/88657/intelligence/fsb-contractor-sytech-hacked.html).

A torre teve os seus movimentos anteriores plotados e seus futuros lances parecem ir numa direção não regressiva. Os grandes bancos, pilares do sistema financeiro internacional e colunas da economia, tem mostrado um comportamento passível de cuidadoso acompanhamento, senão vejamos.

O HSBC sofreu em 2014 uma investigação vigorosa por parte do Senado americano (http://www.hsgac.senate.gov/subcommittees/) que concluiu, segundo o The Guardian, que o gigante bancário “ignorou os sinais de alerta de que suas operações globais estavam sendo usadas por lavadores de dinheiro e potenciais terroristas” – http://www.guardian.co.uk/. No ano seguinte outro escândalo veio à tona onde o banco britânico foi acusado de “ajudar” clientes ricos a evitar o pagamento de milhões de dólares em impostos por meio de sua filial na Suíça – http://www.bbc.co.uk/. Os documentos incluem dados sobre 5.549 contas secretas de brasileiros, entre pessoas físicas e jurídicas, com um saldo total à época de US$ 7 bilhões (R$ 19,5 bilhões).

Em 2016 foi a vez do Goldman Sachs ocupar os holofotes, pagando multas de US$ 5 bilhões, após a conclusão de uma investigação do Departamento de Justiça dos EUA que sentenciou: “Esta resolução torna o Goldman Sachs culpado por má conduta e por mentir a investidores ao afirmar que os títulos eram apoiados por hipotecas saudáveis“, disse Stuart Delery, do Departamento de Justiça – http://epocanegocios.globo.com.. O banco criou “credibilidade” para o que não tinha lastro. A reportagem ainda diz: “O anúncio é o mais novo capítulo da série de esforços de autoridades do Departamento de Justiça, em conjunto com outros Estados, de penalizar bancos por impulsionarem a bolha imobiliária que resultou no colapso financeiro de 2008. Instituições como o J.P. Morgan Chase, Bank of America, Citigroup e Morgan Stanley já pagaram, juntos, quase US$ 40 bilhões para encerrar investigações parecidas. Fonte: Dow Jones Newswires”. Entenda-se por “impulsionarem a bolha imobiliária” como óbvia manipulação do mercado, do contrário não haveria punição. Fica claro que o pagamento de multas conjuntas de cerca de US$ 40 bilhões foi para “para encerrar investigações parecidas”, o que saiu barato para os bancos, do contrário eles não pagariam. Quem já fez antes pode fazer de novo.

Este ano foi a vez, como já comentado em outro artigo da série “xeque-mate”, do Deutsche Bank, um gigante da Europa. Há indícios que o banco pode estar envolvido no vultoso escândalo do fundo de desenvolvimento 1MDB (1Malaysia Development Berhad) da Malásia, tendo violado as leis de corrupção estrangeira e/ou lavagem de dinheiro, informou o Wall Street Journal. Isso surgiu quando o The New York Times noticiou  que os gerentes do Deutsche Bank negligenciaram as advertências do pessoal de Compliance em suas negociações com Jeffrey Epstein. A situação do banco tornou-se tão aguda que ele anunciou a demissão de 18.000 funcionários e a venda de € 150 bilhões (US$ 168 bilhões) de saldos mantidos em carteira para o francês BNP Paribas.

Os analistas bem informados percebem que algo está vindo, os sinais já são visíveis para olhos treinados. Desde o comportamento dos fundos de investimento, citado em outro artigo, como o RenTec de James Simons, aos “avisos” do próprio analista do Deutsche Bank, Robin Winkler, quando diz:  “a tensão cíclica nos desequilíbrios financeiros globais atingiu níveis vistos pela última vez na véspera da crise financeira”, tudo leva a crer que a luz vermelha acendeu-se. Robin Winkler demonstrou isso graficamente:

Outro analista, Michael Cembalest, do J.P.Morgan, prevendo a possibilidade do dólar não resistir a próxima crise, mostrou de uma forma gráfica que as moedas de reserva não duram para sempre e o dólar também perderá o seu status.

Cembalest disse: “Eu me lembro do seguinte comentário do falecido economista do MIT, Rudiger Dornbusch: ‘A crise leva muito mais tempo do que você pensa, e então acontece muito mais rápido do que você imagina’”. O status de moeda de reserva está sendo questionada, e ninguém menos que o Private Bank do J.P.Morgan pergunta, na estratégia de investimento deste mês, se o “privilégio exorbitante do dólar” está chegando ao fim? Eles dizem: “Acreditamos que o dólar poderia perder seu status de moeda dominante do mundo (o que poderia levá-lo a depreciar no médio prazo) devido a razões estruturais e a impedimentos cíclicos”. Por que eles tocam neste assunto agora?

Atualmente, 85% de todas as transações cambiais envolvem o dólar, ainda que a participação do PIB estadunidense seja de cerca de 25% do PIB global.

