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A peste do açúcar: o verdadeiro inimigo dos índios do Brasil

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A peste do açúcar: o verdadeiro inimigo dos índios do Brasil
(Foto: Arquivo pessoal de Xisto Tserenhi'ru)

Um inimigo silencioso e sorrateiro, que chega à luz do dia nas aldeias, é uma das principais causas de morte dos índios brasileiros: o açúcar.

Ele vem na forma de bolachas, refrigerantes e outras guloseimas. Não há quem resista.

No território Xavante, em Mato Grosso, por exemplo, o consumo excessivo de açúcar transformou a diabetes na principal causa do aumento do índice de mortalidade precoce dos indígenas.

A doença chegou e logo se instalou, acompanhando os produtos industrializados, refrigerantes e demais açúcares inseridos na alimentação das comunidades.

Nas duas principais aldeias da etnia em Mato Grosso, Sangradouro e São Marcos, a porcentagem de mulheres diabéticas e pré-diabéticas chega a 75%. No caso dos homens, a porcentagem é de 48,1%.

Xisto Tserenhi’ru é educador e liderança na educação indígena. Ele conta que, todos os dias, rodam notícias de morte de dois ou três adultos em decorrência da diabetes.

“Nossa saúde não funciona. Os cargos foram ocupados por pessoas sem experiência e conforme interesse políticos. Eles não conseguem fazer os tratamentos”.

O indígena explica ainda que o refrigerante “desgraçou” o povo nas aldeias. Eles passaram a consumir muito e junto com outros produtos açucarados, com muita caloria e pouca vitamina.

A situação narrada por Xisto é confirmada pelo médico e doutor em Endocrinologia pela Universidade Federal de São Paulo, João Paulo Botelho.

Segundo o pesquisador que estuda os xavantes há 40 anos, os órgãos federais tinham conhecimento do risco de proliferação da diabetes tipo 2 porque a equipe dele fez vários encaminhamentos.

Em 1996, a situação passou a ser de emergência por causa das mortes, amputações e cegueiras em decorrência da doença.

Desde então, o avanço da diabetes é constante e hoje já atinge os mais jovens.

“Durante as pesquisas, observei jovem xavante do sexo feminino com 15 anos de idade, cega pela catarata do diabetes mellits tipo 2”.

Outro problema, conforme o professor, é a falta de qualificação dos médicos que fazem a saúde indígena. Ele diz que antes eram os cubanos, que tinham pouco conhecimento dos protocolos do Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, são os recém-formados, que aceitam atuar nas aldeias por falta de opção.

“Eles escolhem o trabalho por causa do salário, mas, não têm vivência ou prática”.

Genética desfavorável

Os índios brasileiros e norte americanos têm uma mutação no genótipo que reduz a capacidade do organismo metabolizar o colesterol, o que seria uma proteção ao sistema cardíaco.

Isso, de acordo com o professor, era ideal nos tempos antigos, quando havia escassez de alimentos e os índios precisavam andar muito. Assim, reter energia era essencial para a sobrevivência.

Hoje, com a mudança de comportamento, os hábitos mudaram e a mutação passou a representar um problema porque favorece a obesidade, acúmulo de gordura abdominal, diabetes e colesterol.

A mesma pré-disposição não está entre os brancos porque eles estão em contato com açúcar a centenas de anos. Primeiro o de beterraba e depois o de cana-de-açúcar.

“Então, por uma espécie de seleção natural, os mais preparados ficaram e se reproduziram”.

Troca sem vantagem

Mandioca, abobora, feijão e batata doce foram trocados por arroz, macarrão e alimentos processados nas aldeias. Muitos inseridos pelos próprios órgão de defesa do índio, que de acordo com o professor, nem sempre ouvem os especialistas.

Há muitos anos fizeram um programa para fomento da cultura do arroz em terras Xavantes e Bororos. Os indígenas gostaram tanto do produto, que começaram substituir os tradicionais.

“Com o tempo, estavam comendo arroz branco com açúcar no desjejum. Deixaram de lado ingredientes de hidratos de absorção lenta para usar os de absorção rápida. Significa dizer que passaram a ter menos vitamina e pouca saciedade”.

O processo de inserção continuou intenso e, nos anos seguintes, várias ações de combate a fome com a distribuição de sacolões. Todos formados com produtos carregados de açucares e processados, como macarrão, arroz, molho de tomate e bolacha.

Os mesmos produtos estão na alimentação das escolas indígenas.

Combate por meio da educação

Na avaliação do professor, a situação só será sanada com a educação. Ele acredita que a alimentação deve estar dentro das ações escolares e todos precisam entender o que faz mal.

“Eles absorvem a informação quando é repassada por alguém que confiam, como o professor. É preciso ter a saúde como prioridade”.

Outro lado

O LIVRE entrou em contato com o Distrito de Saúde Indígena (Dsei) de Barra do Garças, mas não houve retorno. O espaço continua aberto para manifestação.

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