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Historiadores desmentem mitos sobre restos mortais de fundadores de Cuiabá

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Historiadores desmentem mitos sobre restos mortais de fundadores de Cuiabá
Foto DIvulgação

O historiador Paulo Pitaluga não tem boas memórias de Dom Orlando Chaves “Eu deixei meu ódio por ele no freezer para nunca mais acabar”, vocifera. Apontado como um dos responsáveis pela mentira sobre os restos mortais de Pascoal Moreira Cabral e Miguel Sutil de Oliveira, o clérigo é para Pitaluga o que uma persona non grata seria para a Igreja Católica.

Ao completar 299 anos neste domingo (08), Cuiabá ainda permanece preservando o mito de que seus fundadores foram devidamente reconhecidos e homenageados após a morte. É que, ao contrário do que diz a Igreja, historiadores cuiabanos sustentam que nem o corpo de Pascoal Moreira Cabral nem o de Miguel Sutil de Oliveira estão na cripta da catedral do Nosso Senhor Bom Jesus.

Além de Pitaluga, um dos primeiros a constatar isso foi o ex-presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IGHMT), Luís-Philippe Pereira Leite. Apesar de cego, o historiador foi o responsável pela coordenação da polêmica reforma da Matriz, quando as autoridades cuiabanas teriam resgatado de Sorocoba os restos mortais de Miguel Sutil de Oliveira.

Por conta do cargo burocrático, Pereira Leite teve acesso as cartas trocadas entre Dom Orlando Chaves e Dom José Melhado Campos. Os documentos comprovam que nem mesmo os sorocabanos sabiam o local exato do corpo do bandeirante. Sepultado na igreja de Nossa Senhora da Ponte, na cidade paulista, os restos de Sutil perderam-se nas sucessivas reformas a que a basílica foi submetida. Na falta do cadáver, o padre fez uma sugestão curiosa:

“Retiraríamos de baixo do local aproximado onde deveria estar a sepultura um pouco desta boa terra sorocabana e a enviaríamos com o título ‘Terra do local onde foi sepultado Miguel Sutil’ “, escreveu Melhado em 22 de março de 1975. Dom Orlando assentiu e o punhado de terra chegou em Cuiabá como sendo o corpo decomposto do pioneiro.

Esta mentira passou a acompanhar uma segunda lorota: a de que Moreira Cabral também estava enterrado na cripta da Matriz. Acreditava-se que o bandeirante morrera em 1725 no arraial que ajudou a fundar e tinha sido enterrado no solo da catedral.

“Depois que você conta uma mentira uma vez você tem que sustentar esta mentira”, diz Paulo Pitaluga sobre a igreja. O historiador apresenta uma carta assinada pelo próprio Dom João VI informando que Cabral morrera em 1730. Pelo documento, descobriu-se que o bandeirante faleceu em uma comunidade chamada “Aterradinho do Bananal” e que seu corpo foi sepultado lá mesmo.

“Tendo realmente Pascoal Moreira Cabral falecido em seu sítio, como os registros o demonstram, ele jamais poderia ter sido sepultado na Matriz de Cuiabá, visto serem necessários 15 dias de viagem de canoa pelo rio. Sem técnicas de embalsamento não seria possível fazer isso”, constata Pitaluga em seu livro “Erros e Mitos na História de Mato Grosso”.

O historiador cego

“O doutor Luís Phillipe tinha uma memória incrível, como era cego escrevia ditando a uma de suas secretárias e a outra lia para ele”, conta o amigo e também historiador Francisco Chagas. Para ler e escrever, Luís carecia do serviço de duas secretárias que trabalhavam no cartório de sua família. Uma delas era responsável para ler para o ex-presidente do IGHMT e a outra escrevia as palavras que ele ditava. Foram elas que o ajudaram a contornar a cegueira para escrever seus 18 livros.

A história de Luís-Philippe confunde-se com a da mentira que ajudou a desmentir. Mesmo sendo responsável pela reforma da Matriz em 1975, Pereira Leite era contrário à demolição e defendia que ela fosse restaurada conservando as características originais. Sua convicção esbarrou em Dom Orlando Chaves, partidário de por a igreja à baixo.

“O Luís-Phillipe me dizia que havia arquitetos e engenheiros em Cuiabá que queriam refazer a igreja do jeitinho que ela era antes, corrigir os problemas estruturais e manter o estilo, mas o padre não deixou”, critica Paulo Pitaluga que, a exemplo de Francisco, conviveu com Luís.

A ruína da igreja contrasta com a ruína de seus fundadores. Enquanto Cabral era impedido de ser guarda-mor de Cuiabá pelo presidente da província de São Paulo, Rodrigo Cézar de Meneses, Miguel Sutil morria pobre em Sorocaba sem ter direito a música no enterro, conforme registros do seu testamento.

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