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Bombeiros de MT falam sobre Brumadinho: “depois que passa é que a gente sente”

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Bombeiros de MT falam sobre Brumadinho: “depois que passa é que a gente sente”
(Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Depois de 14 dias no auxílio às buscas pelos corpos das vítimas do rompimento da barragem de Brumadinho (MG), profissionais do Corpo de Bombeiros de Mato Grosso (CBM-MT) voltaram para casa, junto aos seus cães, nesta sexta-feira (12). Na data, eles realizaram a primeira alternância de equipes, em Cuiabá, já que outros três militares e dois cães retornaram para a cidade mineira, a segunda afetada por uma estrutura da Vale S.A.

“É um cenário bem triste. Nós, profissionais, evitamos pensar na dimensão da tragédia, senão a gente não trabalha. O cansaço mesmo começa hoje, a adrenalina vai diminuindo e é aí que você passa a pensar no que fez. Depois que passa é que a gente sente, mas naquele momento é foco”, avalia o sargento Everson, que comandou a equipe composta pelos soldados Lima e Luiz Carlos e suas respectivas duplas de cães Luke e Sharon.

É a primeira vez que a corporação retorna de uma missão fora do Estado. No dia 1º de abril, outra equipe de bombeiros embarcou para Moçambique. Lá, dois se juntaram a outros 18 militares da Força Nacional em socorro à população do país, afetado pelo ciclone Idai no dia 14 de março.

Sargento Everson, comandante da equipe e médico veterinário (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Os bombeiros mato-grossenses contam que a população de Brumadinho tenta se recuperar em meio a tantas perdas. “A economia de lá gira muito em torno das mineradoras. Pelo pouco que a gente anda pela cidade, a gente vê que eles estão tentando retomar a rotina. Mas muitas pessoas ainda não foram encontradas e identificadas e os familiares ainda estão sofrendo por falta de respostas”, relata o sargento.

Lá, os militares ouviram relatos de sobreviventes: o engenheiro que saiu da mina minutos dela estourar; o funcionário da Vale que, na data, se ausentou do trabalho por atestado médico; e o outro que saiu do refeitório cinco minutos antes do desastre. “Levou barro nas costas e quando olhou para trás, a lama já tinha engolido tudo. Pessoal conta que fala com ele e ele começa a tremer a boca”, conta Luiz Carlos. “As pessoas ali, se não perderam familiares, perderam amigos. Todo mundo ali perdeu alguém”, lembrou o soldado.

Nesta nova etapa, embarcam os soldados Sá e Almeida, com seus respectivos cães Kiara e Mel, para dar continuidade ao trabalho dos colegas até o próximo dia 25. A equipe será comandada pelo tenente Teodoro.

“Energias renovadas para dar continuidade ao trabalho, porque ainda há muita coisa a ser feita. A expectativa é conseguir localizar os corpos e encerrar a ocorrência para dar às famílias a oportunidade de sepultar dignamente seus entes queridos. Nós costumamos falar que bombeiros trabalham com duas metas. Salvar vidas e, quando isso não é possível, é conseguir dar paz e descanso a elas.

Soldados Lima e Luiz Carlos (Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Buscas

De acordo com os bombeiros, as buscas pelos corpos desaparecidos ganharam novo fôlego, já que que as chuvas diminuíram e a cidade está mais “seca”. Agora, o trabalho está voltado à construção de valas e drenagem dos locais mais húmidos. A pretensão, segundo os mato-grossenses, é dar 100% de resposta aos familiares, para que possam requer a seus direitos.

“Eu ainda tinha a expectativa de encontrar muitos locais com lama. Hoje já está mais seco, mas ainda tem locais inacessíveis. Lá eles usam dois tipos de retroescavadeira, as que trabalham em cima de lama e água e outra em solo firme”, o sargento Everson.

“A lama está com uma camada superior de uns 20 centímetros já seca, fendas estão se abrindo e começando a liberar o odor dos corpos desaparecidos. Uma espessura mínima de lama já abafa o cheio e dificulta às buscas. O material também, de certa forma, está ajudando a preservar os corpos. O mais difícil é reconhecer”, explica o soldado Luiz Carlos.

“Hoje pela manhã ouvi que faltam 53 corpos para serem identificados. Já tem mais de 200 fragmentos encontrados que estão esperando pelo exame de DNA. A média que eles estão trabalhando é de 8 fragmentos por pessoa. É comum ter muitos parentes mortos e podem identificar a pessoa errada. Tem família que perdeu até quatro pessoas”, complementa o soldado Lima.

(Foto: Ednilson Aguiar/ O Livre)

Rotina de trabalho e cães heróis

Atualmente, todos os cães que trabalham nas buscas em Brumadinho são de outros Estados. Isso porque os animais de Minas Gerais foram tirados de ação para ficar sob cuidados, pois muitos foram diagnosticados com a presença de metais pesados devido à contaminação da lama.

“Antes, os Estados estavam mandando equipes, mas, à essa altura, a equipe local já está bem organizados e estruturada. Mas os cães adoeceram e ficam debilitados”, explica o sargento Everson. O militar ressalta, no entanto, que os animais são muito bem cuidados.

Devido à demanda, a equipe mato-grossense ficou subordinada à coordenação do canil durante operação, dividida em quatro frentes de trabalho que atuam em diferentes áreas. Dessa forma, os binômios da CBM-MT – isto é, as duplas de soldados e cães – chegaram a encontrar 7 segmentos.

“De início, o trabalho é realizado somente com os maquinários. Quando há um indício ou odor, nós somos acionados para passar com o cão. Nessas situações o cão localiza alguns segmentos, que são partes de corpos. Quanto mais vinculo e vivência entre o soldado e o cão, a resposta é melhor”, explica o militar.

“Nós atuamos em todas as frentes. Mas fomos mais chamados em locais próximos do rompimento, onde era o refeitório, o administrativo e da pousada. É uma experiência muito grande para Mato Grosso participar uma operação tão mobilizada. Nesse momento, nos deparamos com equipes de quatro Estados. Desde o começo da mobilização, já passaram de oito a dez. Aqui a gente tem Sistema de Comando de Incidentes só no papel, lá você vê a atuação na real”, avalia.

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