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Cuiabá ou Babel? Imigrantes fazem da cidade um caldeirão de idiomas

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Cuiabá ou Babel? Imigrantes fazem da cidade um caldeirão de idiomas
Haitianos e senegaleses em aula de português para estrangeiros (Foto: Rafael A. Lira)

As histórias de Moustapha Gueye e Maria Emília cruzam-se em Cuiabá. Os dois são jovens imigrantes que vieram ao Brasil ajudar a família, melhorar de vida e realizar sonhos. Ambos vieram de longe, Moustapha atravessou o atlântico a partir do Senegal, sua terra natal. E Emília percorreu léguas e léguas sobre a Amazônia, saindo da cidade de Valência na Venezuela até aqui.

A imigrante de 25 anos chegou na capital mato-grossense há poucos dias. Diferente dos seus compatriotas transladados de Boa Vista, em Roraima, ela não é refugiada, veio para estudar, fará pós-graduação em Letras na UFMT. Gueye também fez o curso de Letras, mas abandonou a graduação para ajudar a mãe com as contas de casa. Abandonou também o Senegal por conta da falta de emprego e veio para o Brasil, onde trabalha há dois anos como camelô no centro histórico de Cuiabá.

“Minha mãe ficou lá, com o que ganho aqui pago metade das contas da nossa casa alugada”, diz o imigrante de 26 anos, filho único de uma mãe que tenta sobreviver no país africano. Emília trouxe a mãe consigo. Francoises Silva, 49 anos, aproveitou o intercâmbio da filha para fugir de uma Venezuela arrastada pela crise econômica e pela instabilidade política que assola o país.

“Eu vim ser uma mestre em literatura”, diz convicta Emília. Tanto ela quanto Moustapha receberam ou vão receber aulas de língua portuguesa. Emília é uma das 45 alunas do projeto Português como Língua Estrangeira (PLE) oferecido pela UFMT para alunos estrangeiros de graduação e pós-graduação.

A hospitalidade linguística também chegou até Moustapha, que aprendeu português no curso para senegaleses, ministrado pelo estudante de sociologia e técnico da Secretaria de Educação de Cuiabá, Rafael Lira, todas as terças-feiras.

“Nas nossas escolas nós temos um profissional que são os integradores, eles fazem a ligação da comunidade escolar com a comunidade imigrante”, explica a pedagoga da Secretaria de Educação, Flávia Ribeiro. Quatro escolas em Cuiabá e uma em Várzea Grande oferecem um curso da Seduc-MT. Os municípios de Sorriso, Sinop, Colíder e Cáceres também integram o projeto do governo estadual.

“São níveis diferentes na mesma sala, por isso nós tentamos uma abordagem mais individualizada”, comenta a coordenadora do PLE, Flávia Botelho Borges. O atendimento do PLE faz parte do programa Inglês Sem Fronteiras há alguns anos, quando o governo federal percebeu a necessidade de ensinar português aos intercambistas para internacionalizar as universidades brasileiras.

Na mesma moeda

Somente em 2016, a Seduc-MT já atendeu mais de 600 estudantes estrangeiros em escolas como a Levegildo de Melo e Licínio Monteiro. Na UFMT, especificamente no Instituto de Linguagens, o PLE habilitou no idioma aproximadamente 40 estudantes no ano passado. As duas ações acabam por gerar um sentimento de gratidão em muitos imigrantes.

Foi o que aconteceu com Moustapha que se dedica a ajudar brasileiros a aprender francês e inglês. Desde que chegou ao Brasil o senegalês tem um sonho: fazer com que jovens brasileiros aprendam os outros idiomas. Gueye espera conseguir uma “sala no centro” para poder oferecer as aulas que, segundo ele, seriam pagas apenas pelos maiores de 8 anos e as crianças aprenderiam de graça.

“O meu sonho é um criança brasileira de 8 anos falar inglês, português e francês. Imagina que bonito!”, exclama ele entusiasmado. “Tem vários países no mundo, mas eu escolhi vir para o Brasil, então todo meu conhecimento que aprendi na faculdade eu quero compartilhar com os brasileiros”, acrescenta o senegalês sorrindo de orelha a orelha.

O vendedor Ezequiel Júnio foi aluno de Moustapha e recebeu as lições pessoalmente e por aplicativo de mensagens. Apesar da língua materna dos senegaleses ser o wolof, todos conhecem ao menos o básico de inglês e francês. “Eles são muito inteligentes e trabalhadores, são pessoas magníficas, eles me ensinaram bastante coisa. Por falarem várias línguas encontram mais facilidade para ensinar”, conclui Júnior.

Maria Emília pensa o mesmo que Moustapha. A venezuelana pretende fazer também o doutorado no Brasil para retribuir o conhecimento adquirido atuando na cidade e, quem sabe um dia, lecionar na própria UFMT. “Espero que dê tudo certo”, suspira esperançosa ao lado da mãe.

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