Com mais de 30 milhões de cabeça de gado, Mato Grosso lidera o ranking nacional na produção de carne. Apesar da grande capacidade produtiva, a brucelose tem preocupado entidades que estão ligadas a cadeia da carne. Isso porque, ao menos 5% das fêmeas são vítimas dessa zoonose.
Em razão de impactos negativos na produtividade e barreiras sanitárias que são impostas por conta dessa doença, além do risco à saúde humana, várias entidades ligadas ao setor produtivo se uniram na Embrapa Agrossilvipastoril, na última semana, em Sinop, para fazer o lançamento da campanha de reforço na vacinação contra a brucelose.
A vacina reforço RB 51 não pretende substituir a B19, que é obrigatória. Mas tem o objetivo de reforçar a imunização do rebanho mato-grossense afim de combater, controlar e prevenir à doença no rebanho mato-grossense.
O pecuarista Wilson Antônio Martinelli, Diretor Regional da Acrimat, explica que antes não tinha uma associação entre as vacinas B19 e RB 51, e que a inserção da última é um ponta pé inicial para a erradicação da brucelose. “Hoje a associação dessas duas funcionam como um reforço”, pontua.
Ele conta que só a vacina B19 não é o suficiente para imunizar os animais, uma vez que “lida com organismos vivos, tanto a vacina como o próprio animal. Então as vacinas no geral não são 100% eficientes”.
O diretor ressaltou que a brucelose além de ser uma zoonose – que pode ser transmitida ao homem – ainda causa prejuízos imensuráveis para os criadores. “Geralmente as fêmeas que estão parindo pela primeira vez são as nossas vanguardas do melhoramento animal. São elas que a gente está aguardando para o melhoramento do nosso rebanho. E são justamente elas que perdem as suas crias”, relata.
Contudo, esse é só o início dos problemas, já que além de abortar, as matrizes (fêmeas reprodutoras) sofrem com “outras coisas decorrentes desse aborto, como: retenção de placenta, infecções e queda no sistema imune. São vários prejuízos indiretos, além do próprio aborto”, explica Martinelli.
No ponto de vista mercadológico, além da quebra na produção animal, “a carne fica vulnerável a barreiras sanitárias, diminuindo sua competitividade no comércio internacional”, relata o pecuarista.
De acordo com o analista de pecuária da Famato, Marcos Coelho de Carvalho, a aplicação da vacina B19 é obrigatória em fêmeas de 3 a 8 meses de vida. Se aplicada após esse período, o animal fica permanentemente reagente ao exame da brucelose. Ou seja, no exame vai constar que o animal possui a doença. Por outro lado, a vacina RB 51, não causa reação no exame, por isso, pode ser aplicada de mamando a caducando sem causar reações negativas.
Marcos relata que a B19 não protege 100% o rebanho. “Dependendo do jeito como é feita, chega a proteger até 60% das bezerras vacinadas”, explica. Exemplifica que se mil bezerras de uma propriedade forem vacinadas com a B19, em média, metade delas ficariam de fato protegidas. Nessa hipótese, outras 500 ficariam desprotegidas e não restaria mais o que fazer.
Contudo, se o produtor realizar uma segunda vacinação de cobertura com a RB 51, mais 50% serão protegidas. Ou seja, daquelas 500 que foram vacinadas, mas não protegidas, agora seria, ao menos, metade delas imunizadas.
O que nesse segundo cenário passaria a somar, ao menos, 800 fêmeas protegidas, o que configuraria em média 80% do rebanho imunizado.
“Por isso é importante o produtor entender que é necessário a vacinação de cobertura. É uma segunda chance que damos para essa novilha de realmente fazer a defesa contra a brucelose. Então a gente reforça a imunidade do rebanho de uma forma geral”, explica.
Carvalho destaca que o criador pode vacinar o animal adulto sem problema, pois, a vacina RB 51 não gera reação em relação ao exame. “Se você fizer a aplicação em uma vaca adulta hoje. Daqui a uma semana você pode colher o sangue dela para o exame e não vai dar reagente. Se der reagente é porque ela já está doente. Você pode fazer em um animal adulto em uma novilha”, justifica.
Brucelose bovina
O professor Daniel Moura de Aguiar, doutor em medicina veterinária explicou que a vaca brucélica normalmente não apresenta clínica, ou seja, não demonstra sinais ou sintomas de doenças. “Afeta apenas as vacas e só aparece quando estão gestante”, pontua.
Aborto, infertilidade e retenção de placenta são as consequências da infecção da bactéria no útero. “Quando a vaca está vazia, você não distingue uma da outra, então ela é uma doença silenciosa. Quando não causa aborto, a vaca vai parir animais mais fracos”, relata o especialista em doenças infecciosas.
Por se tratar de uma bactéria que se fixa dentro de células uterinas, é difícil ser diagnosticada. Por isso, precisa ser imunizada com uma vacina viva. “Com a mutação feita em laboratório a RB51 pode ser usada em animais adultos, o que ajuda a controlar a doença”, pontua.
Contaminação
O docente da UFMT ainda explica que a vaca que pari com a brucela, libera milhões de bactérias no ambiente. Com isso, outras vacas se infectam comendo o pasto. Por esse motivo é importante que haja uma identificação e separação entre os animais positivos e negativos. Isso porque “aquelas vacas que não abortarem, vão ficar jogando bactéria no ambiente toda vez que parir, esse é o problema”, disse.
O doutor ainda lembrou que por se tratar de uma zoonose, ela pode ser transmitida pelo queijo, leite e para a pessoa que lida com bovino, que ajuda fazer partos. Ressaltou que por esse motivo, ocorrem os entraves comerciais. “Ninguém quer colocar uma vaca que tem a bactéria que pode pegar em criança, na família, no tratador, dentro de seu país”, advertiu.
A ação simbólica reuniu vários representantes do setor produtivo, dentre eles: Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), Federação da Agricultura e Pecuária (Famato), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuárias (Embrapa), Fundo Emergencial de Saúde Animal (Fesa-MT), Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), Instituto de Defesa Agropecuária (Indea/MT) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa)