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Criação de mega-aldeias seguiu avanço da Amazônia sobre o Cerrado

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Criação de mega-aldeias seguiu avanço da Amazônia sobre o Cerrado
Os pesquisadores usaram imagens áreas e de satélite para mapear as super-aldeias

Enquanto a Amazônia brasileira avançava pelo Cerrado os índios se expandiam pelo território que hoje é o Brasil. Esta foi a principal descoberta relatada no trabalho “Pre-Columbian earth-builders settled along the entire southern rim of the Amazon”, publicado na Revista Nature no final de março.

A pesquisa da Universidade de Exeter, na Inglaterra, é fruto do doutorado do arqueólogo brasileiro Jonas Gregório de Souza mas também é assinada pelos ecólogos Ben Hur Marimon Júnior e Beatriz Marimon, que trabalham no campus de Nova Xavantina da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat).

Foi o casal Marimon que descobriu os primeiros vestígios de uma superpopulação indígena em Mato Grosso entre os anos 1200 e 1450. Os pesquisadores trabalhavam na datação do avanço da Amazônia sobre o Cerrado quando encontraram sete sítios arqueológicos em uma faixa de mil quilômetros entre os municípios de Gaúcha do Norte e Sorriso.

No chão, Ben Hur e Beatriz escavaram para descobrir cerâmicas com pinturas e a chamada “terra preta”, vestígio de agricultura na região. As aldeias ancestrais ficaram ainda mais claras no céu, quando os pesquisadores perceberam por meio de imagens de satélites que se tratava de geoglifos com formatos geométricos, semelhantes àqueles já encontrados no Acre.

Série de geoglifos onde índios se estabeleciam. Foto: Revista Nature

A hipótese dos arqueólogos Exeter é que estas aldeias eram fortificadas, possuíam uma vala exterior e paliçadas para evitar o ataque de tribos inimigas. Ao todo, segundo a pesquisa, a região sul da Amazônia abrigava em torno de 500 mil a 1 milhão de pessoas. O número sugere que a antiga população amazônica é bem maior do que se imaginava.

Parte da descoberta foi possível graças a conexão entre pesquisadores de campos distintos. Enquanto Ben Hur e Beatriz calculavam o avanço da Amazônia por meio de datação de radio carbono o brasileiro Jonas Souza e seu orientador, o arqueólogo uruguaio José Iriarte, queriam entender a expansão dos índios no mesmo território. No fim, descobriu-se uma relação entre os dois estudos:

“O que se percebe é que os índios iam para onde a floresta ia. Antes, a floresta começava pelas matas de galeria na beira dos rios e depois avançava pelo cerrado mesmo. E os índios, que antes construíram aldeias somente às margens de cursos d’águas, começavam a se estabelecer em locais mais distantes também por conta do aumento populacional”, relata Bem Hur.

Florestas versus cerrado

Em 30 anos, a Amazônia avançou 7 mil quilômetros quadrados pelo cerrado. Esta foi uma das constatações da pesquisa liderada pela professora Beatriz Marimon, que estuda o fenômeno há mais de duas décadas. Segundo este trabalho, o bioma amazônico continua evoluindo sobre a savana brasileira, conquanto a exploração agropecuária force a vegetação em sentido contrário.

Os pesquisadores usaram imagens áreas e de satélite para mapear as mega-aldeias. Foto: Revista Nature

Segundo Ben Hur, a expansão da floresta tem a ver com a elevação das chuvas na região do Brasil. Com o fim da era do gelo a temperatura se elevou, a umidade aumentou e as precipitações foram mais recorrentes. No mesmo período, a mata Atlântica também se proliferou.

“É como se o cerrado fosse abraçado pelas duas florestas há um ponto em que as duas matas praticamente se encontram em Goiás. Já existem evidências de pesquisadores que descobriram o contato entre a Amazônia e a Mata Atlântica no município de Jataí”, comenta o professor da Unemat.

Há uma dificuldade metodológica em registrar o fenômeno, uma vez que o próprio cerrado contém matas de galeria, que podem confundir-se com Amazônia ou Mata Atlântica. Para evitar este risco, os pesquisadores fazem o cálculo da elevação de carbono.

“A Amazônia se expande pelos cerradões, que são um tipo de floresta com árvores pioneiras que são mais resistentes e conseguem se proliferar com menos umidade. Nós mostramos justamente os mecanismos deste processo”, finaliza ele.

 

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