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Marcos Faleiros: audiências de custódia podem interromper carreiras criminosas

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Marcos Faleiros: audiências de custódia podem interromper carreiras criminosas
(Foto:Ednilson Aguiar/ O Livre)

De 24 de julho de 2015, data em que o procedimento foi implantado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), até 31 de dezembro de 2018, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso já realizou 11.871 audiências de custódia.

O procedimento é avaliado pelo juiz da 11ª Vara Criminal, Marcos Faleiros, como um avanço positivo para o marco civilizatório do país e a humanização da Justiça.

“Os índices mostram que estamos evitando prisões ilegais ou desnecessárias, garantindo os direitos fundamentais desses cidadãos”, afirma o juiz Marcos Faleiros.

Só no ano passado foram realizadas 3.417 audiências de custódia em Cuiabá, o que dá uma média de 15 audiências por dia. De todos que passaram por audiência de custódia 39% tiveram o flagrante convertido em prisão preventiva, 61% tiveram a liberdade concedida, sendo que destes, 30,82% tiveram encaminhamento assistencial.

Para o juiz, a maioria dos casos de soltura imediata tem desfecho feliz, uma vez que o índice de reingresso dos presos em flagrante que foram soltos é de 14%.

“E a soltura imediata evita que pessoas que estão começando no crime entrem em contato com as facções criminosas ávidas em recrutar mais integrantes para cometer crimes”, avalia.

“E por consequência, serão necessários mais juízes, mais policiais, mais cadeias. Haverá apenas mais presos e mais gastos públicos. Precisamos é de políticas sérias e científicas de controle da criminalidade”.

Ele dá como exemplo, pessoas “de mente fraca e sem personalidade” que ao cometerem um crime, ao invés de um promissor reingresso na sociedade após a prisão, com o encarceramento terão somente o incremento e a consolidação dessa pessoa na criminalidade ao ser treinada pelas facções dentro dos presídios, trazendo uma lógica adversa e colateral do Estado estar patrocinando o recrutamento de bandidos”, explica.

“Assim como o médico não pode usar um único remédio para todas as doenças, o juiz não pode usar a prisão para todos os tipos de delitos que aconteçam na sociedade, que dispõe de ilimitado número de medidas, além prisão, para aplicar no caso concreto”.

Confira as cinco perguntas feitas pelo LIVRE ao juiz.

1 – Escutamos muito falar sobre as audiências de custódia no caso de acidentes de trânsito. Em quais outras situações elas ocorrem?

Marcos Faleiros – As audiências de custódia em geral, abrangem os crimes de trânsito, e devem ser realizadas nos casos em que o flagrado é recolhido à prisão pela autoridade policial. Caso seja arbitrada a fiança pelo delegado (pena máxima não ultrapassa quatro anos) ou em situações de termo circunstanciado, não há recolhimento à prisão, portanto dispensam-se as audiências de custódia.

2 – O que o senhor diria às pessoas que costumam dizer que a “polícia prende e os juízes soltam”?

Marcos Faleiros – Qualquer do povo poderá e os policiais deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Ou seja, é obrigação da polícia prender e, inclusive qualquer pessoa pode, se quiser, efetivar a prisão de pessoas que cometem crimes. Pela Constituição, todavia, caberá ao juiz analisar a legalidade dessa prisão e a sua necessidade, à luz de normas feitas pelos deputados e senadores, que consideram a prisão provisória uma exceção.

Assim, a polícia, como órgão persecutório, deve prender, e o juiz, como guardião da Constituição e das leis, soltará, caso o flagrado tenha direito. Soltar é uma medida impopular, porém nada de anormal, porque o juiz não é eleito e nem é representante do povo.

O juiz é representante da Constituição e garantidor do Estado Democrático de Direito, não podendo ficar vinculado à pressão popular em seus julgamentos. Se o povo quiser alterar a lei e maior encarceramento, deve cobrar uma posição diferente dos deputados e senadores que eles elegeram para fazer as leis.

3 – De que maneira a sociedade é beneficiada com as audiências de custódia?

Marcos Faleiros – Padronização do Direito brasileiro ao que já é aplicado ao resto do mundo civilizado, como por exemplo, nos Estados Unidos: coibição de tortura, tratamento desumano, cruel ou degradante. Ao ser ouvido imediatamente pelo juiz, haverá mais elementos para analisar se a pessoa deve ficar presa ou não. As audiências de custódia representam implementação das medidas de desencarceramento, alternativas penais à prisão e especialmente, interrupção de carreiras criminosas, quando o juiz evita um desviante primário de entrar em contato com delinquentes institucionalizados.

4 – E o que o senhor diria às pessoas que se utilizam da máxima de que “bandido bom é bandido morto”?

Marcos Faleiros – Essa medida criminal vem sendo usada há pelo menos por 4.000 anos, escrita no Código de Hamurabi, que se baseia na Lei de Talião, “olho por olho, dente por dente”. Durante esse longo espaço de tempo a premissa “bandido bom é bandido morto” – essência do Código de Hamurabi – não apresentou nenhum resultado prático no controle da criminalidade em nenhuma das milhares de civilizações que a utilizou como paradigma.

Trata-se de um populismo penal midiático que não ajuda a segurança pública, servindo tão somente para eleger políticos oportunistas que se aproveitam da boa-fé do povo e de uma situação de insegurança, a exemplo de Luiz Carlos Alborghetti, deputado por vários mandatos que tinha um discurso superficial e em absolutamente nada contribuiu no contexto do controle da criminalidade.

Acreditamos em meios mais modernos, científicos e eficazes no controle da criminalidade do que essa máxima talhada há milhares de anos num pedaço de pedra.

5 – Quais são as medidas mais utilizadas nas audiências de custódia?

Marcos Faleiros – Além da prisão, cautelares alternativas, tais como tratamento de entorpecentes, proibição de frequentar determinados lugares, afastamento de pessoas, monitoração eletrônica e botão do pânico [uma espécie de aplicativo com GPS e gravação de conversa utilizado para combater a violência doméstica].

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