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Jardim das Américas: casas à venda são ocupadas por usuários de drogas

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Jardim das Américas: casas à venda são ocupadas por usuários de drogas
Nem mesmo as janelas da casa foram poupadas pelos invasores (Foto: Ednilson Aguiar/O Livre)

Usuários de drogas fazem um verdadeiro desmonte nas casas desocupadas do Jardim das Américas, área nobre de Cuiabá. Eles carregam objetos, materiais de acabamento já instalados, pedras e até mesmo janelas e portas de madeira maciça e blindex.

Assim que é finalizado o trabalho de retirada das coisas de valor, o esqueleto do imóvel passa a ser abrigo. Em alguns locais, como na rua Bogotá, uma unidade chegou a ter 30 moradores de rua de uma só vez.

Por essa razão, os moradores que permanecem no bairro verbalizam o interesse em mudar e sempre usam como argumento histórias vivenciadas por eles e pelos vizinhos.

Janete Zewes está se organizando para mudar por causa da violência. (Foto: Ednilson Aguiar/O Livre)

Entre eles está a pecuarista Janete Zewes. Ela diz que está vendendo uma propriedade no Paraná para adquirir uma casa em condomínio fechado em Cuiabá.

“Minha casa é como eu sonhava. Estou há 30 anos no bairro e, hoje, eu e meu filho já decidimos que é perigoso ficar”.

Investimento

Na tentativa de garantir a segurança, Janete investiu alto. Colocou cerca elétrica, câmeras de segurança e automatizou os portões, mas tudo em vão.

“Eles entram quando querem. Hoje, estou pensando em contratar um serviço de segurança pelo menos para garantir minha entrada e saída, momento que me sinto mais exposta”.

Janete conta que todos os vizinhos dela, da rua Managuá, passaram algum tipo de situação de roubo e furto, alguns mais de uma vez.

A última vítima da rua foi uma mulher que é fisioterapeuta. Ela atende as clientes no fundo de casa e quando estava trabalhando, os criminosos pularam o muro, trancaram a porta do corredor (tirando o acesso do consultório para casa) e fizeram um verdadeiro “limpa”.

“Enquanto estava no consultório, eles reviravam todos os quartos. Levaram o que puderam carregar”.

E, quando querem se esconder, ficam entocados nos casarões abandonados, como um residência localizada nos arredores da igreja do bairro e que está a venda.

A reportagem do Livre esteve no local e constatou a situação. A porta principal, de madeira maciça, foi arrancada e mesmo com os portões soldados, é possível ver a movimentação no interior da residência.

No limite

O juiz aposentado José Clecino do Amaral e a esposa dele, Cleusa Correa do Amaral, já não sabem mais o que fazer. Eles moram na rua Bogotá, perto do entroncamento com a Miguel Sutil.

Devido as invasões contantes, a casa virou uma espécie de prisão. Os muros precisaram ser elevados e acompanhados de cercas elétricas e concertinas.

Os usuários de drogas já entraram por 3 vezes na casa dele e em todas, pularam o muro dos fundos e foram em direção do freezer.

“Eles pegavam tudo que estava armazenado e jogavam sobre o muro. Frango, carne e até pequi congelado”, conta Cleusa.

Conforme o casal, todos ficam escondidos nas duas casas abandonadas da rua. Uma delas, a proprietária foi embora depois de uma tentativa de assalto à mão armada.

“Houve reação e na época um tiroteio. Todos ficamos assustados”.

A outra foi simplesmente deixada de lado pelo dono e quem paga para limpar o mato e tirar o lixo periodicamente é Amaral.

“Fica uma fedentina porque eles pegam o lixo da casa das pessoas e reviram aí dentro. Eles querem achar alguma coisa para vender e catar a comida que jogamos fora”.

Caso de saúde pública

Ao mesmo tempo que a situação incomoda o casal, ambos defendem que é uma questão de saúde pública. Os ocupantes da casa são visivelmente debilitados e magros ao extremo.

“Quando posso, deixo uma comida para eles. Mas, não posso e nem tenho condições de alimentar todos. E, na minha opinião, quem devia tomar providência era a prefeitura, por meio do núcleo de bem estar social”.

Segundo o juiz aposentado, é preciso ainda cobrar dos proprietários. Eles precisam se responsabilizar e caso seja constatado o abandono, ser  penalizado.

Enquanto a situação não se resolve, Amaral faz uma via sacra em busca de ajuda. Conta que falou pessoalmente com o coronel Leovaldo Salles, mas obteve apenas o “silêncio”.

