Quando Luiz Otávio (nome fictício) entrou para a lista de casos suspeitos de infecção pelo novo coronavírus em Cuiabá, ele já sabia que passaria um tempo sem ver os filhos. O limite tênue entre o isolamento social e o que a lei brasileira define como alienação parental, no entanto, está prestes a obrigá-lo a travar mais uma batalha, dessa vez na Justiça.
Desde que a quarentena voluntária teve início na Capital – há aproximadamente três semanas –, Luiz Otávio só viu os filhos por vídeo-chamada uma vez. A alegação de sua ex-esposa é que a internet que ela possui tem sido usada para fins profissionais e, por isso, só ligações telefônicas convencionais têm sido atendidas por ela.
O problema, segundo Luiz Otávio, que é uma das crianças tem apenas 2 anos de idade, o que praticamente inviabiliza uma comunicação entre pai e filho exclusivamente por telefone.
Uma situação completamente nova e que revela mais uma das inseguranças jurídicas no mundo em pandemia, segundo a presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT), Marina Faiad.
“Existe o medo do detentor da guarda dessa criança na visitação e isso tem que ser compreendido. Ninguém sabe exatamente que cuidados a outra pessoa tomou. Então, numa situação de pais separados, o ideal é priorizar o bom senso. O problema é que, quando se chega ao nível de brigar na Justiça, é porque já não existe bom senso há algum tempo”, analisa a advogada.
O abismo entre alegar e provar
Segundo Marina Faiad, impedir uma comunicação virtual pode, sim, ser considerado um caso de alienação parental, mas ela ressalta que, como tudo no Direto, é preciso ter provas e essa é a parte mais difícil.
“É possível dizer que uma das partes usou o argumento da pandemia para impedir a outra de ter acesso aos filhos, mas não é fácil provar”.
Luiz Otávio tem um histórico de batalhas judiciais desde o divórcio. A guarda das crianças – uma tem 2 anos e outra 8 – ainda não foi definida, mas uma decisão liminar já o autorizava a ter acesso aos filhos nos fins de semana.
Antes disso, segundo ele, a ex-esposa já criava dificuldades para ele ver os filhos.
A liminar resolveu a situação, mas o coronavírus colocou mais um empecilho no caminho. Além de Luiz Otávio ser um dos casos suspeitos da doença, a avó materna das crianças – que está no grupo de risco por ser idosa – mora na mesma casa que elas.
Por conta disso, o pai sequer cogita a possibilidade de ver os filhos pessoalmente até o problema de saúde ser resolvido no país.
“Mas, hipoteticamente, se a quarentena durar 90 dias, não vou poder ver meus filhos durante três meses?”, ele questiona.
De acordo com a Lei 12.318 de 2010, a alienação parental é o ato de “interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”.