Judiciário

“Não podemos nivelar por baixo, só porque alguns não passam”, diz Fábio Capilé

5 minutos de leitura
“Não podemos nivelar por baixo, só porque alguns não passam”, diz Fábio Capilé
Presidente do Iamat, Fábio Capilé (Foto: Reprodução)

Um projeto de lei apresentado pelo deputado federal José Medeiros (Podemos), no início do mês, reacendeu uma discussão importante quanto ao futuro de universitários e profissionais do Direito no Brasil. A ideia, se aprovada pelos parlamentares e senadores, deverá por fim ao exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Para o advogado Fábio Capilé, presidente do Instituto dos Advogados de Mato Grosso (Iamat), o verdadeiro debate, porém, deveria ser em torno da qualidade do ensino oferecido aos acadêmicos.

Esta não é a primeira vez que tentam extinguir a obrigatoriedade do exame da OAB para a atuação como advogado. O presidente Jair Bolsonaro (PSL), quando deputado federal, também apresentou, em 2007, o projeto, justificando que o exame seria inconstitucional, já que apenas as faculdades de ensino superior poderiam qualificar os alunos. No entanto, o documento foi arquivado no fim da legislatura.

Para Capilé, o único ponto acertado no projeto é quanto ao papel do Ministério da Educação (MEC) em fiscalizar as universidades e cobrar a qualidade de ensino. Longe de ser a realidade, a fiscalização de instituições de ensino acaba sendo feitas pela própria OAB, que já se manifestou contrária à proposta, considerando a baixa qualidade no ensino.

[featured_paragraph]“O exame da ordem é um teste seletivo que é adotado em todo o país, está longe de ser o ideal, mas é muito eficaz. Não é ele em si que é eficaz, mas os reflexos que o exame traz em um acadêmico. Hoje, o acadêmico já entra no vestibular pensando no exame da Ordem. Então, ele já tem uma consciência de que ele não está ali apenas para pegar um canudo”.[/featured_paragraph]

Segundo o presidente do Iamat, com a tradição dos exames, os universitários já entenderiam que precisam se ajustar a uma qualidade padrão para serem inseridos no mercado de trabalho após a conclusão do curso. Conforme dados da comissão de ensino jurídico da OAB-MT, anualmente, cerca de quatro mil estudantes se formam em Direito apenas em Mato Grosso. Nem metade consegue passar no exame.

“Hoje nós temos cursos semi-presenciais, cursos por correspondência. Essas mesmas pessoas, em pé de igualdade, vão fazer o exame. É só olhar estatísticas, quase todo mundo de faculdade qualificada passa. Você não pode querer nivelar por baixo. Você não pode querer, a pretexto de que uns não passam, penalizar toda a sociedade, em decorrência da incapacidade que essas pessoas têm de transpor o exame de Ordem”, pontuou.

Qualidade x investimento

Como professor universitário durante anos, Capilé teceu críticas ao sistema do Ministério da Educação em fiscalizar a qualidade do ensino nas faculdades, principalmente as de Direito. Para ele, as negociações políticas e favorecimentos pessoais estariam interferindo diretamente no resultado final da educação: jovens sem a qualificação necessária para enfrentarem o mercado de trabalho.

Para Capilé, um dos pilares da equação é o investimento feito com profissionais e alunos. Segundo o advogado, as instituições estariam a mercê de um “capitalismo selvagem”, no qual fazer as vontades dos estudantes é a ordem.

[featured_paragraph]“Se o universitário fala que não quer ter aula, não tem aula. Se ele não tem tempo para fazer faculdade, vamos colocar aula à distância. Se ele quer facilidades, vamos dar facilidades. A instituição não se preocupa em dar disciplina, conteúdo, mas fazer suas vontades como uma forma de atrativo deles”.[/featured_paragraph]

O presidente do Iamat também acredita que o projeto apresentado por Medeiros não deverá ter andamento, uma vez que foi recebido de forma negativa em todo o país. Para ele, trata-se de “um projeto sem pé nem cabeça”, que teria finalidade política, visando, apenas, tumultuar. Apesar disso, Capilé garantiu que o assunto deve entrar na pauta do Colégio de Presidentes dos dos Institutos de Advogados.

“Quando você assina uma procuração, você praticamente entrega a sua vida para o advogado. E um advogado sem qualificação não consegue sequer conversar com a própria Justiça”, finalizou.

Muito aluno, pouca vaga

A falta de critérios das universidades também preocupa o presidente da comissão de ensino jurídico da OAB-MT, José do Patrocínio. Segundo o advogado, a maioria das faculdades funcionam, hoje, com parecer desfavorável das OABs em Mato Grosso e Federal. Apesar disso, recebem aval do Ministério da Educação para continuarem funcionando. Recentemente, premiação da OAB revelou que apenas três das 35 instituições cadastradas no MEC ofertam a qualidade necessária para os alunos de Direito.

[featured_paragraph]“O exame ainda é o único filtro existente para você forçar o acadêmico a estudar. Pelo menos conhecer o básico para poder postular em nome do cidadão e da cidadã”, afirmou Patrocínio. Em todo o país, mais de 1,5 mil faculdades de Direito estão licenciadas pelo Ministério da Educação. Com isso, são mais de 44 mil vagas anuais. [/featured_paragraph]

Presidente da OAB nacional, Claudio Lamachia também se preocupa com a qualidade do ensino passado aos futuros juristas. Segundo ele, a abertura de novas vagas anualmente passa “uma falsa impressão de avanço social”, quando, na realidade, trata-se de “milhares de jovens estudantes e famílias inteiras lesadas pela baixíssima qualidade de cursos criados sem levar em conta critérios básicos como a necessidade social e a estrutura mínima para receber os discentes”.

Lamachia também observou que o mercado de trabalho também não consegue absorver o número de profissionais que se formam a cada ano. Por isso, o Conselho Federal da OAB solicitou ao MEC, no fim de janeiro, a suspensão das autorizações para o funcionamento de novos cursos jurídicos por pelo menos cinco anos. Se aceita, a medida deve ser válida para todo o país. O MEC ainda não se posicionou quanto ao assunto.

Leia também: Universitários não se sentem prontos para o mercado de trabalho

Use este espaço apenas para a comunicação de erros




Como você se sentiu com essa matéria?
Indignado
0
Indignado
Indiferente
0
Indiferente
Feliz
0
Feliz
Surpreso
0
Surpreso
Triste
0
Triste
Inspirado
0
Inspirado

Principais Manchetes