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Demora na aprovação do PL 490 impede trabalho de produtores rurais na região de Brasnorte

Questão da demarcação das terras indígenas tem barrado as atividades que não podem ser desempenhadas em áreas que estão sob análise federal

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Demora na aprovação do PL 490 impede trabalho de produtores rurais na região de Brasnorte
(Foto: Karolina Grabowska / Pexels)

Há quase um ano, os produtores rurais de Brasnorte (600 km de Cuiabá) esperam pela votação do Projeto de Lei 490, criado em 2007, que prevê que a demarcação de terras indígenas será feita por meio de leis, fazendo valer, portanto, o marco temporal. Enquanto a proposta não é apreciada, os produtores seguem de mãos atadas sem poder fazer uso de suas propriedades. Uma situação que atrapalha também o desenvolvimento e a arrecadação do município.

Esse é o apontamento feito pelo vereador brasnortense Norberto Júnior (PL). Conforme o parlamentar, o município abriga três reservas indígenas já demarcadas e homologadas pela Constituição Federal de 1988, as quais ocupam uma área de 170 mil hectares e abrigam 2 mil indígenas.

Com a proposta de ampliação das terras indígenas, essa área saltaria para 517 mil hectares. “Em Piripkura, na região da divisa entre Colniza e Rondônia, são 242 mil hectares que podem resultar na criação de um nova reserva indígena para apenas dois índios homens”, diz o vereador. “Em Kawahiwa do Rio Pardo, em Colniza, dizem ter índios isolados, mas não há informações quanto a isso. Há sim, um servidor da Funai ali”, relata.

Norberto conta ainda que registrou um boletim de ocorrência contra esse servidor, por abuso de autoridade. Em janeiro, durante uma viagem, o vereador parou às margens da rodovia MT-206 e estava gravando um vídeo para demonstrar sua indignação com a situação e o servidor, junto com a Força Nacional, o abordou para evitar a gravação.

Perda de receita

Brasnorte é hoje um município que já conta com 270 mil hectares de plantação e uso na pecuária, dentre seus 1,5 milhão de hectares de área total. Esse número poderia ser ampliado, transformando a cidade em um grande pólo de produção agrícola. Porém, com as terras impedidas de produzir, o crescimento também fica emperrado e isso reflete também na receita financeira da cidade.

“Os produtores rurais estão na iminência de amargar enorme prejuízo depois de décadas de trabalho. A prefeitura também terá perda de receita estimada em mais de R$ 25 milhões por ano. Sem falar que as mais de 350 famílias que residem e trabalham nessas fazendas esbulhadas perderão seus postos de trabalho”, avalia Norberto.

Prejuízo para os dois lados

O parlamentar frisa que as propriedades têm matrículas, são escrituradas, mas perderam o licenciamento ambiental por conta dos estudos para ampliação das terras indígenas. Os proprietários não conseguem sequer pedir o desmembramento do ponto em área de estudo, para poder usar o restante.

“No Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, por exemplo, a minha propriedade é identificada como terra indígena”, diz ele, referindo-se à área indígena Myky, onde existem 150 indígenas e 120 produtores. Ali as análises para ampliação começaram em 2007 e as licenças foram canceladas em 2019.

Norberto afirma que esses estudos não foram concluídos e os grupos de trabalho realizados não contaram com a participação do Município ou de produtores.

Para evitar um maior desgaste, Norberto diz que é importante a aprovação do PL 490, um projeto proposto de 2007 pelo deputado federal por Mato Grosso Homero Pereira, falecido em 2013. Porém, 13 anos depois, ainda não foi apreciado no Plenário da Câmara dos Deputados.

Norberto avalia que os indígenas também ficam no prejuízo, pois é preciso incentivar que eles entrem na cadeia produtiva, seja por si mesmos, ou por meio de parcerias sociais. Para isso é preciso conceder o licenciamento ambiental para que possam atuar, quer seja no manejo de madeira, na mineração, hortifruti.

“Assim, esses povos indígenas sairão da tutela do governo, e deixarão de ser dependentes dos mais variados auxílios”, argumenta.

O vereador critica ainda a atuação de organizações não-governamentais e veículos midiáticos, que estimulam a desavença entre indígenas e produtores. “Quero mostrar as injustiças que ocorrem para produtores e também indígenas nesse caso”, argumenta.

Tentativas de reversão

Vereador Norberto Junior é ativista em prol da aprovação do PL 490 ( Foto: Assessoria / Sandra Costa)

O Projeto de Lei 490 propõe o fim de novas demarcações, a revisão de terras indígenas e ainda busca trazer uma solução pacificadora na situação dos garimpos e madeireiros que atuam na legalidade. Com a aprovação dessa proposta, portanto, valeria o marco temporal, ou seja, só poderão ser demarcadas as terras ocupadas antes da CF de 1988.

Instrução Normativa cancelada

Em meio a essa situação indefinida, ocorreram tentativas de permitir o uso das terras desses produtores. Norberto lembra que a Fundação Nacional do Índio (Funai) fez uma instrução normativa (IN 9), em abril de 2020, reconhecendo as terras indígenas tradicionalmente ocupadas e homologadas por decreto federal, e liberava as licenças das áreas que estão em sobreposição até a conclusão dos estudos para revisão da demarcação de terras que estão sendo realizados.

Porém, o Ministério Público Federal (MPF) judicializou e a Justiça Federal cancelou a instrução normativa.

Na Assembleia Legislativa de Mato Grosso, em 2020, tramitava um projeto de lei complementar, número 17, que dispõe sobre o Programa de Regularização Ambiental – PRA, disciplina o Cadastro Ambiental Rural – CAR, a Regularização Ambiental dos Imóveis Rurais e o Licenciamento Ambiental das Atividades poluidoras ou utilizadoras de recursos naturais; bem como dispositivo da Lei Complementar nº 233, de 21 de dezembro de 2015, que dispõe sobre a Política Florestal do Estado e dá outras providências.

“Conseguimos colocar alguns artigos da NI9, que estava judicializada, nesse projeto complementar para liberar as licenças dessas áreas no Estado de Mato Grosso. Na primeira votação, foram 13 votos a favor, vencemos o primeiro turno da votação. Porém, veio a mídia, junto com representante religioso que fez uma carta pedindo a não aprovação do projeto. A alegação é que teria “derramamento de sangue”, indigna-se o vereador.

A partir daí, foi apresentado um substitutivo do projeto retirando os artigos da NI9 e, mais vez, o produtor rural saiu perdendo.

Aguardando aprovação

Norberto conta que, a partir de 2019, começou o ativismo em Brasília, contando com o apoio do deputado federal Nelson Barbudo (PL), a PL 490 passou por todas comissões parlamentares, mas ainda não chegou para votação. “O projeto está pronto para ser votado, basta a presidência da Câmara colocar na pauta”, destaca.

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