Segundo estudos, dos estimados US$ 30 trilhões em crescimento de consumo da classe média entre 2015 e 2030, espera-se que somente US $ 1 trilhão venha das economias ocidentais de hoje. Na medida que outras regiões crescem e se tornam relevantes na economia, a participação de transações que não utilizam o dólar inevitavelmente aumentará, o que provavelmente reduzirá a importância do dólar como reserva de valor.

Países de todo o mundo já estão desenvolvendo mecanismos de pagamento que evitam o uso do dólar. A China já possui em funcionamento o “payment versus payment”, lançado em 9 de outubro de 2017. Com o sistema é possível realizar transações em moedas nacionais, por exemplo, da Rússia e da China, sem utilização do dólar. A Gazprom (Rússia) e a CNPC (China), duas gigantes do ramo de energia, assinaram um contrato, válido por 30 anos, de fornecimento de gás russo à China no valor total de US$ 400 bilhões de dólares, pagos em yuans, sem uso de dólares. Este sistema está em expansão para novas moedas no intuito, inclusive, de contornar as sanções americanas que utilizam o sistema SWIFT como instrumento de pressão.

Segundo Peter Koenig, o PIB dos estadunidenses será de US$ 21,1 trilhões em 2019 (estimativa do Banco Mundial), com uma dívida atual de US$ 22 trilhões, ou seja, 105% do PIB. O PIB mundial está projetado para 2019 em US$ 88,1 trilhões (Banco Mundial). De acordo com a Forbes, existem cerca de US$ 210 trilhões de “passivos não financiados” (valor presente líquido de obrigações futuras projetadas, mas não financiadas, principalmente previdência social, Medicaid e juros acumulados sobre dívidas), um número cerca de 10 vezes o PIB dos EUA, ou duas vezes e meia a produção econômica mundial. Além disso, há cerca de um a dois quatrilhões de dólares (ninguém sabe a quantia exata) dos chamados derivativos flutuando em todo o mundo. Esta dívida monstruosa é parcialmente detida na forma de títulos do Tesouro como reservas cambiais por países em todo o mundo – https://www.globalresearch.ca.

O grande problema da perda do status do dólar como moeda de referência global é que os EUA são totalmente dependentes deste status para “rolar” seu monstruoso déficit gêmeo e consequente colossal dívida. A perda futura desta liquidez do dólar levaria a economia dos EUA ao caos, e obter autorização do congresso para elevar continuamente o teto da dívida atual, como vem fazendo, não vai ajudar.

Até mesmo a candidata presidencial democrata Elizabeth Warren, segunda colocada nas pesquisas para indicação do partido, chama a atenção para os sinais crescentes de problemas na economia. Num artigo que ela divulgou na segunda-feira da semana passada, alerta para um “estouro econômico” se aproximando. Ela disse:

“Quando olho para a economia hoje, vejo muito com o que me preocupar novamente. Eu vejo uma recessão no setor manufatureiro. Eu vejo uma economia precária que é construída sobre a dívida – tanto a dívida das famílias quanto a dívida corporativa – e isso é vulnerável a choques. E vejo uma série de choques sérios no horizonte que podem fazer com que os alicerces instáveis de nossa economia desmoronem”.

“Uma geração de salários estagnados e custos crescentes para o básico, como moradia, creches e educação, forçaram as famílias americanas a assumir mais dívidas do que nunca. A dívida do estudante “mais do que dobrou desde a crise financeira”. A dívida do cartão de crédito americano corresponde ao seu pico de 2008. A dívida de empréstimos de automóveis é a mais alta desde que começamos a rastreá-la há quase 20 anos, e um número recorde de 7 milhões de americanos estão atrasados em seus empréstimos para automóveis – muitos dos quais têm características abusivas semelhantes às hipotecas subprime pré-colisão. 71 milhões de adultos americanos – mais de 30% dos adultos no país – já têm dívidas na arrecadação. As famílias podem ter condições de arcar com esses pagamentos de dívidas agora, mas um aumento nas taxas de juros ou uma desaceleração na renda poderiam levar as famílias a um precipício”.

O que os governos das potências estão fazendo para proteger-se desta perspectiva?

