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Do Sertão ao Nortão, escritora desbrava territórios e a imaginação

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Do Sertão ao Nortão, escritora desbrava territórios e a imaginação

“Maria, Maria, é um dom, uma certa magia, uma força que nos alerta, uma mulher que, merece viver e amar, como outra qualquer do planeta”, A música eternizada por Milton Nascimento, exalta a força das “marias” e pode ser utilizada para traduzir a história de uma vencedora: Maria da Paz.

Com um nome que é pura inspiração e uma história grandiosa – tímida, meio calada e com um certo desconforto em abrir sua intimidade – a jornalista e escritora tem muito a contar. As dificuldades da juventude moldaram uma mulher forte que, com otimismo e um sorriso no rosto, transformou a batalha contra uma doença implacável em apenas mais um desafio.

A propósito, desafios fazem parte da rotina da mulher “arretada” [o sotaque logo de cara revela sua origem nordestina]. Nascida no interior da Paraíba, com brilhos nos olhos vai revelando uma infância humilde, mas inspiradora.

Bonecas de espiga de milho, roupinhas confeccionadas à mão, pedras que se transformam em qualquer coisa, um grande rio que contorna sua cidade natal, Ingá (próxima a Juarez Távora Paraíba) e muitas árvores, são elementos que compõem o cenário das melhores lembranças que traz no coração.

De uma família numerosa – ela é quarta de dez irmãos – fala com carinho de uma das irmãs mais velhas que perdeu para uma febre. Sobre os pais, Maria conta que mesmo humildes, eram perspicazes e astutos. Segundo ela, sua mãe era extremamente sábia, mesmo sem ter sido alfabetizada. Seu pai, um homem muito carinhoso, pragmático e provedor também ensinou muito, principalmente pelo exemplo de luta e superação.

Mesmo com as dificuldades do dia-a-dia, na lida na roça e na falta de água que marcava o sertão, ela não vê traumas, nem mesmo tristeza. Detalha tudo com um certo sorriso nos lábios e um saudosismo dos melhores tempos.

Na juventude não tinha como ser diferente. O desejo de desbravar o mundo à levou a Universidade Federal da Paraíba. Foi lá que, bem aos poucos, foi se apaixonando pela profissão de jornalismo. Ela conta que no começo, não sabia ao certo o que era um jornalista, o que fazia e muito menos como, mas sabia que queria escrever, mover o mundo com seus pensamentos, histórias e relatos, já que para ela as letras eram muito mais mágicas, amplas e reveladoras que as palavras ditas.

“Mas é preciso ter manhã, é preciso ter graça, é preciso ter sonho sempre. Quem traz na pele essa marca, possui a estranha mania de ter fé na vida”, e nessa sequência, Milton segue desvendando nossa Maria.

Tempos depois de formada e empregada em um grande jornal da capital, nasceu mais um desejo de ousadia, “Como seria ir para um lugar onde ninguém me conhecesse?”, pensava ela, almejando ainda mais o anonimato e as aventuras que a saída do ninho lhe permitiria.

E foi aí, a partir de um ímpeto de coragem que Maria seguiu com o afrontamento da realidade e buscou o novo. Primeira parada, Fortaleza-CE. Mas não revelou à mãe seus planos de voo. “Faltou coragem para tanto, não sou rebelde, sempre fomos muito unidos”, pondera.

Lá não era tão longe assim, não tão anônimo quanto esperado. Foi quando se lembrou de uma amiga que disse qualquer coisa sobre Roraima, “Será? Vou tentar”, pensou ela.

Na segunda saída, descobriu que o destino era mesmo Cuiabá, Mato Grosso.

“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre. Quem traz no corpo a marca, Maria, Maria, mistura a dor e a alegria”, Milton segue costurando a descrição dessa história.

Com apenas uma mala com poucas roupas e grandes sonhos, Mato Grosso abraçou Maria, que finalmente se sentiu acolhida e aquecida. “Mas espera um pouco, acho que ainda não é aqui”, pensou novamente. Foi quando uma conhecida de poucos dias falou qualquer coisa sobre uma cidade chamada Sinop, “Agora está fazendo sentido para mim”, e lá se foi ela, seguindo seu forte instinto.

Não que é Maria tinha razão? Era, sim, nessa nova cidade, em um novo jornal em que construiria sua marca em uma carreira premiada e com muito reconhecimento. Como disse antes, Maria não larga o sotaque, mas é oficialmente cidadã sinopense. Fala com um orgulho e com tremendo brilho nos olhos, “mereci esse título e sou muito feliz em tê-lo”, garante.

Seguindo suas diferentes facetas, foi em Sinop que ela – junto com grandes personalidades –  fundaram a Academia Sinopense de Letras. Mas não foi ainda neste ano que se tornou imortal. Maria foi freada pelo destino ao descobrir um sério câncer de mama.

Sim, freada, não parada. Isso porque Maria não é mulher de se deixar abater, não sem luta. E ela venceu mais essa etapa que foi transformadora em sua vida, “é difícil dar de cara com a morte, a gente repensa nas nossas prioridades”, revela.

“Maria, Maria, é o som, é a cor, é o suor, é a dose mais forte e lenta, de uma gente que ri quando deve chorar, e não vive, apenas aguenta” e nessa sequência Milton segue nos contando sobre Maria.

Ainda sem deixar de surpreender, em dado momento revela um gosto pela vida noturna, algo difícil de se esperar por quem vê pela primeira vez a figura de óculos, pequenina e bastante quietinha.

Em seus assuntos de domínio, aí sim, são muitas palavras, muitas discrições. Maria é autora de livros que contam a história de mulheres e homens pioneiros, além das ficções educativas, como a saga da formiga Zaroia e agora a doce história de Juquinha, um menino que ensina a amar.

“Ele mostra que, mesmo com a deficiência física que possui, não é isso que o define”, decreta.

Na tentativa de entramos um pouco mais em sua vida pessoal, desconversando, ela revela apenas seu amor por Santinha, uma cachorrinha vira-lata e faceira. Santinha retira muitos risos nas redes sociais, onde aparecem suas aventuras narradas por Maria. A mais marcante foi mesmo na viagem ao nordeste quando, em uma discrição hilária, que revela mais uma vez o talento de Maria para narrativa, Santinha fez seu diário de viagem, com direito a confusões e mordidas na coleguinha.

Sobre as redes sociais? “Não sou tão interessante para isso, mas meu trabalho é”, fala sorrindo.

Confira na integra a musica de Milton Nascimento que nos ajudou a contar essa história:

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