O duelo é uma instituição antiqüíssima e que já foi seguidamente instigada, protegida, tolerada, desestimulada e combatida pelos Estados. Sobre sua antigüidade, a Ilíada, de Homero, registra vários duelos, dentre os quais aqueles entre Páris vs. Menelau e Heitor vs. Aquiles; não custa lembrar que a obra teria sido escrita 750 antes de Cristo, mas o enredo remontaria em sua fase oral a 1.200 anos antes de Cristo.

A idéia consensual no Ocidente acerca do duelo após o século XV, apesar de algumas alterações conforme o tempo e o lugar, é bastante objetiva: após uma grave ofensa à honra, o ofendido tem a possibilidade de desafiar o ofensor para um combate a dois para fins de limpar sua honra e punir aquele que a maculou, tutelado por regras claras e rígidas e com o acompanhamento de pessoas para “controlar” o episódio. O duelo também pode se aplicar para sanar uma injustiça sofrida por si ou outrem ou readquirir a respeitabilidade perdida diante de imprecações alheias.

Por isso, o duelo “moderno” não é o literariamente famoso “julgamento por combate”, mas uma prática com duas partes em defesa – sobretudo – de sua honra, respeitabilidade ou em função de uma injustiça privada sofrida.

Aqui cabe uma distinção: o duelo, devido às suas regras rígidas e cavalheirescas, é tipicamente legado a um estrato social e cultural elevado; já os estratos mais baixos detêm um “duelo rústico” com regras, digamos, mais flexíveis e menores formalidades (assim como uma gama maior de razões que podem levar a tal combate). Outrossim, não se entende cabível que pessoas de substratos diferentes possam “se ofender” reciprocamente por terem bases axiológicas absolutamente diversas.

Superadas estas breves considerações necessárias, outro dia me peguei pensando na geração de pessoas choronas e chorosas que se ofendem com tudo e todos (comumente muitos “millennials”, mas não só eles), e que, uma vez se julgando [falsamente] “ofendidos”, iniciam imprecações desairosas a quem supostamente o “ofendeu” buscando ofendê-lo de verdade, invariavelmente chegando-se ao clássico xingamento “fascista!”.

O chorão, de forma presumivelmente histérica, acha que foi ofendido. Logo, isso lhe concederia um direito absoluto de ofender “de facto” e sem senso de proporção a pessoa que o teria “ofendido” com determinada idéia. Em verdade, na primeira etapa desse processo de “ofensas” (a sofrida pelo histérico) deve ser considerado o verbo “magoar” as sensíveis susceptibilidades, e não o verbo ofender… mas, adiante.

Imagine se cada pesada ofensa lançada pelo chorão (lançada unicamente por ele não concordar com a opinião do outro) pudesse ser levada às raias dos tribunais, como é hoje, mas, de outro viés, pudesse também gerar um desafio em forma de duelo: decente, leal, franco e direto; com regras claras, padrinhos de ambos lados a postos e tendo a honra pessoal como meta? Será que haveria tanta gente se julgando “ofendida” com o se dizer, por exemplo, de que só existem dois gêneros? Que homens e mulheres são biologicamente diferentes? Que a ideologia de gênero é nefasta? Que não existe “gap” salarial entre homens e mulheres? Que existe doutrinação ideológica nas escolas? Que a esquerda é totalitária? Que o comunismo mata?

Ainda não amadureci a idéia a ponto de me tornar um defensor dos duelos como sou, por exemplo, de outras questões extremamente impopulares hoje em dia, como a tourada típica tanto em Portugal quanto em Espanha (e quando digo isso, o digo restrito a estes lugares e por razões éticas, sociais, culturais, históricas, antropológicas, econômicas entre outras).

Todavia, tornando aos duelos, me pergunto: se a pessoa tivesse que sempre provar o que fala ou arcar com conseqüências diretas e literalmente vitais de um duelo, seria ela tão boquirrota? Ela se “ofenderia” com tanta facilidade a ponto de realmente ofender o outro em sua honra? Não seria hoje, enfim, a possibilidade de um duelo, ironicamente, uma maneira de pacificar a sociedade? Apenas uma conjectura.

* Fernando Henrique Leitão é advogado e membro do Instituto Caminho da Liberdade – ICL-MT.

 

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