O ouro é reconhecido como uma reserva de valor segura a muitos séculos. Sobre esta questão não há muitas controvérsias entre aqueles que entendem do assunto. Os países investem milhões para construir estruturas seguras para custodiar seu ouro físico porque sabem que ele é uma reserva de valor inquestionável, do contrário por que o fariam? Numa crise ele é considerado um refúgio seguro, diferentemente de papeis de crédito sujeitos a especulação advinda de percepções de credibilidade e de liquidez. O governo dos EUA afirma ter 8.133,5 toneladas de ouro físico em suas reservas oficiais. Cinquenta e oito por cento são mantidos em Fort Knox, no Kentucky, 20% em West Point, no estado de Nova York, 16% estão na casa da US Mint em Denver, Colorado e 5% são mantidos nos cofres do NY Fed (Federal Reserve Bank of New York). As reservas de ouro da Rússia totalizaram 2.208 toneladas, informou o Banco Central da Rússia (CBR), estimando o valor de suas reservas de ouro em US $ 100,3 bilhões em 1º de julho. Só em junho, a Rússia acrescentou 18 toneladas do metal precioso às suas reservas. Aumentando seus estoques de ouro, a Rússia também está diminuindo sua participação nos títulos do Tesouro dos EUA – Sputnik.

Como eu já afirmei em outro artigo da série xeque-mate: “A compra de ouro dos bancos centrais nos primeiros cinco meses deste ano é 73% maior do que um ano antes, com a Turquia e o Cazaquistão também se unindo a China e a Rússia como os quatro maiores compradores. É possível constatar que 2018 foi o ano em que bancos nacionais / centrais adquiriram mais ouro desde 1968 e estes volumes atuais estão ultrapassando o volume do ano passado em 73%, tornando possível, se a tendência continuar, prever que 2019 será o maior ano para aquisições de ouro na história”. Todos de movem rapidamente e decisivamente para proteger suas economias.

E o Brasil, como vem se posicionando neste assunto?

Em outro artigo da série xeque-mate eu fiz a seguinte menção: “Segundo dados do Bacen em maio de 2019 o Brasil possuía reservas US$ 388,09 bilhões, o que vem se mantendo em patamar semelhante a sete anos consecutivos, uma vez que em maio de 2012 nossas reservas eram de US$ 373,91 bilhões. Esta reserva atual é considerada por muitos economistas como elevada e confortável, uma vez que se considerarmos o PIB brasileiro, dá uma sensação de segurança em função do seu montante. Entretanto, além de quantidade deve ser considerada a qualidade dos ativos, vez que poderíamos vê-la como segura, não fosse pela natureza da sua composição. Surpreendentemente destes US$ 388,09 bilhões temos US$ 363,32 bilhões em títulos e somente US$ 7,98 bilhões em moedas estrangeiras, ou seja, 93,62% das nossas reservas são títulos, o que é uma exposição muito acima dos demais países! Não bastasse a vulnerabilidade óbvia é um péssimo negócio financeiro, pois em 2018 pagamos, em média, 9,5% a.a. sobre os títulos brasileiros que financiam a dívida pública, emitidos para 5 anos, e recebemos 3% a.a pelos títulos norte-americanos que compramos, emitidos para o mesmo prazo. Para deixar mais clara a frágil situação, que é contrária a estratégia dos demais países que mostrei, a participação do ouro nas reservas brasileiras é de insignificantes US$ 3,05 bilhões, ou seja, 0,79% do total”.

Numa crise global, de acentuado aspecto de liquidez, se os emissores dos papeis que mantemos em nossas reservas virarem para o Brasil e disserem que precisam dilatar o prazo do vencimento devido a crise, ou que simplesmente não podem honrá-los, o que o Brasil faria? Qual instrumento de pressão ele tem para forçá-los? Óbvio que nenhum.

A governo estadunidense, que tem informações de qualidade de suas agências de inteligência, parece estar se preparando para possíveis distúrbios. O Exército dos EUA inundou os céus de Washington D.C. em 22 de julho de 2019 com helicópteros de combate fortemente armados, tendo também apoio em terra, num exercício militar para proteger prédios federais sem prazo para término, talvez prevendo um possível agravamento da situação interna dos EUA – https://www.bloomberg.com/. O Congresso dos EUA aprovou uma lei (H.R. 6566) que obriga a FEMA (Federal Emergency Management Agency) a preparar-se para um “planejamento de morte em massa” enquanto os cemitérios e funerárias estiverem lotados pela consequência de um “atentado terrorista”, “desastres naturais” ou “outro tipo de crise”.

A torre quer “rocar” com o rei antes do xeque para proteger também a rainha.

O Rei, mais experiente, percebe que está chegando a hora de sacrificar a rainha inocente para chegar ao mate. Ele e o Jogador são prudentes como a serpente. Observam os movimentos e as peças serem postas em posições estratégicas, aguardando pacientemente a hora do “mate”.

Trump e Bolsonaro, dentre outros como na Itália, foram “surpreendentemente” galgados a cadeira que hoje ocupam. Talvez eles tenham sido postos ali com a finalidade de, ao final, pagar a conta. Alguém terá de pagar a dívida/bolha que vem se acumulando. Depois do “mate” alguém tem de levar a culpa.

Todo jogo acaba ou muda de fase. Crie a situação, espere a reação e ofereça a solução. O xeque-mate se aproxima.

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*Luiz Antonio Peixoto Valle é professor e administrador de empresas.

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