Sem documentos e dinheiro para pagar aluguel, a aposentada Deusa Evanil de Oliveira, 64, não consegue explicar com lucidez como foi parar na rua. Ela mora ao lado da ponte sobre o Rio Coxipó, na Avenida Fernando Correa da Costa, em Cuiabá, onde passam diariamente milhares de pessoas.
Primeiro, fez um barraco com lençóis, usando o obelisco de inauguração da estrutura, no acesso de pedestres.
Agora, está em um cubículo de dois metros por um, ao lado de um terreno baldio.
Paredes de tijolo de arrimo – restos da construção do viaduto da Beira Rio, que foi interrompida – e uma lona que serviu de telhado formaram a segunda morada da mulher.
Por mais precária que pareça, ainda consegue ser melhor que a anterior, que foi queimada por uma pessoa não identificada.
“Eu tinha saído um pouco para pegar uma água gelada no cartório. Quando atravessei a rua, vi as chamas e o barraco pegando fogo”.
Ela conta que os alunos de uma autoescola, que fica ao lado, viram uma mulher de vestido longo se aproximar e atear fogo na “casa”.
As chamas consumiram o pouco do que Deusa possuía, incluindo uns poucos documentos que restavam e o cartão de transporte.
Rotina
Materiais recicláveis e roupas velhas estão armazenadas no barraco onde mora Deusa.
“Eu acho roupas boazinhas jogadas e lavo para dar para o pessoal que mora na beira do rio. Tem uns quatro por aí. Eles ficam no chão seco porque não têm como cobrir”.
A rotina dela se divide entre as roupas, catar recicláveis, ir nos estabelecimentos que lhe permitem pegar água gelada e esperar alguma doação de comida.
“Tem dia como, outros dias não. Mas está tendo bastante manga, então não passo fome”.
Trajetória
Por histórias desencontradas, Deusa tenta contar a sua vida. Relata que trabalhava como auxiliar de serviços gerais no Hospital Júlio Müller e lá conheceu o ex-marido.
Com o homem, foi casada 10 anos e, um dia, abandonada.
No último dia dele em casa os dois tiveram uma discussão e ele a jogou sobre caixas de som.
“Não consegui levantar e ele me carregou e me jogou na cama. Depois disso não o vi mais”.
Quando questionada sobre onde morava, sabe apenas dizer que era no Pedra 90. Que saiu de lá por não ter como pagar o aluguel.
Fala ainda que precisa renovar o contrato, mas deixou dois talões de luz em aberto e perdeu a aposentadoria.
Ela teria tentado ir ao banco resolver, mas com o incêndio perdeu os documentos.
“Só, do meu jeito”
Deusa diz que a filha está desaparecida e não quer ver nenhum dos parentes.
“Eu quero ficar sozinha e do meu jeito. Já não tenho sonho. Se eu morrer, pronto”.