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A vida não nos prepara para os finais

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A vida não nos prepara para os finais
(Foto: Divulgação/Pixabay)

“A morte deveria ser assim:
um céu que pouco a pouco anoitecesse
e a gente nem soubesse que era o fim…” (Mário Quintana)

Começar parece a coisa mais fácil. Da vida, quero dizer. Temos uma página em branco a preencher. Uma infinidade de caminhos. Opções. Oportunidades. Sonhos. O tempo em nosso favor. Saúde para dar e vender. Nossos pais, jovens, prontos para nos ajudar.

A infância é uma longa descoberta. Os primeiros passos. As primeiras palavras. Os primeiros tombos. O início do longo processo de aprendizagem. O sorriso no rosto quando conseguimos fazer algo sozinhos.

Passamos os anos iniciais buscando caminhar sem ajuda, brincar de nosso jeito, ter autonomia.

Na adolescência, então, a luta pela independência atinge o ápice. Achamos que sabemos tudo, que somos invencíveis e não precisamos de nossos pais. Olhamos para eles e é como se olhássemos para alienígenas. Não nos reconhecemos neles. Só nos reconhecemos em nossos amigos.

Mas o tempo corre.

Viramos adultos. Quem tem filho tem uma luz. Finalmente, entendemos nossos pais. E passamos para o outro lado.

Agora são nossos filhos que querem seguir sozinhos. E nós só sentimos segurança enquanto eles estão em nosso colo.

Só que eles querem fugir. Querem voar. Como nós, lá no começo da vida. E, com o coração apertado, soltamos suas mãos para que conquistem o mundo.

O tempo segue implacável.

Somos obrigados a reconhecer que os anos passaram. Entramos nos enta. Nossos amigos perdem os pais. Aquela conversa com a mãe não tem o mesmo ritmo. Enfim, chegou a hora de dizer que envelhecemos.

Somos obrigados a pensar na morte. Dos pais. De nossos amigos. Nossa.

Somos forçados a pensar naquilo que evitamos o tempo inteiro: os finais.

Eu nunca vou me acostumar a falar da morte, mesmo que tenha 100 anos. Falar do fim, para mim, é melancólico e é limitante.

E dá para entender o porquê.

Terminar é como fechar as cortinas de um grande espetáculo. Como chegar ao fim do livro de que mais gostamos. Como encerrar uma caminhada que nos trouxe tudo: surpresa, tristeza, dor, amor e alegria. Sem a certeza de que teremos outra oportunidade.

Na verdade, talvez seja humano não se preparar para fins. Porque se sonhos são nosso impulso de vida, como nos acostumar com a ideia de que não poderemos mais fantasiar?

Às vezes, uma morte repentina nos obriga a refletir. Mas, na maior parte do tempo, não nos resta outra saída: temos que encher o tempo com vida e desejos para a morte não ocupar nenhuma brecha. Para adiar pensar no fim nem que só tenhamos um segundo de vida. 

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