Aqui se faz e aqui se paga, diz o brasileiro, que entretanto tem o carma de pagar pelo que não fez e deseja receber pelo que não pagou.

Jaz nas profundezas da alma brasileira o gosto de ter um El Rey ou vice-rei a quem recorrer. Nos tempos atuais, El Rey e vice-reis atendem por outros nomes. E alguns são ex-presidentes. Já ordenaram muitas despesas e hoje usufruem o pagamento, em muitos casos indevido, pelo que fizeram, mas também pelo que deveriam fazer e não fizeram: a reforma da Previdência, por exemplo.

Ninguém tem ex-mãe, ex-pai, ex-filhos ou ex-avós. Não existe ex para laços sanguíneos. Só pode ter ex-mulher e ex-sogros. E todos temos ex-presidentes. Nenhum ex custa tão caro aos brasileiros quanto os ex-presidentes.

Nunca tivemos tantos ex-presidentes da República. São seis atualmente. Gastamos milhões de reais com eles que, por ordem de saída de cena são: José Sarney: ex desde 1990; Fernando Collor: ex desde 1992; Fernando Henrique Cardoso, ex desde 1º de janeiro de 2003; Luiz Inácio Lula da Silva, ex desde 1º de janeiro de 2011; Dilma Rousseff, ex desde  31 de agosto de 2016; Michel Temer, ex desde 1º de janeiro de 2019.

Fazendo as contas, apenas no ano passado a ex-presidente Dilma Rousseff custou R$ 632 mil, dos quais R$ 45,4 mil com seguro, manutenção e combustível de veículos. O segundo a gastar mais foi Collor, com R$ 306 mil. José Sarney gastou R$ 158 mil e Lula R$ 119 mil. O mais baratinho foi FHC, que custou R$ 41,3 mil.

Outros indicadores são igualmente preocupantes. Um ex-presidente foi preso na semana passada e solto depois de quatro dias, mas pesam acusações complicadas também sobre os outros, alguns dos quais já são réus.

Há mais de mil palavras em português iniciadas com ex, uma preposição que se tornou prefixo e ganhou autonomia na língua falada. O étimo de ex nos veio do Latim ex, mas já estava no Grego ek e na raiz indo-europeia eghs indicando movimento para fora, de ocultar, sair de cena.

Às vezes, está tão escondido e disfarçado  este ex, que gera controvérsias, como é o caso de explorar; de exausto, que no português perdeu o “h” inicial que tinha no Latim haustus, particípio de haurire, consumir, esgotar. Do exhaustus nada mais se obtinha, fosse pessoa, bicho ou terreno.

Explorar, do Latim explorare, também traz o ex na inicial, tendo designado originalmente clamar, gritar, seja na caça ou nas batalhas, perseguindo para abater e comer ou ferindo e matando para vencer.

O étimo principal é plorare, gritar, chorar. Este encontro “pl” mudou o som para “ch” no Português, como pluvia virou chuva, mas que conservou o étimo em índice pluviométrico, indicador das chuvas havidas em determinado tempo e em determinada região; ou o conservou, como em implorar com o significado de pedir.

O que está em causa, porém, não é a etimologia da designação ex-presidentes. É o seu custo. Ele vai ser afetado pela reforma da Previdência?

Bem, esta é uma das complexas questões que envolvem a controvérsia. Para isso, temos que escolher alguém para pôr o guizo no pescoço do gato, tal como numa das 124 fábulas do ex-seminarista francês  Jean de La Fontaine, autor de histórias em que os animais têm características humanas. Ele viveu no século XVII, era filho de um fiscal das águas e de florestas, e está sepultado ao lado de dramaturgo Molière (pseudônimo de Jean-Baptiste Poquelin) num dos cemitérios mais famosos do mundo, o Père-Lachaise, em Paris, que homenageia o padre confessor do rei Luis XIV.

Conta La Fontaine que, reunidos em assembleia, os ratos decidiram, por unanimidade, pôr um guizo no pescoço do gato para perceber quando ele se aproximasse para caçá-los. Todos tinham aprovado a proposta, mas um rato velho fez uma pergunta que travou tudo: quem vai pôr o guizo no pescoço do gato?

Até hoje, nenhum rato conseguiu. Por isso a expressão veio a designar tarefa muito difícil, quase impossível de ser feita. A leitura desta fábula pode ser útil hoje para se entender o Brasil. Dê nome aos bois, digo, aos ratos e ao gato, e teremos uma boa explicação. (xx)

 

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