Ele defende ainda que a situação é uma vergonha, levando em consideração que os imóveis estão a metros da casa do prefeito Emanuel Pinheiro, morador da rua La Paz, e ele também não fez nada.

“A única ajuda que temos é do delegado Vitor Hugo da DRE, que fica aqui no bairro. Ele já entrou aí e viu a situação. Na época, eles tinham cama, sofá e estavam usando a energia roubada da minha casa”.

A equipe da DRE retirou as pessoas do local para que o morador promovesse a limpeza com dinheiro do próprio bolso.

Na ocasião, foram retirados montanhas de lixo e mobílias velhas.

No ponto de ônibus

Outra localização favorável para os roubos são os pontos de ônibus que ficam nas margens da avenida Fernando Correa da Costa. A dona de casa Cleide Catarina de Lima diz que é um perigo ficar no local.

Grupos de rapazes, conhecidos popularmente como trombadinhas, circulam pela calçada e esperam o momento certo de agir.

Cleide Catarina diz que ladrões aproveitam-se de quem está distraído (Foto: Ednilson Aguiar/O Livre)

Ela mesmo já presenciou uma menina tendo o celular arrancado das mãos.

“Quando eles percebem que a pessoa está distraída, passam correndo e puxam celulares, bolsas e qualquer outro objeto que possa ter valor”.

Quanto à segurança, a dona de casa diz que a polícia nunca aparece, nem sequer para intimidá-los.

Polícia Militar

Segundo o comandante do 1º Batalhão da Polícia Militar, tenente-coronel Marcos Antonio Guimarães, desde o começo do ano, foram registrados 21 furtos e 5 roubos a residências no bairro Jardim das Américas, o que não é considerado um número muito alto.

Ele lembra que os policiais trabalham baseado nas estatísticas e caso a incidência esteja alta, os casos não são registrados pelo cidadão, o que prejudica as ações.

Com relação aos usuários de drogas e moradores de rua, Guimarães conta que está tentando agendar uma reunião com todos os atores envolvidos na questão como prefeitura, Defensoria Pública e Ministério Público.

A ideia é conseguir montar um plano de ação.

“Fazemos o que nos cabe. Paramos e fazemos as checagens. Prendemos em alguns casos. Mas, o problema é que esta população tem uma rotatividade muito alta e na maior parte dos casos, é formada por viciados”.

A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Cuiabá que não quis comentar o assunto. O espaço continua aberto.

Prefeitura de Cuiabá

A prefeitura de Cuiabá, por meio da Secretaria Municipal de Ordem Pública, informou que a Segurança Pública é uma responsabilidade do Governo do Estado e que há uma parceria entre Município e Estado apenas em locais públicos municipais.

Com relação aos moradores de rua, a Secretaria de Assistência Social informou, por meio de nota, que faz trabalho constante com este público. Disponibilizou ainda um telefone para denúncias e apontamentos, (65) 99238-7552.

Lei as notas na íntegra:

Ordem pública –

Sobre a demanda do morador do bairro Jardim das Américas, a Secretaria Municipal de Ordem Pública esclarece que:

– A Segurança Pública é uma responsabilidade do Governo do Estado. A Prefeitura de Cuiabá, em parceria com o Estado, realiza por meio da Secretaria Municipal de Ordem Pública, a segurança de logradouros públicos municipais, como de praças, unidades educacionais e parques;

– A pasta realiza patrulhamento ostensivo e rotineiro nessas áreas para a segurança dos frequentadores;

– Porém, a secretaria não possui estrutura para policiamento preventivo ou repressivo nos bairros.

Assistência Social – 

A Secretaria Municipal de Assistência Social e Desenvolvimento Humano informa que existe uma dinâmica de trabalho e abordagem aos moradores em situação de rua, onde eles são convidados a se dirigirem a uma das unidades de referência para cadastramento nos programas sociais ou os encaminhamentos necessários. O que acontece é que muitos chegam aos albergues, tomam banho, fazem as refeições, mas retornam para as ruas. A maior parte deles prefere continuar como estão.

Ainda assim, existe um telefone disponível para solicitar a visita da equipe, que funciona como canal de comunicação e facilitador deste serviço. Por meio do telefone celular (65) 9 9238-7552, as pessoas podem fazer as denúncias e ou apontamentos, para que as equipes realizem a abordagem, com orientação correta de atendimentos à população em situação de rua. O canal funciona de domingo a domingo, até às 22h.

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